Luanda - Segundo informações do Comando da Unidade de Trânsito de Luanda (CUTL), a detenção de automobilistas por tentativa de suborno com valores monetários aos agentes desta área da corporação é resultado de uma medida que teve início no dia 01 de Dezembro do ano passado.

Fonte: O País
Por este facto, o CUTL vai prosseguir no sentido de inverter a imagem e o comportamento dos efectivos, no que concerne a actos relativos a famosa ‘gasosa’, ou seja, prática de corrupção imposta muitas vezes aos automobilistas.

Desde que a posição foi tomada pelo Comando da Unidade de Trânsito de Luanda, já foi possível a detenção e o julgamento de mais de cento e vinte automobilistas na sua maioria taxistas.

Na esteira desta nova medida, os acusados por tentativa de suborno aos agentes reguladores de trânsito, serão condenados à pena de trinta e quarenta dias de prisão convertidos em multa que vai de setenta a cento e dez mil kwanzas, sendo que, os que tiverem dificuldade em pagar serão conduzidos à cadeia.

O que dizem os taxistas

Durante a reportagem conversamos com vários taxistas para ouvir a sua versão acerca do assunto em questão. João Caetano faz táxi há mais de um ano, e foi o nosso primeiro entrevistado. Durante a conversa contou que, geralmente, o que faz com que um agente regulador de trânsito seja subornado, não porque este ganhe pouco ou tenha um mal salário, mas sim a ambição em querer ter muito dinheiro para além do salário normal que recebe no fim de cada mês.

“O que obriga um agente regulador de trânsito a aceitar o dinheiro que lhe é dado pelos taxistas como forma de suborno, não é porque ganha mal, a polícia de trânsito ganha bem, e faz isso por ambição. As vezes dizem que o dinheiro nunca é de mais. Por exemplo, se um agente me interpelar agora mesmo, e se eu lhe corromper dando-lhe alguns valores, ele vai receber imediatamente”, afirmou.

João Caetano reconhece que existem alguns taxistas a trabalhar sem a documentação regularizada, mas alega que a polícia de trânsito tem conhecimento disso, porém, não trata do assunto tal como deveria ser tratado seguindo os preceitos que a lei exige. Na sua maioria prefere resolver a situação no local de serviço e por consequência disto, acaba por ser corrompida.

“A própria polícia de trânsito é quem facilita a corrupção, porque quando nota que o condutor está sem a documentação regularizada, dificilmente passam uma notificação ou o encaminham a unidade. A culpa não é do taxista, que já está acostumado a subornar os agentes de trânsito e são os próprios agentes que fomentam esse suborno quando aceitam o dinheiro ou a ‘gasosa’ como é vulgarmente chamada”, disse.

Segundo João Caetano, quanto mais os agentes de trânsito aceitarem o dinheiro do suborno, mais estarão a contribuir para o aumento da corrupção nas estradas e consequentemente para a má condução. Ainda durante a conversa, o interlocutor prosseguiu dizendo que ao longo dos tempos que vem exercendo a actividade de taxista, já foi interpelado várias vezes pelos agentes reguladores de trânsito, e já se sentiu obrigado a suborná-los com um valor que varia entre mil e dois mil kwanzas e, os mesmos nunca recusaram o dinheiro.

“Se no momento em que a polícia de trânsito é colocada na estrada para trabalhar tivesse a moral de não aceitar o dinheiro do suborno que o taxista lhe oferece, a corrupção nas estradas não teria chegado ao ponto em que está nos dias de hoje. A polícia deveria fazer o seu trabalho aplicando os princípios que aprendeu na academia de formação e não trabalhar a base da corrupção”, finalizou.

Prosseguindo, conversamos também com o Paulo Figueira que trabalha como taxista há cinco anos, e contou que o acto de os agentes reguladores de trânsito receberem dinheiro dos taxistas enquanto trabalham, não é recente, afirmando que os mesmos já vêm a fazer isto há bastante tempo.

