Luanda - Os atos de barbaridade do dia 23 de Novembro de 2013, em Luanda e nas Províncias, protagonizados pelo Regime Angolano, vieram a lume dois fatos indubitavelmente inquestionáveis, sendo: a) A ideologia totalitária do MPLA, na sua essência teórica e prática, mante-se constante e inalterável, como Filosofia do Estado.

Fonte: Club-k.net

b) Em contraste, a determinação do povo angolano de defender a pluralidade política, buscando a cidadania, a liberdade, a democracia e a autodeterminação, como pressupostos fundamentais do Estado Angolano, mantêm-se firme e permanente.

Esta realidade, de preceitos políticos contraditórios, que caracterizaram o nacionalismo angolano, que estiveram na base da antítese ideológica, do antagonismo político e da ruptura, ficaram ocultos e disfarçados pelo conflito armado, nas diferentes etapas do encadeamento revolucionário.

Por muito tempo, esta realidade inequívoca, serviu de máscara para iludir a consciência popular dos angolanos, lançando-os no abismo do obscurantismo político. Foi por estes carris que desenrolou-se todo o teatro de intoxicação das mentes e da diabolização dos adversários políticos.

Só que, por mais subtil que seja uma trama; e por mais ingênua que seja a consciência de uma pessoa; mas os fatos são pertinazes; acabarão sempre por sobressair e afirmar-se inegavelmente. Pois que, a vida humana é um círculo de atividades dinâmicas ininterruptas, que não sujeita-se eternamente ao poder alheio, cuja dimensão racional permite desvendar o mistério do dogmatismo político-ideológico – na sua manifestação teórica e prática.

Nada mais que é tão válida e tão sagrada como a vida, que deve ser respeitada, protegida e salvaguardada, como um dever básico de cada Homem e do próprio Estado – como pessoa de bem. Não é aceitável que, em plena paz militar, o Estado falte a sua responsabilidade de proteger a vida humana e se pratique a barbaridade, no uso desmesurado da força, numa manifestação clara de abuso de poder e da impunidade.

Só a tirania que é capaz de atribuir para si próprio este poder ilimitado de se colocar acima do povo e da lei, chamando a si a legitimidade do poder absoluto. Pensado que, a sociedade humana pudesse ser modificada, guiada e oprimida ao seu bel-prazer; e que o poder era chamado a isso na qualidade de detentor da soberania.

Ao passo que, na verdade, a possibilidade de guiar as mulheres e os homens é muito restrita.Além disso, o Estado não pode desconhecer a sua história, as convicções do seu povo e as leis e os costumes existentes. Ele, o Estado, deve ainda tomar decisões segundo um procedimento no qual os diversos centros do poder podem exercer influencia.

Logo, a desconsideração absoluta da existência do grande mosaico étnico-cultural angolano, da pluralidade política, dos costumes e das convicções profundas deste povo multirracial, sempre esteve na origem da discórdia e do antagonismo do nacionalismo angolano.

O preceito ilusório da prevalência do pensamento único, com a legitimidade política absoluta de governar e representar o povo angolano, foi o factor-decisivo da guerra civil que devastou o país desde o 25 de Abril de 1974. Este pensamento maníaco expressou-se nitidamente no encadeamento desta crise que culminou na tragédia do dia 23 de Novembro de 2013.

A busca do totalitarismo, a todo custo, por MPLA, é o maior obstáculo à conquista da paz duradoura, da reconciliação de todos os angolanos e da estabilidade social e política. Enquanto este pensamento autocrático e sectário manter-se inalterado e contínuo, a resistência do povo angolano será igualmente firme e indomável.

Convém notar que, pela primeira vez, na época contemporânea, pós-guerra civil, a cidadania prevaleceu sobre a identidade partidária e o povo levantou-se na maior parte das províncias, contra os assassinatos cruéis e bárbaros dos dois Heróis cívicos – Kamulingue e Kassule.

Tivera sido igualmente a primeira vez em que houve uma aproximação entre os partidos políticos de Oposição, na criação de sinergias fortes, num ato verdadeiramente cívico, de solidariedade e de reivindicação pelos direitos, liberdades e garantias fundamentais, plasmados na Constituição da República de Angola e do Direito Internacional.

