Luanda - Apesar de o Instituto dos Serviços de Veterinária ter garantido, por intermédio do seu titular, António José, que a situação estava controlada, ao ponto de terem sequestrado os produtos contaminados, grande parte das pessoas entrevistadas, receia que os negociantes troquem as embalagens dos frangos contaminados por outros credíveis no mercado.

Fonte: O Pais
Frangos.jpg - 35.03 KB“Nós podemos saber que a marca do frango é Pluvera, mas os nossos vendedores têm sempre forma de enganar os clientes, porque eles têm como trocar as embalagens ou mesmo vender frango fora do saco”, disse um revendedor dos conhecidos produtos frescos, no mercado do Cantinton, distrito urbano da Maianga, tendo avisado que o perigo estava mais para o lado das senhoras que confeccionavam refeições e as vendiam ao ar livre, em barracas, ou mesmo restaurantes.

De acordo com o entrevistado, nestas circunstâncias, o cliente dificilmente tinha mecanismos para identificar se se tratava de frango pluvera ou não, porque a ele só se apresenta a comida já pronta.

Por uma questão de precaução, embora seja negociante da área dos produtos frescos, como pai de família recomendou aos seus agregados para não consumirem mais carne de frango ou da vulgarmente conhecida como “galinha rija”.

Quem alinhou no mesmo diapasão foi a vendedora Maria, encontrada a comercializar o frango Sul, no mercado da Madeira, no bairro Gamek.

Segundo ela, os seus filhos estão proibidos de comprar frango assado na rua, porque nunca sabem quando é que vão consumir comida envenenada. Devido à sua experiência em lidar com os produtos do género, Maria assegurou que a responsabilidade de comprar qualquer tipo de carne para casa sempre foi sua.

A vendedora falou sobre a possibilidade de se adulterar o produto, através da mudança de embalagens, tendo acrescentado que, no mercado informal, essa tendência não cobrava muito esforço. “Aqui onde se cozinha e se vende frango e galinha rija em partes, é normal os sacos ficarem por ai, então é fácil alguém pegar nesses sacos e colocar dentro do mesmo outro”, declarou Maria, tendo revelado que já viu muita gente a fazer isso.

Sem querer menosprezar outras tendências, a própria disse que a carne é o produto com mais facilidade para ser adulterado, porque as pessoas não têm muito tempo a perder para perguntar se é mesmo de galinha ou de cabrito.

Por sua vez, Manuel Cambundo duvidou da prudência por parte daqueles que ele trata de cantineiros. “Eu não acho que os cantineiros vão aceitar perder dinheiro, se já tiverem esses frangos nas suas arcas frigoríficas. O que pode acontecer é mesmo eles mudarem de embalagem ou cortar o frango para vender aos poucos”, disse Manuel Cambundo, adiantando que as pessoas não terão outra medida senão deixarem de comer esse tipo de carne durante algum tempo.

Ainda na senda das dúvidas, o interlocutor desacreditou o facto de, em pouco tempo, nenhuma cantina da sua área ter estado a comercializar o frango indicado.

“Também eu não aceito que nenhuma cantina do bairro vendia este frango, mas a verdade é que, em menos de um dia do anúncio, a marca desapareceu das lojas”, considerou Manuel, tendo garantido que, na semana que antecedeu esta reportagem, tinha visto as embalagens verde, vermelha e dubranca. Para o munícipe de Belas, os órgãos de fiscalização desses produtos deviam trabalhar na antecipação, ao invés de se lançarem ao campo depois do alimento ter servido para muita gente.

Pluvera na arca

No último dia do mês de Setembro e no primeiro de Outubro, a reportagem deste jornal efectuou uma ronda nos bairros da Samba, Corimba, do Rocha Pinto, Morro Bento, Gamek, e Morro da Luz, além do Futungo, Benfica, Quilómetro 30 e Ramiro, tendo visitado, em cada um deles seis lojas, vulgarmente denominadas de cantinas.

Curiosamente, em nenhuma das 53 cantinas foram encontrados frangos Pluvera, entretanto, a maior parte dos oeste-africanos, principalmente malianos e oriundos da Guine Conacry, contactados por O PAÍS admitiu já ter visto as referidas embalagens em alguns dos armazéns onde adquirem esses alimentos.

“Já vimos lá onde compramos, mas nunca trouxemos aqui, porque não estamos habituados a vender esta marca, disseram Abdul, Dyalo e Kabá.

Questionado se, no Morro da Luz, havia a possibilidade de se encontrar tal produto, eles negaram a eventualidade, argumentando que todos os estrangeiros que exploram as lojas dessa área eram muito ligados e tinham a mesma fonte de compra.