“O vício que a polícia de trânsito tem em receber dinheiro dos taxistas, não é de hoje, é antigo, muitos deles agora só ingressam para essa profissão com o objectivo de ganhar dinheiro nas ruas. Mesmo que o condutor tenha todos os documentos exigidos para a condução regularizados, eles arranjam sempre um motivo para ganhar algum dinheiro extra”, salientou.

Paulo Figueira disse ainda que durante os cinco anos em que trabalha como taxista já sofreu várias injustiças por parte dos agentes reguladores de trânsito, e em quase todos os casos teve que pagar a ‘gasosa’ para ver resolvido o seu problema.

“Ainda ontem fui interpelado por um agente enquanto tentava fugir um buraco que estava no meio da estrada, ele disse-me que eu estava mal parado e começou a me complicar até que tirei dois mil kwanzas que embrulhei num guardanapo de papel e lhe entreguei, só assim é que me deixou prosseguir a viagem”, contou.

A falta de comunicação entre a polícia e os condutores de táxi segundo o entrevistado, também tem sido outro problema, alegando que são poucos os agentes reguladores de trânsito humildes e com um sentimento humanitário que conversam com o condutor para explicar ao mesmo a infracção que este cometera e sensibilizá-lo a adoptar uma condução mais responsável e não voltar a cometer infracções.

Por sua vez, Zito de 29 anos, é taxista há mais de três anos e contou que já gastou muito dinheiro com a polícia de trânsito, pois, tem sido sempre interpelado pelos agentes reguladores de trânsito, e nos casos em que andou com o carro sem o selo da taxa de circulação, chegou a pagar mais de dez mil kwanzas.

“Quando o problema é a falta do selo da taxa de circulação ou seguro automóvel, a situação piora, porque muitos deles em vez de prenderem a viatura e encaminhar para a esquadra, preferem fazer com que o cidadão se sinta obrigado a pagar dinheiro a eles. A primeira vez que fui interpelado por falta de selo da taxa de circulação paguei nove mil kwanzas, já na segunda vez paguei onze mil e há quem paga mais do que isso, depende do agente que o interpela”, disse.

Zito finalizou dizendo que, existem agentes de trânsito que quando mandam parar um taxista, e as vezes por um motivo banal, ao receber os documentos e verificar que o mesmo não colocou dinheiro no meio dos documentos não o devolvem os documentos sem que lhe pague antes algum valor. E nestes casos o taxista faz a opção, perder o tempo andando atrás do agente, ou pagar a ‘gasosa’; a maioria opta por pagar.

Nova táctica

Ainda no decorrer da nossa reportagem, conversamos com três taxistas que por questões de segurança, não queriam ser identificados, que contaram que, há uma nova estratégia que a polícia de trânsito adoptou há algum tempo atrás.

“Desde que a polícia adoptou esse novo método de trabalhar em combina com alguns miúdos que recebem o dinheiro sempre que estes são subornados, muitos deles já não aceitam receber o dinheiro das mãos dos taxistas, eles mandam o condutor entregar os valores monetários ao miúdo, que em alguns casos são vendedores ambulantes, cuja maioria são os que vendem bebidas a beira das estradas e estes recebem o dinheiro para depois entregarem aos agentes reguladores de trânsito e recebem alguma coisa em troca”, contaram os entrevistados.

Os mesmos alegam que esta prática é frequente nas artérias da cidade onde o controlo é maior, e serve para que os agentes de trânsito não sejam vistos a receber dinheiro da mão dos taxistas ou simplesmente para não chamar a atenção.

Falta de colaboração

Os taxistas entrevistados ao longo da reportagem explicaram que o grande aspecto que tem incentivado o suborno no seio dos agentes reguladores de trânsito, é a falta de uma colaboração salutar entre os taxistas e o Comando da Unidade de Trânsito de Luanda, que deveria receber as queixas contra os agentes que desrespeitam a lei e penalizá-los exemplarmente.

