Luanda – A Constituição do país aprovada no ano de 2010 num ambiente da euforia do CAN que o país organizou pela primeira vez, veio constituir um instrumento democrático, para regular os nossos comportamentos e introduzir em Angola uma consciência da legalidade. Este pelo menos era o meu sonho. Vou debruçar-me sobre o tema desde uma perspectiva pedagógica, longe de tons acusatórios directos. A verdade e urgência do tema, não deixará impávidos os bons e tranquilos os pérfidos.

Fonte: Club-k.net

A educação tem esta dupla função, fazer que os educandos (todos) desenvolvam e potenciem os bons hábitos e suprimam aqueles menos bons. Os últimos acontecimentos, no campo da violência e a existência de um bom número de jovens nas prisões por inflação da lei entre outras razões estão na base desta reflexão.

Mas realmente o que é legalidade? A ideia da legalidade consideramo-la como conformidade dos comportamentos, por parte de cada pessoa, dos entes, das instituições, dos organismos públicos e privados, dos nacionais e estrangeiros as disposições normativas e legislativas do estado democrático e das suas articulações internas, para um ordenado desenvolvimento da vida civil.

A favorecer esta reflexão está também a cada vez mais existência do drama de fenómenos ligados com muitas esferas da ilegalidade: falta do cumprimento das leis vigentes, inflação das regras de convivência cívica, evasão fiscal, corrupção nos sectores mais sensíveis da sociedade e nas instituições, existência de macro e micro criminalidade, violações, ocupação da terra, ilegalidades na condução rodoviária; presos que deveriam estar nas cadeias pululam nas nossas ruas esperando a sua ocasião para infeliz e impunemente cometer outro delito para depois ser solto.

Esta liturgia constantemente repetida, nas portas das nossas instituições prisionais de entra e sai dos mesmos indivíduos desavindos com a lei. No cidadão comum, leigo das matérias jurídicas, neste cidadão comum e honesto nasce um sentimento de resignação diante de tanta ilegalidade.

Há dias assistimos, a uma grande manifestação contra a violência. Era desejável que uma iniciativa destas pudesse ser realizada, num dia de aulas, para que as portas das escolas se fechassem e todos alunos e estudantes fossem mobilizados para a causa fazendo parte dela. Este acto foi um acto de defesa da legalidade e dos valores a ela adjuntos.

Esta experiência e iniciativa, embora parece insignificativa, indicia que podemos esperar por num acordar da consciência contra este costume de prática de maldades. Era meu desiderato, ver na primeira fila os líderes de todos Partidos políticos com assentos no Parlamento, de mãos dadas todos contra a violência e a ilegalidade. Para a minha decepção não foi assim!

As formas da ilegalidade são várias e têm muitas incidências no tecido social. Algumas assumem um relevo tao penalizante para a mesma economia do país. Todas estas formas concorrem a produzir danos irreparáveis no costume e na sensibilidade, se é que ainda somos sensíveis, minando assim de forma grave o ordenamento duma convivência democrática.

Na minha opinião a ilegalidade em matérias como a economia, a política, o trabalho, a urbanização, e educação, a terra, constituem uma praga dolorosa em Angola.  A clamorosa carência do sentido do Estado e da coisa pública tem várias raízes conectados a família, a sociedade, a cultura e ao nosso processo comum de desenvolvimento dos últimos 20 anos.

É uma emergência educar todos angolanos, para a legalidade e numa visão madura da legalidade, que não a reduza numa mera resposta formal ou mecânica ás leis e as normas vigentes. Uma visão madura da legalidade, deve ser elaborada a partir dum quadro teórico de referência pedagógica com os seus pressupostos ético- antropológicos, jurídicos e de epistemologia.

Por isso a emergência pedagógica sobre o argumento. O percurso formativo desde a creche até a universidade, deveria ser abeberado de educação á legalidade. Disto quero tratar neste artigo, que divido em três partes. Se trata dum tema que deve ser aprofundado com amplitude, no âmbito do processo educativo em geral e nas disciplinas de educação moral e cívica, história de Angola e administração do território, em particular, para fundamentar uma verdadeira educação a cidadania democrática.

A educação á legalidade merece no nosso contexto ser atribuída um significado, afim de enquadra-la na mais significativa e compreensiva educação e formação do cidadão. Um programa educativo para a legalidade, deve antes de tudo inspirar-se, fundar-se numa visão integral do homem, criado a imagem e semelhança de Deus e dos seus direitos e deveres.

Estamos diante duma tarefa educativa difícil mas de valor e urgência. Por isso o título: educação á legalidade: uma urgência educativa em Angola. Reconheço que educar para, á e na legalidade é um trabalho árduo, a começar pela família passando pelas diversas instituições socializadoras. E todas pessoas comprometidas na educação dos menores estão chamados em causa para esta obra educativa.

