Luanda – Em Angola, por natureza política, não constitui apenas um tabu, mas é bastante arriscado abordar o tema deste género que relaciona o Povo indígena ao Poder político. Todavia, na interpretação clássica, o Povo indígena é uma comunidade étnica descendente (originaria) de uma Nação ou de um Pais, sujeita à uma Cultura específica, veiculada por uma Língua homogénea ou por um conjunto de Línguas heterogéneas.

Fonte: Club-k.net
Sendo esta, a cultura, um sistema complexo de códigos e padrões partilhados nesta sociedade ou num grupo social, e que se manifesta nas normas, crenças, valores, costumes, hábitos, práticas, criações e instituições que fazem parte da vida individual e colectiva desta comunidade ou grupo social. Noutras palavras, a comunidade indígena é autóctone ou nativo que habita numa terra dos seus antepassados, em pleno gozo da sua herança cultural e patrimonial, sobre os quais repousam o Poder político do Estado.

Nesta lógica, mesmo num paísmultilinguístico, multiétnico e multirracial, haverá sempre um determinado núcleo de valores tradicionais dos seus povos indígenas queasseguram a sua História, a sua identidade cultural, a sua inspiração filosófica e a sua aspiração social. No fundo, esses são os valores básicos de uma Nação que lhe distingue de outros Povos, e que realça o seu potencial cultural para uma integração sustentável na Comunidade Internacional, sob os princípios de soberania, igualdade, reciprocidade de vantagens e benefício mútuo.

Só nesta base que a Independência de um Povo ou de uma Nação seja de jure et de facto. Caso contrário, se tratará de um Regime Neocolonial – consciente ou inconsciente.

Se não, vejamos! A pessoa humana pensa, raciocina e faz o juízo através de um idiomapredominante do seu cérebro. Nesta conformidade, a Língua é o veículo principal daCultura. Logo, na base da interpretação acima referida, a Cultura exerce o papel fundamental na vida da pessoa humana. Ela forja, regula e influencia a postura e a conduta de cada membro da comunidade. Além disso, é um instrumento importante que viabiliza a percepção adequada da sociedade, de como enquadrar-se nela e de como lidar com ala.

Por isso, a valorização de um Povo, a meu ver, parte do conhecimento adequado dos seus valores culturais. Não é possível estimar uma Cultura, defendê-la e projectá-la se não tiver o conhecimento profundo dela e estar em pleno usufruto dos seus valores. Ali estará a minha dúvida quando se invoca o “resgate dos valores culturais angolanos”,nas circunstâncias actuais em que a Cúpula que lidera o Estado Angolano não faz parte integrante desta Cultura, nem se expressa em Línguas indígenas deste País.

Esta situação anómala, no continente Africano, só prevalece em Angola. Eu acabo de perceber porque afinal o Presidente Robert Gabriel Mugabe, do Zimbabwe, anda por aí, odiado e combatido por todo mundo ocidental. Não digo que sou apoiante dele, mas a verdade é que, Mugabe é indígena, com características indígenas, fala fluentemente em línguas indígenas, pensa na língua indígena, comunica com seu povo nas línguas locais indígenas, vive a cultura indígena, defende e promove o Povo indígena do Zimbabwe.

Quando Dr. Robert Mugabe sentiu-se ameaçado pelas Comunidades locais indígenas, sua base social, ele não hesitou tão-pouco lançar-se em peso contra os Fazendeiros Brancos que tinham em sua posse mais de 85% das terras úteis e aráveis do Zimbabwe. Ele nem reflectiu-se um bocado sobre as consequências de se alinhar com as comunidades indígenas contra os ricos que exploravam e representavam ainda o poder colonial britânico no país.

Além das Reformas Agrárias austeras que têm sido levadas acabo, Dr. Robert Mugabe está apostado, desta vez, no potenciamento económico das comunidades indígenas locais e transformá-las em beneficiárias principais da actividade económica do Zimbabwe. Desafiando assim o ocidente. Parece uma loucura! Mas é verdade.

Eu conheci fisicamente o Presidente Robert Mugabe em Lusaca, na Zâmbia, de 1965-1967, no Centro de Libertação, de Kamwala. Nesta altura, ZANU-PF, pró-chinesa, era muito próxima da UNITA. Enquanto, MPLA e ZAPU, do Joshua Nkomo, ambos pró-soviéticos, eram amigos acérrimos.

Convém realçar o facto de que, Mugabe sempre foi uma personalidade enigmática, astuta e carismática, com convicções bastantes fortes negro-africanas, tipicamente indígena. Por isso, não fiquei surpreso, de forma nenhuma, que ele tivesse coragem e ousadia de arriscar tudo em prol do Povo indígena do Zimbabwe. As características do Mugabe e do ZANU-PF são diametralmente opostas aos do Presidente José Eduardo dos Santos e do MPLA. Não sei como passaram a ser aliados. Talvez apenas por oportunismo ou por interesses ambíguos de defender o sistema autoritário e corrupto.

