Luanda - Faleceu recentemente,  Suzana Kathuñga, uma jovem mucubal (um pequeno grupo étnico localizado na província da Huíla).  O Padre Jacinto Wacussanga que no inicio apoiou a evacuação da paciente da ex- paciente do Hospital Central do Lubango  para o Hospital Maria Pia, em Luanda, dá o seu testemunho nas linhas que se seguem. 

Fonte: Jacinto Wacussanga

A notícia penetrou-me o coração como uma adaga. Fiquei por momentos silencioso, a contemplar a crueldade do fado. Mas também vieram à minha memória o estoicismo desta menina de quase 22 anos que quis encarar a morte face a face. E viu-a a chegar, lenta e dolorosa. Sem pressa.Foi uma verdadeira odisseia, permeada de esforços verdadeiramente titânicos, com actores de diferentes latitudes, tentando ajudar a Suzana, alviando a sua dor, quer psicológica, resultante da rejeição doentia por parte de certos lunáticos que encontram sossego na discriminação, quer a dor física, a de enfrentar diariamente algum bicho que lentamente roía sua carne fresca de menina.

 

A primeira parte da Odisseia iniciou junto de seu torrão natal, o Tyipeio, onde ela foi encontrada por nós, junto da mãe, a sofrer desta úlcera cruel que a dilacerava. Contactada a mãe e outros parentes, todos acederam para que escalasse a Serra da Chela e fosse procurar por melhores tratamentos. A Secção Municipal da Saúde disponibilizou sua ambulância e outros meios, para a levar ao Hospital Central. Posta aí, um médico, penso de origem eslava, atirou na minha cara: "Eu não tenho lugar para esta doente. Ela está em fase terminal. Prefiro ter cama para um doente que eu sei que vai ter chances de curar do que ela" Por mais que tentássemos advogar a causa, debalde! Tendo apelado a amigos, o caso chegou à Direcçaõ Provincial da Saúde que moveu meios até ela parar em Luanda. 

 

Posta no Hospital Josina Machel, ela literalmente foi expulsa, tendo de ficar com a uma Congregaçáo de Irmãs (o nome foi omitido para salvaguardar sua privacidade). Estas, cheias de coragem, acolheram a menina, enquanto se encontrara uma saída. Responsáveis do Ministério da Educação tomaram conhecimento do tratamento dado à Suzana e reagiram, tendo chamado à pedra os fautores. A comunicação social foi crucial para que o caso fosse dvulgado e conhecido, levando às pessoas e instituições a tomar medidas, todas convergentes para ajudar a Suzana. 

 

 

Como que por um milagre,ajudada por tantas mãos, ela foi parar à caríssima Multiperfil, onde esteve internada durante mais de 10 dias, enquanto se esperava pelo resultado da Biópsia. Ninguém pagou um centavo. Deus bendiga estes valorosos médicos, que ultrapassaram o limite comum do tratamento indigno a que o pobre em Angola está votado. O resultado da biópsia revelou um cancro maligno, que já está a dilacerar seus tecidos há quase três anos. Foi como que o céu desabasse sobre todos os envolvidos no caso.

 

Ela voltou à Huíla. Veio sorridente, bonita, cheia de sorrisos e de tanta gratidão, por tantas mãos, visíveis e invisíveis, a terem ajudado a chegar tão distante. Instámos com ela, para que ao menos ficasse na sede municipal dos Gambos, a vila do Chiange, perto do Centro Municipal de Saúde. Mas ela estava irredutível. Preferia estar perto da mãe, dos parentes e junto dos Onohande, os espíritos ancestrais, a fim de encarar os próximos dias. 

 

Nos últimos dias, quando fomos levar as sementes de mandioca e batata-doce ao Fimo, ela estava recolhida na sua casota, mas muto fraca, a voz trêmula e quase inaudível. 

 

A úlcera tinha avançado tanto que já mal movia os maxilares. Mas lá estava ela, estóica como sempre, verdadeiramente mukuvale, upper lip stick, como se fala dos estoicismo dos ingleses.

 

Até que, rodeado da mãe, do tio Gabriel, aos 17 de ;Maio, expirou.

 

Fiquei como uma grande dor: ela queria tanto ver a sua única filhinha, a Savita, mas ao tempo de seu desiderato, o caminho estava enlameado pelas últimas enxurradas de Abril e a travessia era quase impssível. Nem sequer reclamou, sabendo dos empeclhos que tal acarretava.

 

Ela foi-se, preferiu vencer de uma vez por todas a barreira da dor que a dilacerava, apagando-se para sempre para este mundo e deixando o lastro lumnoso de sua passagem, através de um sorriso vívido: a sua única filhinha, a Savita de Fátima, a viver el Luanda com sua querida mamã adoptiva. Está tão bem adaptada a Luanda e à sua nova família, como que se a Providência, ao transplantar a árvore, desta para a eternidade, nos legasse esta lnda semente.

 

Gostaria de informar a todos quantos quiserem estar connosco, que em data a marcar, iremos ao Fimo prestar uma singela homenagem a esta heroína, vencedor da dor e da dscriminação, a Suzana Kathuñga. Paz à sua alma.