Além disso, desfez-se o mito de que, Luanda tivesse sido o bastião firme e inabalável do MPLA; sendo onipotente e todo-poderoso. Se, de facto, isso fosse real, para que tanto susto e tanto medo diante uma manifestação cívica e pacifica: com tanta violência gratuita? Com tanta força desmesurada de tanques, helicópteros, armas pesadas, cavalaria e cães caninos? Com unidades especiais das FAA? Com polícias, agentes secretos e esquadras da morte? Com uma comunicação social massiva – rádio, televisão e as redes sociais? Tudo isso, lançado contra os manifestantes pacíficos e sem armas nenhumas em sua posse.

Onde estará a cidadania, o Estado democrático e de direito? Onde estará o arquiteto da paz que tanto se alimenta do revanchismo e da vingança? Quem perpetuou o 27 de Maio, o maior holocausto de sempre, nunca vivida em África? Em que circunstâncias tivera sido morto o vice-presidente do MPLA, Matias Mingueis, em Brazzaville? Enterrado vivo com pescoço e a cabeça sobre a superfície da terra durante dois dias em agonia; enquanto as mamas da OMA urinavam por cima da cabeça e da boca dele, até sucumbir-se. O que isso!

Muitas atrocidades foram perpetradas pelos três Movimentos de Libertação (FNLA/MPLA/UNITA) de Angola. Dos três, ninguém saiu com as mãos limpas do sangue dos angolanos. Por isso, não é por ai que passa a imaculabilidade de qualquer um dos três protagonistas do nacionalismo angolano. Não interessa ninguém insistir-se neste passado tenebroso que deixa dignificar a História de libertação de Angola.

Logo, porque este fardo do passado deve pesar permanentemente sobre os nossos ombros e dos ombros das gerações vindouras? Será esta a forma verdadeira de se reconciliar entre os irmãos desavindos do passado, cujo passado já ficou atrás e deixou feridas graves e cicatrizes profundas em todas famílias angolanas?

Esta cultura da morte terá qualquer virtude de construir um futuro risonho e fraterno para a futura geração que não tem nada com este passado que tanto invocamos, sem cessar? Neste respeito, aqui em Lisboa, onde escrevo esta reflexão, alguém de boa-fé interrogou-se:

“Não será que, com esta cultura de matanças constantes que o MPLA protagoniza, no tempo da paz, estivesse na base do ceticismo prudente do Dr. Jonas Malheiro Savimbi diante o MPLA e seu líder? A final, de que lado estará a verdade e a razão?”

Enfim, seria uma ingenuidade, por minha parte, se apelasse ao bom senso da liderança do MPLA; porque a ideologia deste partido funda-se invariavelmente no pensamento único e na imposição do regime político totalitário, de facto; destruindo impiedosamente as outras forças políticas angolanas, utilizando todos os meios do Estado em sua posse.

Qual é a diferença entre o regime fascista do Salazar e o regime atual que oprime e mata o seu povo sem escrúpulo e sem piedade? Que lição se tirou do ato heroico do 4 de Fevereiro e do Processo 50, cujos protagonistas sobreviventes ainda se encontram no nosso meio?

Por isso, a minha súplica dirige-se a todos os cidadãos angolanos, sem exceção, para cada um de nós, independentemente da cor da sua camisola ou de sua crença, possa meditar-se profundamente sobre a nuvem bem carregada que paira sobre nós. Libertemo-nos, com toda coragem, de todos os preconceitos errôneos que não nos unem como irmãos e irmãs da mesma pátria – una e indivisível; que destrói a nossa felicidade; que mina o nosso amor; que ameaça os alicerces da paz e da reconciliação nacional; e que inibe a nossa liberdade.

Solidarizemos com as vítimas do 23 de Novembro de 2013, que levantaram bem alta a bandeira dos Heróis Kamulingue e Kassule pelos direitos cívicos e políticos; pelos quais derramaram o seu sangue. Por isso, a sua Alma é a inspiração profunda do patriotismo angolano e o baluarte da luta pelo Estado social, democrático e de direito. Pugnemos pela nossa cidadania, liberdade, autodeterminação e «o direito a vida».

Bem-haja o povo angolano! Bem-haja os Mártires do 23 de Novembro de 2013! Bem-haja os Heróis Kamulingue e Kassule! Viva a Paz e a Democracia!