Luanda - Ainda estou chateado pela mina inclusão na lista de «bufos» do choné do Fernando Vumby. Embora me pareça que será a coisa mais descabida já dita nos últimos cinquenta anos e ser como que uma ofensa à «resistência» secular dos angolanos contra todas as dominações, não deixou de fazer alguns estragos. É que se pode destruir em poucos segundos uma reputação conquistada à custa de muitos sacrifícios ao fim de uma gesta de mais de 45 anos.

Fonte: Facebook

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Penso que serei lembrado como um cidadão nada parvo, amigo dos seus amigos, «revolucionário» umas vezes, «conservador» noutras», algo independente em termos políticos mesmo sendo membro de um grande partido, interessado no desenvolvimento do seu país, mais ou menos humanista, não dominado mesmo subjugado, enfim, mas nunca colaboracionista puro e simples, como o «nosso» Vumby pretendeu fazer crer. Bem estava a desconfiar que lhe tinham feito algo de muito sério para ele desenvolver o ódio doentio e gentio que tem pelo regime. Como se pode depreender, eu não tenho culpa que lhe tivessem sodomizado, nem tive coisa alguma a ver com o «27 de Maio».

Quando se deu isso, era um rapazola de 17 anos, que estudava a sétima classe no último ano (transição) da Escola Comercial Vicente Ferreira. Estava atrasado porque entrara com nove anos na escola, mas devo ter passado despercebido aos olhos dos algozes (era aluno de vintes), senão é provável que a estas horas também estivesse com alguns rancores contra quem executou a purga. Pura fezada minha. Ainda assim, deve ser pelos «vintes» nas escolas que me lixaram a vida académica – já falei da bolsa de estudo roubada pelo Galo Negro, da perseguição do Dr. Evaristo e da outra que escondeu o meu processo na Faculdade de Direito da Agostinho Neto durante oito anos. Também teria motivos para desenvolver ódios doentios, por isso e por outras que já me fizeram, mas cá estou, sempre a resistir com a devida serenidade. Por isso é que me considero um «resistente». Dos puros.

Nunca poderia alinhar na bufaria, precisamente por ter crescido num ambiente político em que os «bufos da pide» eram os principais inimigos. Explico: o meu padrasto, sr. Manuel João Afonso Neto, foi preso político num importante processo julgado em 1963. Saiu em 1968. Me lembro de alguns nomes sonantes que foram seus copanheiros: Roberto de Almeida, Lopo do Nascimento, João Filipe Martins, Bernardo de Sousa, Duducho, Hermínio Escórcio, Rui Gonçalves, entre outros. Quando ele e alguns companheiros estivessem a ouvir o «Angola Combatente», era eu precisamente quem tinha a missão de fazer a vigilância contra os «bufos da pide». Portanto, desde então que abomino esta «raça».

Este meu envolvimento na luta clandestina, a partir dos oito anos, desenvolveu em mim um sentimento de negação ao colonialismo, que terei sido dos poucos miúdos a enfrentar abertamente as autoridades coloniais, ao me recusar a cantar o hino português no início duma aula na escola da Micate (há aí gente que pode comprovar) e me valeu uma boa surra de porretes na sexta esquadra. Mesmo assim, sempre continuei a «fringar» com os tugas, que até eles no bairro, à minha passagem, diziam: «lá vem o turra, lá vem o turra». E tenho outras histórias de «resistência» já mais p’ra cá que poderia contar, mas, como já vou longo, talvez o faça só um dia desses, aqui ou no meu livro de memórias. Portanto, não posso estragar a minha reputação de «cidadão resistente» construída com muitos e ingentes sacrifícios, alguns dos quais continuo a consentir, com colaboracionismos bacocos em bufarias bofianas. Nem aceitar que um filho da puta qualquer o faça. Vá lá tomar no c… em outra freguesia, senhor Fernando Vumby. Ou então aceite o meu conselho: regressar ao país, que o Papá Kitoko ainda te pode salvar.