Luanda - O secretário-geral da FNLA, David Alberto Mavinga, que, em Maio último, remeteu uma carta ao líder do partido, Lucas Ngonda, na qual ponderava a hipótese de se demitir em protesto pela forma como esta força política estava a ser conduzida, cinco meses depois volta com novas revelações.

Fonte: O País
Desta vez, David Mavinga eleito no “conturbado” Congresso de Julho de 2010, realizado em Luanda, voltou à tona pedindo a demissão incondicional de Ngonda, declarando não lhe reconhecer mais autoridade nenhuma, depois de cessar o seu mandato há dois meses.

Em entrevista concedida a este jornal em Benguela, Mavinga acusou Lucas Ngonda de atropelar os estatutos do partido, ao furtar-se de convocar o 3º Congresso ordinário, como prevê os Estatutos desta tradicional força política. Segundo esta terceira figura na hierarquia deste partido, o pretexto apresentado por Lucas Ngonda de condicionar a realização do Congresso em 2014, com base na falta de dinheiro, é uma “estratégia de pretender permanecer na liderança até em 1917”, acusou.

David Mavinga justificou que desde que Ngonda assumiu a liderança do partido, “nunca demonstrou que algum dia irá largar o cargo, pela forma abusiva como dirige o partido, razão pela qual está a adiar o Congresso”, acrescentou.

A fonte deste jornal revelou que o partido recebe uma verba semestral de mais de 300 milhões de kwanzas do Orçamento Geral de Estado (OGE), e “não há razões para alegar falta de dinheiro para realizar o terceiro Congresso”, insistiu.

A fonte reforçou dizendo que o líder do partido sabia que devia convocar o Congresso três meses antes do fim do seu mandato, mas não o fez “ porque não está interessado ”, desabafou.

David Mavinga contou ainda a este jornal que há muito vinha desconfiando das “manobras perigosas” encetadas pelo seu presidente para que inviabilizasse a realização do conclave ordinário. “Agora conclui o que antes presumia”.

Para a fonte, Ngonda denotava esta atitude desde a altura em que começou a dirigir-se aos demais membros do seu elenco com “arrogância e petulância, dizendo que ele era o presidente e somente ele decidia”, sublinhou.

Controlo das Finanças

E é com base nestas suas decisões unilaterais que Ngonda terá supostamente chamado a si a gestão financeira do partido, em detrimento do secretário-geral, conforme consta do artigo 39, nº 2, alínea a, dos Estatutos do partido.

“Infelizmente não me deu este direito que está consagrado nos estatutos”, queixou-se, revelando adiante que Ngonda terá usado indevidamente o dinheiro deixado pela antiga direcção de Ngola Kabangu na conta do partido domiciliada no Banco de Poupança e Crédito (BPC).

A fonte não avançou a quantidade do valor encontrado, mas admitiu a hipótese de ter sido “uma boa quantia”, mas que disse nunca ter sido justificado o seu paradeiro junto das estruturas do partido, reforçou.

David Mavinga acusou ainda Ngonda de nunca ter apresentado até à data, o relatório do exercício do fim do ano de 2012-2013 enviado ao Tribunal de Contas (TC), pelo que pede a esta instância jurisdicional para fazer uma sindicância às contas desta organização política.

Ngonda “versus” Kiazembwa

Referiu que até as sugestões do seu vice-presidente, o veterano “maquizard” Jorge Vunge Kiazembwa não eram válidas, e sobretudo as que falassem do Congresso, o que deixava o seu adjunto irritado. Explicou que numa reunião com os membros de direcção houve altercação entre o presidente e o seu vice e só não aconteceu o pior, graças à pronta intervenção dos demais que evitaram que houvesse uma cena de pugilato.

Desde aquele dia até por altura em que o vice-presidente colocou também em Maio do ano em curso o seu lugar à disposição, baseando-se nos depoimentos da fonte, a cordialidade entre ambos azedou-se.

Decepção

O político de 69 anos, nascido em Belize, Cabinda, reforçou que Lucas Ngonda, de quem disse estar decepcionado incriminou-o ainda de “dirigir o partido “como se fosse sua propriedade”, sentenciou.

Durante a conversa mantida num dos espaços verdes da cidade de Benguela, Mavinga afirmou sem rodeios que Lucas Ngonda gaba-se nos círculos restritos (académicos e políticos) como sendo “o único que sabe tudo no partido, o resto não sabe nada, não pensa, enfim”, disse.

E é com base no suposto egocentrismo do presidente, segundo a fonte, que o partido fracassou nas eleições gerais de Agosto de 2012, tendo eleito apenas dois deputados dos três saídos da antiga Legislatura de 2008. Contra o líder do partido, professor Lucas Ngonda pendem ainda acusações de ter relegado para plano secundário o vice-presidente Kiazembwa na lista dos deputados do círculo nacional “indo buscar o irmão Francisco Mendes que estava no fundo da lista”.

Plano Anual de Actividades

Neste plano traçado em finais de 2013 e exibido a OPAÍS, constam uma série de reuniões que deviam ser realizadas até ao fim do mandato, em Julho último, mas o mesmo fracassou e não foi cumprido nem sequer 20 por cento, segundo David Mavinga.

Entre as várias reuniões constantes neste plano, destacam-se às do secretariado do bureau político, bureau político, comité central, encontros metodológicos com os secretariados provinciais, visitas de ajuda e controlo, seminários e outras.

A fonte explicou que o referido plano foi elaborado por consenso pelas estruturas competentes e aprovado por ele próprio, mas “ infelizmente não cumpre”, afirmou, acrescentando que Ngonda está a “servir-se do partido e não a servir o partido”, declarou. A fonte afirmou que raramente aparece na sede do partido onde tem o seu gabinete, e das poucas vezes que se faz presente, fá-lo de “relâmpago, trata as coisas com quem quiser e depois vai-se embora”, denunciou.

Mavinga disse estar desapontado com a atitude do seu “chefe”, embora diga não arrepender-se de ter sido indicado por ele para o cargo que ocupa durante a corrida para a eleição desta direcção em 2010.

“Fiz parte do elenco que estatutariamente cessou o seu mandato de quatro anos, em Julho. Não estou arrependido, mas desiludido com a gestão danosa do presidente Ngonda”, disse, reforçando que é necessário a realização de um conclave urgente para se tirar o partido do marasmo em que se encontra.

SG substituído

David Mavinga minimizou a sua substituição do cargo por Pedro Mukumbi Dala, com base numa decisão saída da primeira reunião ordinária do Comité Central (CC),realizada no dia 22 de Junho, em Luanda, e presidida pelo líder do partido.

Para repor a legalidade dos factos, Mavinga prometeu impugnar todos os actos administrativos praticados pelo presidente Lucas Ngonda, a partir de Outubro de 2012, altura em que expulsou um grupo de seis membros do bureau político, através do despacho 44/2012.

O PAÍS contactou o acusado para se pronunciar sobre o assunto, mas sem sucesso. O mesmo aconteceu com o porta-voz da FNLA, Ndonda Nzinga, depois de várias insistências.