Luanda - Inúmeros países do continente debatem a dependência em relação aos recursos minerais e outros já começaram a sair do sector extractivo que durante longas décadas caracterizou a economia real, para o que chamo de “economia epistêmica”: aquela baseada em serviços com pendor essencialmente intelectual, por exemplo, firmas de consultorias diversas que fazem pesquisa aplicada e dão pareceres.


Fonte: Club-k.net


Isto permite que haja mais indivíduos a criarem riqueza e de forma independente, o que se pode traduzir num grau maior de liberdade e cidadania total, propiciando pressão sobre os Estados. No quadro da economia epistêmica está também o turismo que apesar de exigir infra-estrutura, só avança com saber, organização, marketing onde as TICs são um factor chave. Países como Quênia, Cabo-Verde, Costa do Marfim, África do Sul, Egipto, Marrocos, Gabão têm no sector do turismo uma fonte considerável para o Orçamento Geral do Estado. Entre os países referidos, Gabão é o mais novo aluno que percebeu a proximidade do esgotamento do petróleo e olham no turismo como saída para evitarem o catastrofismo económico e social. Apesar de extrair hidrocarboneto a muito anos, a classe política não foi capaz de proporcionar bem estar aos cidadãos. Agora, com o fim a vista do ouro negro, entraram em pânico!


Estas tecnologias (TICs) deram azo a um novo segmento artístico popular e comercial: o cinema. Este sector cultural que em muitos países a sua produção era controlada pelo poder político, pondo em causa a capacidade criativa da arte com a censura. Hoje muitos jovens são realizadores independentes. Criam auto-empregos, empregos e contribuem para dinamizar a economia nos seus países, onde se destacam a Nigéria, a RDC, África do Sul, etc. Num ritmo mais ou menos similar está a música que prolifera um pouco por todo continente e que a pirataria se encarrega de difundir, tal como muitos filmes. As sonoridades musicais do continente estão numa dinâmica rápida de internacionalização, com destaque para alguns artistas: Mano Dibangu dos Camarões; Papa Wemba da RDC, Miriam Makeba da África do Sul, Youssou N´dour e Ismael Lo do Senegal, Angelik Djo do Benin, Lokwa Nkanza da RDC, Cesárea Évora de Cabo-Verde,  Salif Keita do Mali, etc.


No sector estritamente político e militar, apesar dos problemas prevalecentes na Guiné Bissau e na Somália; do retrocesso recente da democracia Maliana; da crise pós-eleitoral do Zimbábue e do Quênia (deste último no bom caminho); da instabilidade política de Madagáscar, Congo Democrático, Sudão e Sudão do Sul e das ditaduras em Angola, Guiné Equatorial e outros regimes de autoritarismo suave que a revista de Economist Intelligence Unit classifica de regimes híbridos, ou seja, aqueles que ora têm práticas democráticas, ora práticas autoritárias: Malawi, Tanzânia, Burundi, etc. ainda assim temos países com grandes avanços. Para além das duas democracias plenas citadas na primeira parte do artigo, existem sete democracias imperfeitas em África que dão passos no ranking mundial da democracia rumo a democracias plenas. Cito apenas duas: Lesoto e Benin.


Voltando a crise Malgaxe, parece que ela caminha para o fim, em virtude da intervenção da SADC que criou um roteiro para resolução do problema.


Outro sintoma não menos importante tem a ver com o facto do Conselho de Defesa e Segurança da União Africana ter intervido em alguns conflitos com contingente militar composto por soldados provenientes de países membros, com realce para o da Somália que trava uma longa batalha contra “Al Shabab”. Ao nível regional, sem qualquer auxílio externo, a Comunidade dos Países da África Ocidental (CEDEAO) colocou o seu contingente militar para ajudar na crise Guineense em Maio de 2012.


Os conflitos geram necessidades de justiciabilidade. África deu sinais de crescimento ético-jurídico ao julgar com sucesso os crimes cometidos durante o apartaide na África do Sul, por meio da Comissão da Verdade, que é vista como modelo para o mundo e foi recentemente adotada pelo Brasil para reafirmar os crimes da ditadura militar; os tribunais penais do Ruanda e da Serra Leoa são um sucesso. O primeiro foi criado por causa do genocídio de 1994 e o segundo por causa da guerra que dizimou inúmeras pessoas onde os diamantes de sangue jogaram um papel negativo. Estes diamantes de sangue estão quase a sair do mapa africano graças ao Processo de Kimberley.


É particularmente interessante a composição da Corte Penal Internacional. Entre os 15 membros, 6 são africanos: Fatoumata Dembele Diarra, 1ª vice-presidente da Corte (Mali), Akua Kuenyehia, 2ª vice-presidente (Gana), Ntanda Nsereko David Daniel (Uganda), Joyce Aluoch França (Quênia), Sanji Mmasenono Monogeng (Botswana) e Fatou Bensouda, vice- procuradora (Gâmbia). Com a saída recente do Procurador Geral Luis M. Ocampo, será substituído por uma mulher africana. Isto é relevante, porque o mundo hoje é controlado nas grandes organizações internacionais, sem ignorar o peso económico e financeiro. Na SADC, há possibilidade de criar-se um tribunal à escala regional, mas está a encontrar impasses políticos.


A dinâmica de sinais de esperança contagiou mais ou menos todos os cantos do continente, por isso, em 2011 assistimos a revolta popular no Norte que deixou cair por terra três longas ditaduras, o que revela bem o crescimento e amadurecimento da consciência cidadã e o reconhecimento por parte da juventude africana que os povos unidos são os donos do poder e não os que governam. Para lembrar, talvez algumas pessoas estejam esquecidas, mas o primeiro país africano, nesta década, onde um presidente foi destituído com manifestações (2009), foi Madagáscar onde Andry Rajoelina enquanto governador de Antananarivo, a capital, tornou-se popular e descontente convocou o povo para derrubar Marc Ravalomanana.


Em poucas palavras, aqui está a demonstração de uma sociedade civil florescente e vibrante. Real e virtual, já que a nova geração africana apossou-se das TICs. Esta sociedade civil, ao mesmo tempo em que é autónoma também é interactiva. Troca dados e experiências. Todos os anos acontecem encontros regionais e inter-africano entre muitas ONG, fundações e associações que discutem as virtudes e vícios do continente, as forças e fraquezas e propõem soluções teóricas e práticas.