À escola reveste-se um papel específico e insubstituível, pois a ela se incumbe a tarefa de educar, de aproximar a juventude, através de métodos apropriados a sua idade, aos vários problemas que acontecem na convivência democrática. Entre estes problemas da convivência democrática, está também o problema da legalidade. O maior e mais eficaz método em termos de educação á virtude, a legalidade e a convivência democrática é sem sombra de dúvidas o testemunho dos educadores e de toda comunidade educadora.

O nosso sistema de ensino é muito estéril, na produção de leis e directrizes que possam regular a educação as virtudes cívicas. Muita gente que reclama a perda de valores inconscientemente queixa-se desta péssima convivência social.

Este tema, pela sua actualidade e urgência, merece um tratamento todo especial por parte do ministério da tutela. Se trata de colocar a disposição da comunidade escolar intervenções didácticas idóneas que possam servir de bússola, para estas ideias.

Pois hoje em dia os manuais de EMC, são pouco elaborados, e temas como este são marginalizados ou cuja profundidade foi deixada á iniciativa dos professores da disciplina, muitos deles sem formação específica. Mas é sumamente importante que neste tema se abram vias de um diálogo honesto e profícuo entre os pais, encarregados de educação, alunos, professores e o Estado.

A educação constituí um instrumento indispensável para cultivar e amadurecer em cada pessoa convicções profundas sobre a própria responsabilidade de cidadão cumpridor da lei. No nosso país, Angola, este desafio, infelizmente engloba toda a inteira população. Este desafio é aberto. A promoção da legalidade é e deve ser feita numa escala muito mais ampla, como condição indispensável para o crescimento duma ordenada e livre convivência civil entre nós. Mas na Escola da legalidade estão chamados TODOS angolanos, independentemente da idade, da raça, da cor partidária, do cargo politico ou social, da religião, do sexo e da sua localização geográfica (do campo e da cidade).

Esta educação, deve procurar fazer progredir um ETHOS, um costume partilhado. Para chegar a tal desiderato de tornar-la eficaz ela deve ser feita em sinergia, dever ser um pacto comum e assim ser encarrada como obra conjunta de todos os organismos que compõem a complexa trama de tecido social (Instituições, politica, comunidade de fé, mass-midia, escola, etc).

Vendo como a sociedade angolana se está comportando na sua convivência social e familiar e na sua relação com a lei, com a política e com o bem comum, posso afirmar que estamos diante dum desafio difícil que devemos afrontar com determinação, perspicácia, clarividência, sagacidade e muita fé.

A operação a que uma tal educação se prepara a realizar é aquela de substituir a já enraizada cultura da ilegalidade por uma da legalidade. Hoje, assistimos muitos fenómenos ilegais, como a corrupção, a intolerância, extorsões nos sectores da política, da administração pública, da economia, da justiça, da educação que pouco a pouco já fazem parte do quotidiano do cidadão. Podemos dizer que muitos angolanos ou já foram vítimas de actos ou comportamentos de ilegalidade ou foram autores de actos de ilegalidade.

Para não falar dos reatos fiscais e da sofrida falta de regras de convencia cívica que emergem dos comportamentos habituais de muitos cidadãos, basta apanhar um táxi para experimentar. A expressão legitimadora desta ilegalidade é: vamos fazer mais como é então? E o comportamento que o confirma é o conformismo.

Em suma, na nossa terra o problema da legalidade deve merecer uma atenção singular, sob pena de sucumbirmos todos. È tarefa de todos, não basta acusar outros mas é preciso auto acusar-se. Um estado democrático, é suportado pela legalidade e tem como alicerce a legalidade. Na democracia o Estado não é meretriz, deve ser respeitado e o Estado se faz respeitar respeitando ele mesmo a lei que confecciona.

Num Estado de direito o cidadão respeita o Estado e este faz-se respeitar pelos cidadãos (O Estado subordina-se à Constituição e funda-se na legalidade, devendo respeitar e fazer respeitar as leis art.6º, 2 da CRA). Para cumprir a urgência duma cultura da legalidade, devemos investir na educação dos políticos e da população.

Nesta tarefa os médias e dos jornalistas em nome do interesse público desempenham uma função de relevo para a elevação do nível da consciência jurídica da população e da educação cívica dos cidadãos. Não tenhamos ilusões de que basta um voluntarismo pedagógico para resolver o problema. Porque sem uma classe de políticos, administradores, funcionários públicos, dirigentes de sectores de iniciativa privada, membros de igrejas cristãs e de seitas, religiosos e sobretudo os administradores da coisa pública que orientem a sua acção segundo um vivo sentido de legalidade, não será possível dar passos significativos neste tema.

Para difundir na sociedade uma consciência cívica madura, respeitadora da lei vigente, é imprescindível uma acção formativa capilar capaz de incidir sobre os estilos de vida e sobre a mentalidade dos cidadãos.