Enquanto decorria a conversa com os estrangeiros, um cliente que comprava fraldas na cantina de Dyalo, apercebendo-se do tema em abordagem, ligou abertamente para a sua esposa a quem pediu para confirmar, imediatamente, a marca do frango que estava na arca frigorífica.

“A minha dama afinal comprou esse tal de Pluvera”, desabafou, olhando para a equipa desta reportagem, ao mesmo tempo que a convidava para chegar à sua residência. Postos aí, a mulher do indivíduo que pediu para não se citar o nome de ninguém de casa, informou que adquiriu o frango das senhoras que vendem nas imediações dos blocos dos Congolenses, distrito do Rangel.

Embora não tenham aceitado dizer se já tinham comido parte do produto, na arca havia apenas uma embalagem. Visivelmente preocupados, procuraram saber quais eram as consequências ao nível da saúde humana.

Diarreia e doenças respiratórias

Para responder às inquietações dessa e outras famílias que já consumiram o frango Pluvera, um especialista em saúde pública disse que Salmonelas constituíam bactérias que actuam no aparelho digestivo, obstruindo a ocorrência dos nutrientes para o fígado.

“Uma doença consequente da ingestão desses alimentos é a diarreia, porque se a absorção não ocorre, há trânsito rápido do bolo alimentar para o bolo fecal.

Sendo o aparelho digestivo porta de entrada para outros, vai acontecer a não absorção de energia ou açúcar necessários para alimentar o sistema nervoso, soube O PAÍS do especialista, que revelou também haver condicionamento nos aparelhos respiratório e circulatório, já que, para o açúcar chegar ao sistema nervoso, era transportado pela corrente sanguínea.

Armazéns de importação controlados

O Director Nacional dos Serviços Veterinários, António José, assegurou que os armazéns de importação estão sob o controlo da equipa deste sector do Ministério da Agricultura, que teve como tarefa primária inspeccionar todo o produto armazenado de origem Belga.

António José adiantou que a única dificuldade que o seu elenco encontra, durante o trabalho de inspecção, reside no facto de os lotes não serem uniformes, ou seja, que num único contentor podia ter mais de três lotes e não unicamente o Pluvera com a referência do frango contaminado.

O responsável falou da colaboração que os armazenistas estão a dar aos inspectores, tendo aproveitado para lançar um apelo ao público consumidor, no caso de conhecerem outras fontes.

Como foi detectado

Através de uma notificação de alerta número 2014.1257-add 01 (158226- 156484) datada de 12 de Setembro de 2014, proveniente da Direcção Geral de Saúde e Consumidores da União Europeia, através do sistema de alerta rápido para os alimentos e rações sobre contaminação por Salmonella Enteridis em frangos crus congelados de marca ou nome comercial Pluvera, com peso de cerca de 1, 3 Kg, código de barra número 8712235013008, sendo a data de fabrico 12 de Junho de 2014 e de caducidade, 31/01/2016, com os códigos de lote número 14061202 e 14061204, produtor KAASEN & Co N.V – PLUVERA, provenientes da Bélgica, passada para o Instituto de Serviços de Veterinária do Ministério da Agricultura.

Gestor recomenda destruição do produto

Para um gestor de armazéns de importação, a desconfiança da população deve-se a falta de uma medida convincente dos órgãos de fiscalização.

“É normal que as pessoas desconfiem de uma possível substituição de embalagens para prevalecer a comercialização do frango Pluvera, porque o produto detectado existe por aí”, considerou o gerente, tendo salientado que, embora nunca tenha testemunhado um acto igual, para o seu sector, essas práticas de adulteração só dependiam do sentido de oportunidade.

O gestor disse que, quando se detectava um produto contaminado, os armazenistas tinham obrigação de dirigir um documento à Empresa de Limpeza e Saneamento de Luanda ELISAL e à Polícia Económica para se proceder a destruição do mesmo.

Cumpridos esses parâmetros, reforçou o interveniente, os armazenistas podiam abrir a possibilidade de recuperarem o dinheiro gasto na compra da mercadoria, caso se observassem também as condições de seguro de actividade comercial.

Momentos antes do fecho desta edição, a redacção deste semanário teve acesso a um comunicado do Instituto de Serviços de Veterinária do Ministério da Agricultura, no qual o referido órgão tomava medidas como a retirada do mercado dos lotes referenciados e sua destruição, recomendação de atenção para identificação e anulação destes produtos por parte dos consumidores, bem como o apelo de intensificação de políticas de policiamento e controlo sanitário em todos os portos, aeroportos, postos fronteiriços e estabelecimentos comerciais da parte das estruturas do Estado vocacionadas para o efeito.