Luanda – Levantou grande polémica não só em Kinshasa mas principalmente nas hostes europeias ocidentais e nos EUA, alegações segundo as quais, Joseph Kabila Kabange, Presidente da RDC – República Democrática do Congo, estaria a almejar uma mexida na Constituição com o objectivo final de ver satisfeito sua alegada apetência de concorrer para um terceiro mandato, apesar de a Constituição, aprovada com a maioria parlamentar no seu primeiro mandato presidencial através do PPRD-Parti du Peuple pour la Reconstruction et la Démocratie, limitar para dois, os Mandatos presidenciais.

Fonte: Club-k.net
A acontecer, Kabila, que ascendeu ao poder em Janeiro de 2001 sucedendo a Laurent Désiré Kabila, seu pai, que aos 16 de Janeiro de 2001 não ressistiu aos dispáros de um de seus guarda-costas, alegadamente persuadido a fazê-lo por ordem do Coronel Eddy Kapend, seu primo, estaria a enveredar pelo caminho já trilhado por estadistas- precursores deste movimento ou tendência como já foram os casos dados na Argélia, Camarões, Tchade, Djibuti, Uganda, Zimbabwe e muito recentemente no Burkina Faso.

Evidentemente as reacções de Paris, Bruxelas (enquanto capital europeia) e Washington não se fizeram esperar, exigindo ao regime de Kinshasa a obedecer o estipulado na constituíção.

Como se não bastassem as alegadas suspeitas, Lambert Mende, o Ministro da Informação, viria á terreiro, talvez sem assim o pretender, reconfirmar e dissipar todas as dúvidas quanto ao polémico assunto afirmando: "Ninguém ouviu o Presidente Kabila a dizer que vai mudar a Constituição, mas estamos a realizar este debate”.

Como se para tal seria necessário um statement verbal oficial do Presidente, “preto no branco”, o regime de Kinshasa admitiu sim, existir a ânsia de Kabila e aliados, em criar condições constitucionais para continuar na poltrona presidencial, onde 13 anos antes, já se sentara seu progenitor.

O bem sucedido argumento de “Não ingerências nos assuntos internos e o respeito a soberania nacional”, foram mais uma vez, os escudos usados pelo próprio Presidente Kabila para “intimidar” Paris e Washington, que acompanham com especial atenção os desenvolvimentos e contornos político-militares no ex-Zaíre de Motutu Sesse Sekou.

É evidente que, á luz dos exemplos atrás mencionados agravados com o mais recente caso do Burkina Faso, onde o Presidente Blaise Compaoré numa “empreitada” semelhante, terminou seu longânime consulado de 27 anos expulso do palácio presidencial Ougadogou, estou em crer que Kabila, terá feito uma fria e profunda leitura das consequências de uma iniciativa do género.

Por conseguinte não nos devemos esquecer que Àfrica viveu nesta mesma trajectória, dois exemplos “bem sucedidos” nomeadamente dos longevos Presidentes Teodoro Obiang (Guiné-Equatorial)há 38 anos no poder assim como o de José Eduardo dos Santos, com 35 ininterruptos anos de consulado.

Se o caso Campaoré, por ser o mais recente dá efectivamente que meditar, já os dois últimos casos encorajam-no nessa sua ambição, pois tanto os regimes de Malabo como o de Luanda, permaneceram inabaláveis a um eventual levantamento massivo.

Aliás, Kabila jamais daria tamanho passo sem no entanto, ter de solicitar a anuência de seu principal protector na sub-região que é militarmente potência não só na região mas no continente, país com o qual qual partilha uma extensa fronteira. Portanto, qualquer avanço na concretização desta ambígua paranóia resultaria em suicídio político, caso Luanda e José Eduardo dos Santos, não fosse envolvido diplomática, política e militarmente.

De Golpes de estado a “subversão” da Constituição

Embora se registe ligeira alteração no modus operandis para se atingir e permanecer no poder pela força, diga-se que os resultados e consequências de suas acções continuam imutáveis. Se nas décadas de 80 e 90 muitos líderes africanos alcançaram o poder por via de golpes de Estado, este paradígma altera-se ligeiramente no século XX, com a descorberta por parte de os detentores do poder para não se verem afastados do mesmo, pautaram por uma via aparentemente pacífica de fazê-lo (reformas ou subversões constitucionais) mas que no fundo, o perpectuam ou alargam sua longevidade no poder.

