Luanda - Com a yield das Eurobonds do Tesouro angolano a negociarem acima dos 10%, o governo de João Lourenço procura evitar recorrer ao mercado, e com isso o investimento público fica ainda mais pressionado.

Fonte: Lusa

O economista-chefe do Banco Fomento Angola (BFA) considera que a evolução das taxas de juro verificada na segunda quinzena de abril está a tornar mais difícil a emissão de dívida pública por Angola.

 

“Esta mudança pode pôr em cheque uma potencial opção de emitir Eurobonds mais cedo no ano”, disse José Miguel Cerdeira à Lusa, apontando que “as yields da dívida angolana estavam progressivamente a caminhar para ficarem abaixo dos 10%, o que deixou de ser o caso com esta mudança de expectativas” dos investidores.


A evolução das taxas de juro exigidas pelos investidores para comprarem dívida pública angolana, que serve de indicador para potenciais novas emissões de dívida pública, mostra valores abaixo de 10% entre 19 de março e 12 de abril, tendo voltado a ficar acima de 10%, o valor considerado como limite para emissões internacionais, em quase toda a segunda quinzena de abril.

 

“No caso do Tesouro angolano, julgamos que não ponderará emissões com ‘yields’ acima dos 10%, e as yields a 8 anos, que andavam perto dos 10%, possivelmente a sinalizar uma descida desse patamar, estão agora claramente acima.


“As yields das Eurobonds (títulos de dívida emitidos em moeda estrangeira) angolanas, em conjunto com os de outras geografias africanas e emergentes, estiveram a subir desde o início do ano, relacionado com uma convicção por parte dos mercados de que a Reserva Federal dos EUA (Fed) iria cortar juros já a meio do ano”, referiu o economista.

Esta evolução tem um impacto nas yields, que estão muito ligadas aos juros das emissões dos EUA, que dependem das taxas de juros vigentes na economia norte-americana, disse José Miguel Cerdeira.

“Essa perspetiva mudou bastante entre a primeira e a segunda quinzena de abril, o que justifica a nossa avaliação; os mercados estão agora convencidos de descidas de juros mais tardias por parte da Reserva Federal, e no caso do Tesouro angolano, julgamos que não ponderará emissões com ‘yields’ acima dos 10%, e as yields a 8 anos, que andavam perto dos 10%, possivelmente a sinalizar uma descida desse patamar, estão agora claramente acima”, salientou o economista-chefe do BFA nas declarações à Lusa.

 

Pressão sobre o governo de João Lourenço

A ministra das Finanças de Angola, Vera Daves, tinha dito em março que a emissão de novos títulos de dívida em moeda estrangeira, ou Eurobonds, dependerá do apetite do mercado para o risco e a visão do país.

“Estamos abertos a participar, dependendo das condições do mercado. Naturalmente não queremos participar a um preço que nos coloca numa situação pior do que a que estamos. Então, o que estamos a fazer é analisar o mercado, analisar o apetite do mercado para o risco Angola”, afirmou Vera Daves numa entrevista à Lusa à margem das reuniões de ministros de Finanças e governadores de bancos centrais do G20, na cidade brasileira de São Paulo, na qual acrescentou: “Se entendermos que a taxa de juros é incomportável, não vamos. Se sentirmos que é uma taxa confortável, vamos”, apontou.

Na entrevista em São Paulo, em março, Vera Daves de Sousa afirmou: “A emissão de Eurobonds depende de como a dívida do país vai comportar-se; a visão do mercado sobre o país está melhor do que já esteve, mas ainda não está no nível que gostaria que estivesse, por isso vamos continuar a observar e a gerir com outras fontes de financiamento enquanto não for possível recorrer a essa”.

Dias depois, o Ministério das Finanças anunciava que pretendia realizar “uma emissão de títulos do Tesouro nacional em moeda externa, no âmbito da estratégia de fomento do mercado de títulos públicos”, mas sem adiantar datas nem montantes, especificando que o formato seria o de Bookbuilding, um processo que serve para avaliar junto do mercado o interesse pelos títulos que quem emite quer colocar.

Desde janeiro, a Costa do Marfim, o Benim e o Quénia já emitiram dívida, sempre com juros abaixo de 10%, marcando o regresso da África subsaariana aos mercados, dois anos depois da última emissão.