Luanda - A missão da Educação é fornecer instrumentos cognoscitivos e de vida ao indivíduo, para permitir-lhe perceber o “seu” mundo e, por conseguinte, formular a sua própria visão sobre o mundo. Abordar esta questão não é simples, por entre outras razões: (i) ser uma tarefa multi-temporal; (ii) ser uma missão pluri-ontológica; (iii) ser uma questão cultural (ligada ao espaço); (iv) ser uma actividade inter-individual e intra-individual, ao mesmo tempo, num panorama de contradições (o que é muito bom sinal).


Fonte: Club-k.net

A educação, enquanto programa, é [sempre] uma imposição. Quem impõe? O mais forte, possuidor de capitais sociais de prestígio, ou capitais académicos e capitais culturais importantes. É fácil perceber-se disto: (1) ninguém pediu para vir ao mundo, pois somos os resultados da vontade dos nossos progenitores; (2) até a nossa maturidade cognoscitiva que é no crepúsculo da vida, ficamos sem força de agir.


A educação é a mesma coisa. Na primeira trajectória, somos formatados consoante moldes que não são da nossa própria vontade. E, quando, tornamo-nos conscientes – mas escravos da imposição cognoscitiva a qual reproduzimos nos espaços sociais – quase nada temos para mudar. Aliás, falamos a língua imposta pelo núcleo social que acompanhou a nossa vinda ao mundo e os primeiros momentos da nossa socialização. Ainda que optemos outras línguas – enquanto jovem ou adulto – a estrutura da nossa mente limita-se a interpretar apenas a partir dos primeiros alicerces educacionais.


Dai, a ética educativa impõe-se neste programa (educação). Por, talvez, ser uma constatação do autor no professorado, Domingo da Cruz propõe-nos aqui a “Ética Educativa à Luz da Racionalidade Comunicativa”. Parece que ele coloca, a priori, três pressupostos de leitura: (1) a educação baseia-se numa ostentação ética. Aliás, a educação passou a ser, tradicionalmente, “boas maneiras” e fica inelutavelmente ligada a Moral ; (2) a “racionalidade comunicativa” é possível quando, por um lado, os suportes da comunicação partilham os mesmos códigos e as mesmas normas de linguagem. E, por outro lado, quando há razão/lógica no discurso e lucidez nas intenções exibidas no discurso; (3) a monitorização das instituições  e dos agentes  da socialização – entenda educação – é, neste caso, todo um programa que exige competência, rigor, disciplina, responsabilidade e responsabilização dos agentes. Por outro, este programa precisa cumprir estruturalmente as demandas técnicas, pedagógicas e administrativas, na parte das instituições.


Isto é a primeira impressão que o título da escrita de Domingos da Cruz nos transmite. Será que o conteúdo corresponde? Ou, terá o autor – iniciado na engenharia filosófica de metaforizar – lançado um “enunciado” de reflexão para alcançar outros objectivos face as realidades pedagógicas de Angola?


Para um mundo global, globalizado e globalizante/globalizador, a “andragogia” parece a opção para garantir a liberdade do estudante. Baseando nela, a “educação prospectiva” permite que o formando/estudante decida livremente sobre a sua aprovação ou reprovação aos exames, porque dispõe logo no início (do ano académico) do programa de todas as disciplinas, datas das provas do exame, as ferias, etc. Pois, toda educação prospectiva faz com que depois da formação, o formado tenha uma visão programática, cautelosa, medida/preventiva e progressista. E isto é bom para a sociedade progredir. Pelo menos, não será um “Indivíduo de improviso”.


Domingos da Cruz busca, no primeiro capítulo, apresentar esta proposta. Mas, ainda neste primeiro capítulo, ele apresenta as questões lógicas e basilares da comunicação. Grosso modo, há sempre dois modos de comunicar: (i) diálogo, que pressupõe que dois sujeitos partilhando os mesmos códigos, passam-se as ideias um para outro e vice-versa; (ii) monólogo, onde o sujeito fala para si mesmo e cuja expressão é idiossincrática, passível de má interpretação para o OUTRO. Na educação, fala-se do diálogo.


No diálogo, existe “EU” e “TU”. Supõe-se que ambos dominam os mesmos códigos, embora com uma ligeira diferença semântica, textura e subtextos. “EU” é, na filosofia existencialista, o epicentro da Vida. Os abstraccionistas vêem nele a “fonte”, o poder, a essência e, sobretudo, “a mão que move tudo”. Os contemporâneos percebem-se, portanto, que a multiplicidade dos espaços faz com que a composição ontológica do “EU” (parte material e parte imaterial) só tenha sentido com “TU”. Isto é, a construção do “EU” condiciona-se pelo TU: diálogo íntegro. Para tal, ambos devem partilhar os mesmos códigos, as mesmas semânticas e as mesmas lógicas estruturais.


