Lisboa - A proposta de fusão da sociedade de Isabel dos Santos, entre o BPI (onde a Santoro tem 18,6%) e o BCP onde a Sonangol, petrolífera angolana, tem 19,44%, é a alternativa impossível que a empresária angolana propõe à OPA do espanhol La Caixa. Aliás, não é por acaso que o primeiro ponto da carta que a Santoro escreve aos CEO do Caixa Bank, BPI e BCP, é a reafirmação que é entendimento da Santoro que a oferta do Caixa Bank não reflecte correctamente o valor do BPI, nem por si só, nem o seu potencial de crescimento, nem o adequado valor das anunciadas sinergias. Por isso desde já a OPA do La Caixa não poderia contar com o voto favorável da Santoro. Nem no Conselho de Administração realizado, nem na Assembleia Geral que teria de ser convocada para votar a desblindagem de estatutos (condição de sucesso da OPA).

 

Fonte: Club-k.net

Por isso esta OPA a este preço, de 1,329 euros, tinha de ser chumbada.

 

Não tem condição de ter sucesso. O que resta ao La Caixa? Subir o preço, mas depois de negociações à priori com a Santoro.

 

Mas Isabel dos Santos vai mais longe. Propõe uma fusão BCP/BPI. Porquê?

 

Todos sabemos que o BPI está num beco com estreitas saídas. Porque tem de vender dívida pública angolana, e ao mesmo tempo esta é uma fonte de receita essencial, ou tem de vender acções do BFA e descer abaixo do domínio e deixar de consolidar integralmente o banco comercial angolano nas suas contas e isso é um forte revés nos resultados, porque a actividade doméstica não é muito promissora para o banco liderado por Fernando Ulrich.

 

Ora para resolver este assunto o BPI precisava de comprar o Novo Banco (ainda assim talvez não chegasse para diluir o risco de Angola no balanço, mas já se verá). Para comprar o Novo Banco o BPI tem de aumentar o capital. O Novo Banco deve ir à praça lá para Junho.

 

Ora os maiores accionistas do BPI são os grandes investidores numa operação de aumento de capital para comprar o Novo Banco.

 

Preferia a Santoro acompanhar o BPI num aumento de capital onde teria de entrar com 18,6% do investimento? Não parece provável que esse cenário agradasse a Isabel dos Santos. Seria uma vez mais investir muito para mandar pouco. Angola, como se sabe, vai ter um ano difícil.

 

O BCE, depois do que aconteceu ao BES Angola, passou a considerar o Banco Nacional de Angola como contraparte não-equiparável a bancos europeus.  Os activos angolanos passaram, a partir de 1 de Janeiro de 2015, para uma ponderação de risco de 100%. Isto significa, em primeiro lugar, uma pesada contracção do financiamento da banca internacional a Angola por força de um significativo aumento dos “spread”. A isto associa-se a queda do preço do petróleo. Os EUA passaram a produzir petróleo e o rácio oferta/procura puxou os preços para baixo. Abaixo dos 65 dólares por barril a Sonangol perde dinheiro, dizem os entendidos, baseando-se para isso nos custos de exploração do petróleo.

 

A redução da procura chinesa e o fim do quantitative easing nos EUA (que levou à subida das taxas de juro e por isso os investidores trocaram commodities por activos financeiros com juros) também vem ajudar à queda dos preços do petróleo, o que se revelará uma tragédia para a economia angolana.

 

O petróleo  representa 95% das exportações e 75% da receita fiscal de Angola. A dificuldade de investir fora de Portugal (implica a saída de dinheiro do país) é notória neste quadro macro-económico. Por isso Isabel dos Santos não tem grande interesse em ser um accionista minoritário de um banco português, se isso implicar ter de investir mais uns milhões. Por isso o La Caixa é o único que apareceu a suportar o financiamento da compra do Novo Banco. Mas para isso tem de votar com tudo o que investir. Se vai ter a maioria das acções quer a maioria dos votos. O fim da blindagem de votos a 20% no BPI é o grande busílis da questão. Mas para isso precisam do agreement de Isabel dos Santos.

 

Mas a filha do presidente de Angola não está contente com esta solução.

 

Ou o La Caixa lhe oferece um preço que compense sair do BPI (e na carta a Santoro diz que a sua participação no BPI não é meramente financeira, mas sim estratégica), ou então domina ela uma operação de fusão. Mas como tem pouco dinheiro para investir fora de Angola, teve uma epifania.

 

Porque não negociar com a petrolífera do seu país, que é dona de quase 20% do BCP e conjurarem uma fusão. Bastava que os accionistas de ambos os bancos (La Caixa incluído) aprovassem a fusão em Conselho de Administração, depois levariam os termos da fusão à AG de accionistas. Em cada banco a fusão teria de ser aprovada por 75% dos votos emitidos em AG.

