Luanda - A restrição ao exercício dos direitos fundamentais "tem estado a aumentar" em Angola, avaliou a presidente da Associação Justiça, Paz e Democracia, organização angolana que acaba de publicar um relatório sobre o assunto.

Fonte: Lusa

Em declarações à Lusa, a partir de Luanda, a ativista Maria Lúcia da Silveira descreveu uma "degradação da situação dos defensores de direitos humanos no geral", num contexto de violação das liberdades de imprensa e de expressão e dos direitos económicos, sociais e culturais, nomeadamente o da habitação, com demolições e despejamentos forçados.

O relatório "Angola: Querem manter-nos vulneráveis. Defensores dos direitos humanos sob pressão", da autoria da Associação Justiça, Paz e Democracia (AJPD), em conjunto com o Observatório para a Proteção dos Defensores dos Direitos Humanos da Federação Internacional de Direitos Humanos, resulta de dois anos de trabalho.

Maria Lúcia da Silveira destacou a "incongruência" entre a Angola que, nos palcos internacionais, aceita recomendações sobre direitos humanos, no âmbito da Revisão Periódica Universal, em curso no Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, em Genebra, na Suíça, e a Angola que, dentro do território nacional, não as cumpre.

"Infelizmente, o Governo não tem cumprido com essas recomendações, não tem sido capaz de responsabilizar os perpetradores de violação de direitos humanos, não tem conseguido responsabilizar a violência policial, não tem conseguido responsabilizar as execuções sumárias que têm estado a acontecer", denunciou.

A par das violações de direitos fundamentais, "existe uma vulnerabilidade muto grande dos defensores" de direitos humanos em Angola, alertou a ativista, contestando o projeto de regulamento, datado de fevereiro, que pretende regulamentar a atividade das organizações não-governamentais (ONG), "limitando muito o seu raio de ação".

O projeto de regulamento, proposto pelo Ministério da Assistência e Reinserção Social e pelo Serviço de Inteligência Externa e que está para aprovação do Presidente da República, "contém várias provisões que, se aplicadas, irão comprometer seriamente o trabalho das organizações de direitos humanos independentes de Angola".

O regulamento exige, por exemplo, que as ONG "forneçam o seu certificado de registo" para poderem exercer as suas atividades, "sob pena de suspensão ou encerramento", denunciou o relatório.

Ora, "até à data, a maioria das organizações de direitos humanos independentes, nomeadamente a AJPD, não receberam ainda o dito certificado por parte do Ministério da Justiça".

As autoridades angolanas pretendem, "sob o pretexto de prevenir o terrorismo", controlar as atividades, contas e gestão interna das ONG, com um projeto que "viola os compromissos e as obrigações de Angola pelo respeito da liberdade de associação", denunciaram os autores do relatório.

"Estão a ser criminalizados defensores de direitos humanos e jornalistas por falarem nos problemas de direitos humanos que Angola tem neste momento", criticou Lúcia da Silveira, referindo o caso de Rafael Marques, que vai a tribunal na terça-feira, processado por generais angolanos por difamação, depois de publicar um livro a denunciar as torturas e violências cometidas nas regiões diamantíferas do país africano.

"Os defensores dos direitos humanos têm estado a ser atacados e acusados, em tribunal, de difamação", frisou, criticando a atuação da justiça. "Há casos que deviam ter uma resposta mais célere, e infelizmente não têm, e há casos que nós entendemos que deviam ser tratados de forma cível e não a nível de crime", explicou.