Neste prisma, o Estado Angolano apoia-se firmemente na cultura colonial portuguesa, que inspira a sua filosofia política e aspira os seus interesses socioeconómicos, em detrimento das Comunidades locais indígenas. Sendo o facto de que, a Cultura indígena angolana, na sua manifestação filosófica, é “antítese” da Cultura actual, de carácter neocolonial.

Tendo em consideração o facto de que, a Sociedade Angolana, no seu estado actual, não é regida por um conjunto de valores culturais indígenas, que servisse de sustentáculo no processo gradual da sua integração na Civilização Universal. Pelo contrário, ela é sustentada basicamente pela Cultura luso-brasileira. Isso tem implicações depreciativas sobre o patriotismo que inibe a lealdade aos interesses vitais dos Povos autóctones.

O que, de certo modo, conduz ao sistema político neocolonial, em pleno detrimento da independência e de autodeterminação do Povo. Nessas circunstâncias, o Poder do Estado passa a depender dos factores exteriores, afastando gradualmente os Quadros nacionais autóctones dos cargos de realce, de chefia e de melhor remuneração. Estando a ser ocupados por Estrangeiros que alargam o leque de sua influência e da afirmação constante do seu poder económico.

Este processo, da neocolonização, se desenvolve de forma dramática e assustadora. Os Angolanos que sonhavam ser independentes, senhores de si próprios e realizados, hoje este quadro está sombrio. Em função disso, os funcionários e trabalhadores angolanos estão sendo humilhados nos seus postos de trabalho, na sua própria pátria, por patrões estrangeiros; mal pagos; sem seguros sociais e de saúde; sem contractos de trabalho; e sendo despedidos arbitrariamente e atirados na desgraça e na miséria.

Como não bastasse, Bairros inteiros estão sendo demolidos; Cidadãosescorraçados dos seus Bens e postos ao relento. Quem os defende? Ninguém! Isso acontece na altura em que, a Classe Média está sendo amordaçada, sem a coragem de sair a terreiro para alinhar-se com o seu Povo.Enquanto a Juventude se encontra numa situação desesperada, desempregada, sem suporte do Estado,entregue a todos os vícios de alienação cultural e da assimilação luso-brasileira.

Por outro lado, os novos SENHORES estão lançados na ocupação desenfreada das terras comunitárias indígenas. Sendo estas os últimos redutos da Cultura indígena e do seu poder económico.Esta Estratégia da expropriação das terras comunitárias, de alienação cultural da Juventude e do afastamento dos Quadros nacionais dos postos nucleares de trabalho, corresponde exactamente a Política Colonial da Assimilação que se baseava essencialmente no isolamento do Povo indígena das suas Elites intelectuais da Classe Média.

Portanto, nessas circunstâncias, tornar-se-á bastante difícil implantar no País o Poder político de matriz africana, como acontece em todo Continente Africano. A não ser que, a “Classe PolíticaAngolana” tenha sabedoria, coragem e ousadia de enfrentar decididamente este fenómeno estranho, para que seja possível inverter drasticamente este quadro sombrio, de modo que o país seja posto ao nível dos padrões partilhados da Região em busca da Renascença do Pan-africanismo.

Caso contrário, as Comunidades indígenas angolanas estarão na condição similar dos Aborígenes da Austrália, acantonados em Ghettos, marginalizados e reprimidos. Cuidado! A História da Humanidade não é linear e nem é irreversível. Por analogia, ela repete-se de modo similar com características diferentes.

Pois que, os factos revelam que, Angola não é só um grande depósito dos recursos minerais e das extensas terras férteis para a agricultura diversificada, mas sobretudo, é um reservatório imenso dos recursos hídricos. Os dados recentes indicam igualmente que, a Humanidade enfrentará nos próximos tempos os grandes desafios da distribuição equitativa da água aos habitantes deste Planeta Terra. Neste respeito, a África já sente o peso demasiado da escassez de água em vastas Regiões do Continente.

Portanto, Angola torna-se justamente um alvo estratégico a nível mundial. As Potências mundiais têm os olhos bem-postos sobre ela. Nas condições em que ela se encontra hoje, da fragilidade da identidade cultural e da ausência do patriotismo assente na sua tradição e na cultura indígena, ela estará bem-disposta de ceder facilmente a sua Soberania e sacrificar os Povos indígenas, transformando-se em meros Servos, sem poderes político e económico para se defender.

Este é o cerne desta Reflexão que está aberta ao debate crítico, contraditório, construtivo e de qualidade.

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