Lisboa - Em entrevista à Rádio Ecclesia, o Segundo Comandante Geral da Polícia Nacional de Angola diz que a repressão às últimas manifestações serviu para impedir “o assalto ao poder”.

Fonte: esquerda.net/makaangola

As primaveras árabes continuam a assombrar o regime angolano e na entrevista concedida à Rádio Ecclesia, o Segundo Comandante Geral da Polícia Nacional de Angola voltou a usar o mesmo argumento para justificar a violência da repressão às manifestações dos últimos meses.

Referindo-se em concreto à manifestação de dia 23 de novembro, onde participaram vários partidos da oposição, Paulo Gaspar de Almeida declarou que “os objetivos não eram aqueles que realmente eles queriam fazer. Os objetivos, pelo que nós sabemos e temos provas, eram para a tomada do poder. Era para o assalto ao poder”.

O responsável policial não adiantou que provas seriam essas, mas a manifestação de protesto contra o assassinato após tortura de dois ativistas pelos direitos dos militares veteranos foi reprimida com gás lacromogéneo, bastonadas e disparos que provocaram vários feridos. 300 pessoas foram presas e houve rusgas em sedes da UNITA e CASA-CE.

Durante a madrugada, a Guarda Presidencial assassinou um militante deste partido que colava cartazes a pedir justiça para Cassule e Kamulingue, os ativistas raptados pela polícia secreta e que tiveram paradeiro desconhecido por mais de dois anos.

“Não podemos permitir isso”, prosseguiu o número dois da polícia angolana, invocando o fantasma das Primaveras Árabes. “Se querem imitar o que se passou no Egito ou na Líbia, tenham paciência que aqui as autoridades não vão permitir”, concluiu Paulo Gaspar de Almeida.

O responsável policial mostrou-se ainda incomodado com os ecos internacionais da repressão aos protestos pacíficos em Angola. E deu o exemplo português para dizer que “ainda há pouco tempo os polícias foram rechaçados à porta da Assembleia e não vieram aqui para Angola queixar-se!”

Rafael Marques: “Gostei da franqueza do comandante”

No portal Maka Angola, o jornalista e ativista dos Direitos Humanos Rafael Marques declarou-se satisfeito com “a franqueza do principal responsável pela ordem pública no país”, ao declarar que “para si, a ideia de manifestação pacífica é apenas uma propaganda contra o poder”.

“O comissário-chefe confirmou, sem tergiversar e com orgulho, que é o comandante da repressão contra o exercício dos direitos civis e políticos consagrados na Constituição, mas incómodos para o regime”, comenta Rafael Marques, que nos últimos anos tem procurado responsabilizar na justiça angolana os autores dos maus tratos e escravatura praticados no setor diamantífero.

“Com serenidade, o comandante também deixou claro que o papel fundamental da Polícia Nacional é o da defesa do poder presidencial de José Eduardo dos Santos. A Constituição é o chefe, o resto é irrelevante”, acrescentou.

Rafael Marques estranha ainda a teoria de Paulo Gaspar de Almeida sobre o suposto “assalto ao poder” que teria lugar a 23 de novembro, uma vez que “bastou apenas a repressão, à bastonada e com gás lacrimogéneo, dos manifestantes que se preparavam para assaltar o poder”.

O jornalista refere que “é um caso raro no mundo uma tentativa de golpe ser repelida exclusivamente por forças policiais, usando apenas os seus métodos embrutecidos de pancadaria”, para além de considerar estranho que nem um suspeito da intentona tenha sido detido e não haja uma única ação criminal interposta justiça contra os supostos “assaltantes do poder”.

Caso do general acusado de tráfico de mulheres: “Os camaradas ficam aqui”

O responsável policial também foi questionado pela Radio Ecclesia sobre a situação do general Bento Kangamba, procurado pela justiça brasileira por tráfico de mulheres para prostituição, Paulo de Almeida não quis adiantar nenhuma posição da polícia, mas não se coibiu de dar a sua opinião.

“Somos um Estado soberano, tem de haver respeito. Não há nenhum acordo de extradição, portanto os camaradas ficam aqui, estão em Angola e podem circular à vontade”, concluiu.