 

Por fim criariam a sociedade da joint-venture, para onde os accionistas envolvidos na fusão passariam as suas participações - faziam a chamada fusão jurídica, precisando para tal de apenas ir ao notário - depois, a sociedade da joint-venture lançaria uma Oferta Pública de Troca aos accionistas, com termos de troca e, com sorte, com alternativa em dinheiro.

 

A Sonangol (com a Interatlântico) e a Santoro (ou esta última se comprasse a participação à Sonangol) controlariam o novo banco nascido da fusão e logo a seguir, como segundo maior accionista, viria o La Caixa. Depois têm de escolher entre Nuno Amado e Fernando Ulrich para banqueiro o que não será tarefa fácil. Este cenário da fusão é o que mais convém a Isabel dos Santos e com ela tudo estaria bem. Não investiam muito (trocam acções basicamente) e ganhavam um colosso financeiro no país irmão. O La Caixa quer isto assim? Não. Se a fusão passasse o la Caixa vendia e saía de Portugal, quase de certeza.

 

Uma coisa é certa, a compra do Novo Banco pelo BPI corre o risco de ficar comprometida para sempre.

 

A complexidade de soluções que se apresentam ao BPI, e com o tempo que isso demorará a resolver-se, não deixa grande margem para chegar a tempo da venda do ex-BES.

 

No cenário de o La Caixa vender, os angolanos teriam de arranjar dinheiro para comprar ao banco catalão a sua posição accionista. Isso também não é lá muito conveniente para os angolanos.

 

Em termos legais:

A fusão impossível

O BCP não pode participar em fusões porque está sob o jugo da Direcção da Concorrência Europeia, por causa de ter pedido ajuda ao Estado que ainda não está totalmente paga. Faltam 750 milhões. O BCP não os tem para pagar de antecipação.

 

Aliás o banco do Nuno Amado, ao contrário do que sugerem os sites de notícias, não está muito entusiasmado com a proposta. Até porque acaba de passar por um período de dois anos de cortes de pessoal, para chegar aos 7.500 trabalhadores que tem hoje, e a fusão com o BPI voltaria a engordar os custos com pessoal cima do que ganharia em "income". O cost-to-income (rácio de eficiência) degradar-se ia de forma substancial.

 

Os balcões duplicariam quase, e há substancial overlap de balcões entre os dois bancos.

 

No comunicado, obrigado pelo sócio africano após pressões de Luanda, o banco de Nuno Amado disse que «havendo interesse do Banco BPI, a Comissão Executiva do BCP manifesta a sua disponibilidade para analisar a referida operação, com respeito pelo circunstancialismo regulamentar aplicável». Refere-se aqui às necessárias autorizações do Governo português, da DGCom, dos reguladores nacionais e internacionais, da Concorrência nos vários mercados. Depois levaria certamente à venda de activos como remédios da Concorrência. O Governo português tem de pesar bem os prós e contras, e os despedimentos que daí surgiriam não são de descurar. Este será sempre um processo moroso, caso esta fusão entusiasme os accionistas dos dois bancos.

 

Mas o banco de Nuno Amado apressou-se a acrescentar: «mais se informa que o acima referido não pode ser entendido como garantia de que a operação venha a efectuar-se ou como significando que tenha sido tomada qualquer decisão relativamente à mesma». Ou seja, não se entusiasmem muito com isto.

 

BPI sob gestão

Depois o BPI, enquanto instituição que está sob pendência de uma OPA, não pode tomar decisões quanto à fusão porque tem os seus poderes limitados à gestão corrente. Por isso a administração do BPI não pode votar esta fusão enquanto a OPA estiver a correr.

 

O La Caixa já fez o pedido de registo pelo que a OPA não pode ser retirada, a não ser que as condições de lançamento ou de sucesso não se verifiquem. O que pode acontecer se o La Caixa chumbar a OPA a este preço, assumindo que sem a Santoro não haverá condições para fazer passar a desblindagem dos votos.

Resumindo:

A fusão BCP/BPI poderá não passar de uma miragem. A não ser que o La Caixa dê o seu aval, mas só o daria se pudesse sair do capital vendendo os seus 44% no BPI, ou posteriormente vendendo a sua participação na joint-venture.

 

A OPA só avança com um entendimento (dinheiro) com a Santoro. No limite a sociedade de Isabel dos Santos pode mesmo usar esse dinheiro para investir noutro banco.

 

Para ambos os cenários serem realistas dois accionistas, pelo menos, têm de se entender: La Caixa e Santoro. Mas não chega. Nem assim chega.

 

O Novo Banco corre cada vez mais o risco de ir parar à Fosun ou ao Bank of China, ou o Santander.