Luanda  - A palavra genocídio foi criada pelo Jurista polonês Raphael Lemkin, ao combinar duas palavras,  uma grega e outra latia: Genos (raça, tribo) e Occidere (matar). Lemkin, viu-se na necessidade de criar esta palavra na primeira metade do século XX porque achava que a expressão “assassinato em massa”, expressão em voga na época não correspondia as exigências da dimensão da carnificina que ocorria.


* Mapa Mundial dos Países em Risco de Genocídio
Fonte: Club-k.net

Assim, em 1948 define o genocídio: “o crime de genocídio envolve uma grande variedade de acções, incluindo não apenas a extinção da vida, propriamente, mas acções que a tornem especialmente difícil. Todas estas acções estão subordinadas a uma intenção criminal de destruir ou permanentemente alijar um determinado grupo humano. Esses actos são direcionados contra determinados grupos, e indivíduos são escolhidos à extinção única e exclusivamente por pertencerem a esse grupo”. Este conceito do pai da expressão genocídio é a chave hermenêutica deste artigo para ler a realidade angolana. Ou seja, este é o farol teórico orientador.

    
O genocídio é um dos crimes que mais choca o consenso ético global porque fere a dignidade humana e o valor da vida em particular. O Direito Internacional Público Penal entende que o genocídio é o crime dos crimes, não é por acaso que é considerado um crime contra a humanidade.


A história contemporânea é marcada por alguns genocídios amplamente divulgados: o genocído contra os Judeus, contra os Arménios, Holodomor, Nanking, Cambondja, Bósnia, genocídio do Ruanda e de Darfur no Sudão, embora outras matanças em massa motivadas por razões que o Direito Internacional não contemplou, têm sido motivo de peleja acadêmica sobre a possibilidade ou não de serem consideradas genocídios.

 
Quando os genocídios acontecem, pela sua gravidade causa perdas irreparáveis, mesmo que a justiça tente reparar alguns danos, por meio de indeminizações às vítimas e condenações de natureza penal. Diante deste quadro de tamanha gravidade que este crime contra a humanidade representa, hoje há uma tendência de racionalizar-se caminhos que permitam identificar alguns sinais de risco capazes de prever um possível genocídio. Estes alertas não são lineares, não funcionam matematicamente ou de forma silogística conforme afirma Gregory Stanton (2012).


Angola, o país do qual captou-se o tema e objecto deste artigo, tem uma longa tradição de violência estrutural pelas seguintes razões: foi submetido a uma colonização brutal de quase cincos séculos; depois da descolonização política passou por uma guerra civil generalizada durante duas décadas e meia; conviveu com um regime revolucionário de orientação Comunista onde os direitos de cidadania política foram negados e a limitação da violência do Estado  foi quase inexistente e finalmente transformou-se num regime de transição para a democracia com forte pendor autoritário absoluto. Apesar do fim do conflito de grande intensidade que opôs a UNITA e o MPLA ainda prevalece uma guerra de baixa intensidade com justificações sessecionistas no enclave de Cabinda, no extremo norte do país.


O problema do presente artigo é: em Angola existem sintomas de genocídio que inviabilizam a consolidação da paz e a instituição de um Estado democrático assente em bases republicanas? Este problema leva a duas respostas, mesmo que provisórias: a) Existem sintomas de genocídio, factor que atrasa a corrida de Angola como país pacífico com um sistema democrático real; b) Estes sinais que levam ao genocídio são fomentados por agentes do Estado ligados ao partido no poder que confundem-se com o Estado.


O Direito Internacional Público, através da Convenção para a Prevenção e a Repressão do Crime de Genocídio (1948), define o genocídio da seguinte forma (Art. 2º): “qualquer dos seguintes actos, cometidos com a intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso, tal como: (a) assassinato de membros do grupo; (b) dano grave à integridade física ou mental de membros do grupo; (c) submissão intencional do grupo a condições de existência que lhe ocasionem a destruição física total ou parcial; (d) medidas destinadas a impedir os nascimentos no seio do grupo; (e) transferência forçada de menores do grupo para outro grupo.”


Para Gregory Stanton (2012), o acontecimento do crime de genocídio passa por um processo evolutivo com várias fases até o momento da “barbárie absoluta”. Essas fases são oito:

1ª) Classificação. Típica das sociedade onde a bipolaridade é factor de tensão. Ali onde o diferente gera agressividade que descamba em violência;

2ª) Simbolismo. Quando se atribui nomes identificatório de grupos para zombaria e desprezo como sigano, judeo, sulano ou kwacha;

3ª) Desumanização. Quando determinados grupos lhes é negado a sua humanidade. Para muito angolanos quem faz parte do partido UNITA é animal ou ainda vegetal. Não é por acaso que muita gente tentava à todo custo contacto com membros da UNITA (1992) para confirmar se tinham mesmo cauda tal como o MPLA os ensinara;

4ª) Organização. Geralmente quando se pretende exterminar um grupo há um nível de organização da parte do Estado que cria milícias para desresponsabilizar-se. Nos últimos tempos tem havido milícias em Angola, criadas pelo poder político dirigente para reprimir grupos opositores e manifestantes;

5ª) Polarização. Grupos de ódio propagam a mensagem que visa dividir a sociedade em dois blocos antagónicos e irreconciliáveis, mesmo que seja só psicologicamente;

6ª) Preparação. Entre outros aspectos, na fase de preparação elabora-se listas de pessoas a serem mortas; 7ª) Extermínio. O acto de consumação;

8ª) Negação. Escondem as vítimas e rejeitam qualquer envolvimento no acto de genocídio.


Anualmente, a GW publica o Mapa Mundial dos países em ricos de genocídio. Ao folhar o Mapa referente a 2012 Angola está no alerta laranja, o que significa que está na fase 5 a caminhar para  o catastrofismo apocalíptico. 


Quando uma sociedade apresenta alguns desses factores de risco, há que tomar algumas providências preventivas para que se possa evitar o pior. Stanton propõe algumas acções que permitem evitar o genocídio. Esta cultura de prevenção de genocídio também foi adoptada pelas Nações Unidas, institucionalizada através do estabelecimento de um Acessor Especial das Nações Unidas para a Prevenção de Genocídio e do Acessor Especial sobre a Responsabilidade de Proteger. Ambos têm missões distintas mas complementares (ONU, 2012).

 
Com base nestes sintomas, a pesquisa vai mergulhar na realidade socio-política angolana, para compreender como se dão e se efectivamente existem. No caso de existirem conforme as hipóteses, então, faz-se necessário a busca das causas e a aplicação de um conjunto de medidas preventivas propostas pela Genocide Watch e pelas Nações Unidas.