Entretanto, a arte de desvirtuar ou embelezar constituições ou mesmo processos jurídicos formais para se pertuar no poder, são naturalmente actos que a seu tempo, darão seus frutos negativos, visto tratar-se de actos ou processos aparentemente normais e legais mas na realidade anti-democráticos.
 
Só assim é que se explica a mutação no comportamento das populações no geral ante tais tendências, elas passaram a reagir manifestando sua fúria e intolerância, como foi muito recentemente no Burkina Faso.  

Tais mutações demonstram não só uma simples mudança de consciência para com as acções dos actores políticos mas sobretudo elas enviam um claro sinal de advertência e aviso de que, por um lado os tempos mudaram, e por outro lado, as chamadas Primaveras àrabes são ainda exemplos vivos

Roosevelt: um caso de inspiração para os africanos?

Aquando das discussões que culminaram com a aprovação da nova Lei Constituciuonal de Angola, conhecida como “Constituição atípica ou híbrida” por incorporar nela elementos mistos de sistemas de governo e consequentemente eleição, visto o Presidente ser Chefe de Estado e do Governo, mesmo não sendo directamente eleito pelo povo, como a norma conve3ncional assim o exige, mas sim “rebocado” como cabeça de numa lista partidária para as eleições Legislativas mas com o objectivo á Presidência da República.  

Na altura ventilou-se e muito bem, diria eu, a contagem dos mandados sucessivos desde 1979 até á altura da revisão da Constituição (2010) o que totalizaria seis mandatos de cada cinco anos. Enquanto a oposição e alguns juristas e constitucionalistas justificavam a não contagem dos mesmos devido a guerra que imperava em todo país, outros argumentavam o contrário, isto é, alegavam que durante tais mandatos o Presidente José Eduardo dos Santos, os havia assumido integral e plenamente de maneiras que, no âmbito da Lei, deveriam ser levados sim em consideração.

Na senda das discussões em torno da polémica, rebuscou-se igualmente a história da potência mundial EUA e pessoas há que fizeram do caso Franklin Delano Rossevelt, seu “cavalo de batalha” por alegadamente ter subvertido a Constituição norte-americana aproveitando-se da 2a. Guerra Mundial.

Lembrar que Roosevelt, o 32o Presidente dos EUA (1933 á 1944) concorrera para a sua própria sucessão por três vezes consecutivas (1936; 1940 e 1944), desafiando a tradição, (ainda não existia a Lei de limitação de mandatos apenas imperava este principio tradicional respeitado por todos seus antecessores na Casa Branca).

Refugiando-se nos pretextos do eclodir da Segunda Guerra Mundial, pois era apologista de que sua reeleição tornaria a nação mais coesa e forte para enfrentar a influência Nazista de Adolf Hitler que acabava de tomar o poder em Berlim em 1933 por via uma polémica e controvérsia Cláusula constitucional, ameaçava conquistar e dominar o mundo. Terão tido ou não razão os defensores e promotores da Constituição Atípica Angolana? É tema para uma outra consideração pontual.

Voltando ao caso Kabila, há 13 anos no poder e cujo último mandato (constitucional) terminaria em finais de 2016, ele tem como se diz na gíria, a “faca e o queijo” para decidir em:

- Ter uma saída airosa em 2016 e um dia e como jovem que é(43 anos de idade), utilizar seu conhecimento e experiência á serviço de seu país e porque não da ONU, UA, etc;

- Alterar a Lei Constitucional e lançar o país e o destino de mais de 60 milhões de habitantes ao abismo;

No campo externo, cujas fronteiras com ênfase a parte Leste com o Ruanda, ainda exige cuidados acrescidos apesar de relativa calmia reinante, á luz do preponderante papel de Angola, agora nas véstes da Presidência rotativa da Conferência Internacional para a Região dos Grandes Lagos (CIRGL), as consequências são previsíveis.

*Politólogo