Os mesmos alegam que há vezes que os taxistas se sentem lesados pelos agentes reguladores de trânsito e estes não têm onde se queixar. Pois, muitos dos que vão fazer a queixa, não são bem-sucedidos e os agentes que cometem tais injustiças, por terem um ‘padrinho na cozinha’, simplesmente não são punidos.

Quanto a nova medida tomada pelo Comando da Unidade de Trânsito em punir os condutores que tentam subornar os agentes reguladores de trânsito em serviço, os entrevistados defendem que a mesma só irá surtir efeitos positivos quando se procurar trabalhar com os dois lados, isto é, os taxistas e a própria polícia de trânsito. Punir os agentes que infringem as regras de trabalho, e os condutores devem respeitar o código de estrada, evitando a condução irresponsável, só assim haverá paz nas estradas.

A voz da Polícia
 
O Comandante da Unidade de Trânsito de Luanda, Roque da Silva contactado pela nossa equipa para dar esclarecimentos sobre o assunto, disse que um dos grandes mentores da prática de suborno nas estradas são os próprios condutores pelo facto de encontrarem-se em situações que não condizem com a lei, e para não serem multados tentam subornar a polícia de trânsito.

No que diz respeito a formação dada à polícia de trânsito, o Comandante contou que existe a Escola Nacional de Polícia da Ordem Pública, onde todos os efectivos fazem o curso básico e posteriormente a especialização, sublinhou ainda, que o processo de formação não termina quando o individuo sai da escola pois, internamente há uma etapa de formação contínua que consiste em aprimorar determinados aspectos para melhorar a actuação na via pública.

“A polícia de trânsito é treinada para manter sobretudo a segurança rodoviária, e ela engloba muitas áreas, como a fluidez de trânsito, a sinistralidade rodoviária e tantos outros aspectos que requerem a nossa intervenção”, realçou.

O responsável salientou que dos cerca de mil e quinhentos agentes que compõem a corporação, nem todos têm um comportamento exemplar. Existem alguns agentes que insistem em desrespeitar a lei e os bons princípios se envolvendo em práticas de extorsão.

“Existem na corporação aqueles indivíduos que, por mais que sejam submetidos a determinados recursos e chamadas de atenção, ainda assim tentam denegrir a imagem da polícia, esses naturalmente recebem um castigo. Para quem estiver a extorquir um cidadão a punição consiste na demissão compulsiva da corporação, porque se trata de um acto muito grave que vai manchar a imagem da polícia e não há outra solução senão a demissão”, garantiu.

O interlocutor contou que está a ser feito um inquérito para se apurar as reais causas que fazem com que um agente da polícia de trânsito deixe ser corrompido, o mesmo alega que não se tratar duma questão salarial, pois acredita que actualmente os salários dos agentes reguladores de trânsito, já estão adequados ao modo de vida de cada um, e neste caso argumenta que se trata de um problema de falta de caracter pessoal.

O comandante assegurou que da mesma forma que estão a punir os condutores que tentam corromper a polícia de trânsito, também estão a ser punidos os próprios agentes que se deixam subornar, e apelou aos cidadãos para denunciar os mesmos indivíduos que aceitam a ‘gasosa’.

E para finalizar, o responsável afirmou que actualmente existe a nível da corporação, um NIP que é o número de identificação policial, e quando o cidadão se sentir lesado por um agente da polícia, deve dirigir-se aos locais indicados para se fazer a queixa.

“Os cidadãos lesados podem efectuar uma queixa em qualquer um dos locais autorizados. E para o efeito, existe um gabinete de inspecção na própria Unidade de Trânsito que está aberto a qualquer hora para se fazer a denúncia; tem ainda o oficial superior da assistência que representa o Comandante na sua ausência; o Comando Provincial de Luanda tem também um guiché de reclamações e os contactos telefónicos, um deles é o 923439550 ou simplesmente o 113. Está a ser criado um número fixo para as denúncias que iremos anunciar em breve”, concluiu.