Luanda - O jornalista angolano Rafael Marques disse este sábado à agência Lusa, após ter sido libertado da detenção, que foi agredido pelos efetivos da polícia, responsabiliza o Governo e disse que já apresentou uma participação na Direção de Investigação Criminal.

Fonte: Lusa

Na  sexta-feira, três jornalistas angolanos que falavam com sete jovens que tinham sido detidos na sequência de uma manifestação um dia antes, acabavam de ser libertados pelo tribunal quando foram retidos novamente por efetivos da Polícia de Intervenção Rápida.

Rafael Marques disse que ele e outros dois jornalistas, Alexandre Solombe e Coque Mukuta, correspondente da Voz da América, foram conduzidos a uma viatura celular, onde foram "pisoteados" e depois para as instalações da Direção de Investigação Criminal de Luanda, onde os sete jovens que "estiveram 20 minutos em liberdade" continuam presos sem culpa formada.

"Eu apresentei logo, mal saímos, uma participação mesmo lá na Direção de Investigação Criminal. Como sabemos, neste país eu estou sempre a litigar porque estou sempre a apresentar queixas, mas nós depois, os queixosos, acabamos como acusados", lamentou Rafael Marques, que criticou o comportamento das autoridades e do governo angolano pelo sucedido.

"O comportamento da polícia de Intervenção Rápida foi um comportamento selvático, um comportamento digno de energúmenos. O facto de, até ao momento, o Comando Geral da Polícia Nacional não ter corrigido a situação, não ter libertado os jovens, prova que a lei não funciona neste país. Não há lei neste país, não há ordem neste país. Isto é uma verdadeira ditadura. Isto é um verdadeiro ato de abuso de poder, de tirania porque não é justificável que um indivíduo que um juiz manda soltar, passados 20 minutos seja detido sem causa absolutamente nenhuma", disse à Lusa o ativista de direitos humanos.

"Só pode ter sido ordem de alguém importante do governo do presidente José Eduardo dos Santos a fazer aquilo que nos fizeram. Não é uma ordem daqueles oficiais da polícia. Não é uma iniciativa pessoal daqueles agentes, foi ordem que eles receberam de alguém lá de cima. As tais ordens superiores que eles recebem sempre. Eu responsabilizo o chefe do Governo e o comandante-geral da Polícia por aquilo que aconteceu hoje.

Rafael Marques recordou que na tarde de sexta-feira foi acompanhar o julgamento dos jovens que tinham sido presos um dia antes, durante uma ação de protestos na capital angolana.

"" saída do tribunal, depois de serem soltos eu pedi aos jovens para conversarem um pouco comigo. Estava interessado em saber sobre quem tinha sido torturado e estava a fotografar, porque muitos deles apresentam escoriações dos espancamentos que sofreram e um deles ainda tinha a camisola toda rasgada (...). Percebemos que começou a haver ali uma envolvente de agentes da polícia de Intervenção Rápida, que trouxeram cinco viaturas, incluindo dois carros blindados, que nós nunca tínhamos visto aqui nas ruas, com cores camufladas", relatou Rafael Marques.

O jornalista e ativista de direitos humanos explicou que, "ao todo, eram 45 agentes", que os obrigaram a entrar numa viatura celular e a deitarem-se "uns em cima dos outros".

"Um dos comandantes, e eu vi bem o rosto dele, entrou para a viatura e pisoteou-me nas costas com as botas. Pisoteou também dois ou três [jovens] e depois entraram dois indivíduos com para aí cem quilos ou mais e com a mesma tarefa de nos pisotear e obrigarem-nos a mantermos as caras baixas para não os reconhecermos. Durante o tempo em que estivemos naquelas viaturas só ouvíamos impropérios: 'que merecem ser fuzilados' e 'porque é que não se matam já' e 'porque é que não se tortura'", contou.

De acordo com o jornalista o grupo de jovens e jornalistas foram filmados quando se encontravam deitados no carro celular, com calor e "em condições humilhantes e degradantes".

Segundo disse à Lusa, os equipamento fotográfico e os telefones foram destruídos antes de serem transportados para os calabouços da Direção Provincial de Investigação Criminal.

"Íamos já a caminho das celas, já tínhamos tirado os atacadores dos sapatos e os cintos (...) e depois alguém disse que não e fomos [os jornalistas] chamados à parte e lá nos explicaram que não havia nada contra nós e que podíamos ir em liberdade", referiu Rafael Marques, acrescentando que os sete jovens continuam detidos.