Porto Amboim – A Comissão Sindical dos trabalhadores decidiu eleger, apenas, um ponto do caderno reivindicativo para solução imediata, mas a entidade patronal diz que não aceita a exigência com recurso a um estapafúrdico argumento. Em função desse braço de ferro, os trabalhadores já vão no seu décimo dia de paralisação devido a alegada arrogância da entidade patronal.

Fonte: SA

Cerca de 900 trabalhadores da Paenal, empresa metalomecânica prestadora de serviço à indústria petrolífera, localizada no Porto Amboim, província do Kwanza-Sul, decidiram paralisar as suas actividades, desde o dia 12 do corrente, em protesto contra as práticas pouco correctas que têm sido levadas a cabo pela direcção da Empresa, apurou o Semanário Angolense no local.

Os funcionários, colocados num estaleiro naval localizado no município do Porto Amboím, província do Kwanza-Sul, reivindicam um único ponto do caderno reivindicativo, consubstanciado no direito à protecção social em caso de doença. Segundo relatos dos assalariados, a paralisação surgiu porque a entidade patronal não paga o salário base ao trabalhador quando este estiver doente. Para além disso, a empresa também se recusa a pagar horas extraordinárias e quando o faz, procede de forma
distorcida, em valores que não compensam em nada o esforço por eles empreendido.

«Esta é uma empresa pesada e nós estamos aqui a trabalhar em condições muito difíceis, expostos ao sol, a altas temperaturas e à inalação de gases tóxicos, que são os produtos que manuseamos aqui, porque os equipamentos de protecção não são adequados à actividade», lamentou-se um dos trabalhadores.

A polémica situação remonta ao tempo em que a Panael arrancou a sua actividade e, socorrendo-se a uma Lei Geral do Trabalho de Angola, decidiu que, em caso de doença, pagaria ao trabalhador apenas três dias, mesmo que este tenha como recomendação médica mais dias de repouso.

«CAMPO DE ESCRAVATURA»

Essa realidade tem dado origem a situações mais graves, em que, inclusivamente, funcionários desmaiam em pleno local de serviço, porque muitas vezes são obrigados a trabalhar contra a indicação médica sob pena ver o seu ordenado base reduzido, caso não cumpram as imposições da direcção.

Segundo fizeram notar, dois colegas seus que se encontravam a trabalhar em tempo de repouso médico, tendo o estado de saúde de um deles agravado, o que os leva a temem pelo pior. «Temos um outro caso de um colega, que sofreu um acidente de trabalho, mas não foi tido nem achado pela direcção, uma vez que esta decidiu pagar mensalmente apenas três dias. Ele teve de se socorrer a meios próprios para encontrar a cura pois, a gerência, na pessoa do senhor José Lopes e a senhora Helena Guerra Marques, uma portuguesa que transformou a empresa num autêntico campo de escravatura», asseverou um outro.

Os nossos interlocutores contam ainda que um outro funcionário, que também foi vítima de acidente de trabalho e ficou sem um dedo, foi simplesmente abandonado pela empresam, que dele não quis saber.

«Senhor jornalista, estes são apenas alguns dos casos, porque aqui, a direcção não valoriza os trabalhadores e nós não permitimos isso. Pedimos aos órgãos de direito, entre eles a Sonangol, o MAPESS e o Ministério dos Petróleos, no sentido de pegarem a fundo esta situação, porque um director desse tipo não serve», protestaram.

Preocupados com a reforma Segundo acrescentaram, o próprio director afirma que a segurança social não faz o reembolso ao trabalhador. «Porquê que ele não paga?», interrogaram-se, esclarecendo que o dinheiro descontado agora, será para suportar a sua velhice na reforma.

«Quando atingirmos a idade da reforma, os outros que estiverem a trabalhar também serão descontados. Como será que a segurança Social nos vai pagar? Perguntei ao director, quanto tempo ele dispensaria a um trabalhador para ir à Segurança Social para resolver esses assuntos e ele disse que não dispensa», informaram.

Recordaram que, quando começaram a trabalhar, eram saudáveis, mas, agora, sofrem de problemas respiratórios, problemas do coração, derivados da inalação de produtos químicos utilizados na empresa, para além de problemas de visão, que a empresa não assume. «Se tiveres uma recaída na empresa, só às 9 horas é que te levam a um posto médico, sem qualidade, sem comida e com mosquitos, porque o pessoal de serviço só chega às 12 horas. Depois de atendido, o resultado só aparece depois das 19 horas, o doente pode não resistir e acaba por morrer», desabafaram.

Por seu lado, o 1.º Secretário da Comissão Sindical da Paenal disse à reportagem do SA que não exigem aumento de salário, mas, sim, os seus direitos em relação a saúde. Saúde em primeiro lugar Gonga Constantino, que falou depois de ter saído de uma reunião com a direcção da empresa destinada à busca de solução à paralisação, informou, que desde 2010 que os  trabalhadores da Paenal são excluídos da protecção social na doença.

«Temos estado a discutir muito com a empresa, até que segunda-feira, dia 08, os trabalhadores decidiram fazer uma  paralisação, e não uma greve, como a empresa pretende fazer crer, para protestar e exigir que a empresa volte a pagar os dias de repouso médico», explicou.

Para o sindicalista, «cá na empresa, quando um trabalhador adoece, mesmo em casos de acidente de trabalho, a empresa só paga três dias, não importa o tempo de repouso. Não se respeita as prescrições médicas e o trabalhador é obrigado a trabalhar doente », denunciou.

Gonga Constantino deu a conhecer que, ao longo das discussões, a empresa alegou absentismo e, por seu lado, a Comissão Sindical sempre defendeu que, para combater o absentismo, a empresa dispõe dos mecanismos legais, constantes da Lei Geral do Trabalho, para punir o trabalhador. «Cabe à entidade empregadora sancionar o indivíduo, não vamos inventar regras para prejudicar o colectivo, uma vez que há regras a cumprir». Alertou.

Esperança no Estado Segundo ainda o número um do sindicato, a empresa só aceita pagar cinco dias, «se estiveres doente um mês, só paga cinco dias. Se o médico disser que tem de ficar de repouso 15 dias, a empresa só aceita cinco dias e o trabalhador tem que trabalhar doente, sob pena de ficar sem o salário.»

«Mas o sindicato defende que, quem determina o repouso médico é o médico, cuja clínica foi mesmo contratada pela empresa. Não pode ser a empresa, o doente nem um indivíduo qualquer, mas, sim, o especialista formado nessa área», reiterou.

Questionado sobre os resultados das conversações, Gonga Constantino disse que «a empresa diz que não vai torcer o braço, nós estávamos numa paralisação e vamos avançar para uma greve, vamos até onde for necessário, a verdade é que exigimos os nossos direitos como cidadãos angolanos.»

Os assalariados da Paenal querem que o Estado angolano reconheça os seus direitos de protecção social. Se a entidade empregadora não o fizer, «temos o Estado angolano para agir», disse esperançado. Informou que o MAPESS já lá esteve e usou «duas línguas»: com os trabalhadores, disse que, nos parâmetros da lei, a empresa deve assumir, mas, com a direcção da empresa, inverteu a história, dizendo que a empresa paga o internamento e os três dias, mas o pessoal não concorda, porque «nós não vamos esperar internar».