O professorado fundamenta-se no diálogo. A comunicação deve ser clara. E, o professor deverá ter uma dose de racionalidade suficiente para, de mil maneiras, levar até seu estudante as “informações precisas”. Daí, Paulo Freire tenha reflectido sobre o diálogo como “encontro de interlocutores” na construção do conhecimento. Freire introduz – na filosofia pedagógica – outro rosto da andragogia: auto-aprendizagem a partir do diálogo. Como quem diria, o “conhecimento constrói-se no confronto de aportes dos sujeitos interlocutores”.
O professor deve ser detentor de um vasto saber e conhecedor dos seus limites enquanto agente da Educação. Ele deverá perceber, ipso facto, que os seus estudantes são detentores de capitais socioculturais ricos e capazes de contribuir na construção de saber. A sala de aula, porém, deixaria de ser apenas um “lugar onde se aprende”; e passaria, por “um lugar onde se constrói o saber” com os aportes dos estudantes e gestão dialógica promovida pelo professor.


O segundo capítulo é um tema que contém nele vários subtemas. Parece-nos que o autor, propositadamente, constrói cadeias de pensamentos e organiza-as seguindo as relações epistemológicas que operacionalizaram os variados movimentos feministas sobre a educação. A ideia geral parece re-atribuir ao “sujeito feminino” as suas tarefas na educação, partindo dos seus traços da personalidade: afectuoso, amoroso, possuidor da maternidade. Este paradigma é interessante: por um lado, desconstrói o “sujeito feminino” tal como o “mundo neo-cristão” ou “mundo islâmico” o apresentou. Por outro lado, desafia um mundo machista nas questões da “liberdade ontológica” do sujeito na demanda das competências.


Já que falamos da desconstrução, importa explicar que ela “consiste em mostrar como os termos privilegiados são colocados no seu lugar pela força de uma metáfora dominante e não, como poderia parecer, por qualquer lógica conclusiva. […] A desconstrução procura desmantelar a lógica pela qual um sistema particular de pensamento é fundado, assim como todo um sistema de estrutura política e controlo social mantém a sua força” (Madison, 2005:162-163). Psicologicamente, a educação da primeira Infância comunga com o “sujeito feminino”. Mesmo para os alunos primários, nos três primeiros anos de escolaridade, o “professor feminino” é tecnicamente rentável em relação ao “professor masculino” quer no aproveitamento das crianças e seu desenvolvimento psicológico, quer na organização e proficuidade da instituição.


Domingos da Cruz que retoma a “educação de Maria mãe de Jesus” explora os dez princípios que Augusto Cury expôs. Este último autor partiu das hipóteses mais comuns entre os pedagogos cristãos que “conceptualizam”, a partir das virtudes de Jesus, toda moldura que serviu para educação do mesmo. Ainda que seja “pressuposições potencialmente hipotéticas”, elas desenvolvem, sobremaneira, a “educação contemporânea” baseada na Liberdade e exploração das capacidades que apresenta o “sujeito” ao longo da sua aprendizagem. Ora, o autor de Ética educativa à luz da racionalidade, analisa os dez princípios.


O que é mais interessante ainda, o autor chega a estabelecer um quadro axiológico dos valores que esta “educação de Maria, mãe de Jesus” proporciona. Ele cita cerca de dezasseis grupos de valores.
Embora relativamente diferente, a nossa visão da educação baseada na “Razão Tolerante” seria a seguinte: na base desta pirâmide deve existir o “Amor ao próximo (Solidariedade) como valor social”, que proporciona: “liberdade como valor interpessoal” e “Auto-crítica como valor intra-pessoal”. As relações destes valores promovem a Justiça. Por isto, “Justiça como valor social” só é alcançado por um lado, “Honestidade como valor intra-pessoal” e, por outro, “Afabilidade como valor interpessoal”. Com a Justiça, pode se estabelecer o Trabalho: o “Trabalho como valor social” faculta “Criatividade como valor intra-pessoal” e “Compromisso como valor interpessoal”. Visto que perante a Justiça, os “sujeitos” são herdeiros de capitais sociais, culturais e académicos desiguais, a “Paz como valor social” parece ser condicionada pela “Auto-estima como valor intra-pessoal” e pela “Reconciliação como valor interpessoal”. Finalmente, no cume desta pirâmide, teremos “Progresso como valor social” baseado na “Criatividade como valor intra-pessoal” e na “Concorrência como valor interpessoal”.


Voltamos ao Domingos da Cruz. Com o seu quadro sinóptico dos valores, ele desenvolve – dentro da Lógica que se serve para estruturar as cadeias das relações entre os valores – a sua teoria perante os problemas actuais da educação, onde a Internet, Videogame, Televisão (programas da Televisão), etc. têm servido de veículo consistente da informação. Quer dizer, estes instrumentos modernos cuja comunicabilidade perpetra hoje o sistema educacional, os programas académicos e invadem, sobremaneira, os “espaços da Educação” proporcionam uma série de problema que, na visão do autor deste texto, precisaria algumas Reformas com a filosofia da “educação de Maria, mãe de Jesus”. Aliás, o autor identificou alguns destes problemas, criticou e apresentou as suas leituras correctivas.


Nas recomendações finais, a “Educação de Maria, mãe de Jesus” (o autor prefere Pedagogia de Maria) é retomada como “pretexto” de repensar sobre as marginalizações arbitrárias do “sujeito feminino”. E, se algumas teorias da Psicologia recomendam a figura do “sujeito feminino” na educação do Homem – quer que seja sua missão de vida ou na vida – este apelo me parece justo, e Angola teve “filhas”dignas que possam servir de exemplo. A mwêne (soberana) Ñjîng’a Mbândi, por exemplo.