Luanda - José Luís Barceló Mezquita é professor no Instituto Europeu de Madrid (Estudos Políticos) mas veio a Angola fazer reportagens a convite da UNITA. O seu trabalho causou polémica entre os seus colegas e alunos. Mas também provocou “grande incómodo” junto da Associação de Imprensa de Madrid, da qual é membro, por se ter limitado a revelar uma posição partidária em vez de aproveitar a oportunidade e fazer um trabalho isento. O que mais chocou os seus críticos foi não ter dado a versão do Governo Angolano, de outros partidos da Oposição ou de figuras independentes.

Fonte: Jornal de Angola

Jornalista disfarçado a convite da UNITA

O repórter espanhol disfarçado de professor universitário só agradou ao “embaixador” da UNITA em Madrid, Virgílio Canjimbi Samakuva, poderoso homem dos negócios do Galo Negro na Europa, juntamente com sua irmã, Florence Samakuva,“embaixadora” em Paris. O clã Samakuva está estrategicamente distribuído pelas principais capitais europeias, gerindo os recursos da UNITA provenientes dos tráficos da Jamba, sobretudo de diamantes, droga e marfim.

Altas figuras dos partidos do “arco da governação” em Portugal dão cobertura política e empresarial aos negócios. Para disfarçar as actividades comerciais e financeiras, a UNITA lança na Europa “operações mediáticas” com os seus jornalistas avençados desde os tempos da guerra do apartheid contra Angola, quando Lisboa era o centro nevrálgico da propaganda savimbista.

A deslocação de José Luís Barceló Mezquita a Luanda está envolvida em mentiras do próprio mas também do Presidente da UNITA, Isaías Samakuva. O líder do Galo Negro pediu pessoalmente o visto ao Cônsul-Geral de Angola em Madrid apresentando o jornalista como prelector num “seminário de capacitação de quadros” que decorreu entre 25 de Fevereiro e 15 de Março. Esta informação foi dada ao Jornal de Angola por uma fonte do Secretariado de Comunicação e Marketing, organizadora da acção de formação.

“A direcção da UNITA não pode incorrer em erros destes, porque prejudicam o partido e os nossos amigos. O professor José Luís Barceló Mezquita veio a Luanda para dar formação. Não havia necessidade de andar por aí a fazer reportagens com o líder do partido. Essa confusão deixa toda a gente mal”, disse a nossa fonte.

Mas a verdade é que José Luís Barceló Mezquita veio a Angola como jornalista “disfarçado” de professor universitário. O texto que escreveu no jornal digital “El Mundo Financiero” deixa claro que saiu de Madrid na qualidade de “enviado especial” da publicação.

O conteúdo dos seus textos interessa pouco. O grave foi ter escondido às autoridades consulares que ia a Angola trabalhar como jornalista. Mais grave ainda: Isaías Samakuva mentiu às autoridades consulares do seu país. Todos os dias entram em Angola jornalistas estrangeiros e não precisam de mentir quanto à sua profissão nem esconder que estão em missão de serviço dos seus órgãos de informação. Vários correspondentes estrangeiros trabalham em Angola sem qualquer impedimento. Uma jornalista do “El Mundo Financiero” disse ao nosso jornal que este comportamento não é comum “nem aceitável” naquele órgão de informação nem “entre os jornalistas espanhóis que todos os dias trabalham no mundo inteiro”.

 

Motivo extraordinário

 

José Luís Barceló Mezquita disse a círculos próximos que ia a Angola participar num “seminário” mas escondeu que se tratava de uma acção partidária. E associou esta deslocação a “uma oportunidade extraordinária” para conhecer um grande país africano com o qual a Espanha tem excelentes relações. Escondeu que ia fazer um frete para a UNITA.

O embuste foi mantido até ao fim, o que diz bem do carácter do professor do Instituto Europeu de Madrid. Mas também revela uma confrangedora falta de seriedade de Isaías Samakuva, que sabia perfeitamente que Mezquita ia a Angola fazer trabalho jornalístico para a UNITA, pago, conforme foi tratado pelo seu irmão Virgílio Canjimbi, em Madrid.

Um jornalista profissional que aceita participar em tal operação perde totalmente a credibilidade. Para disfarçar o “negócio” feito com Virgílio Canjimbi, Mezquita escreve no “El Mundo Financiero” coisas como esta: “Angola é governada por um regime corrupto e repugnante”. Depois reforça: “Politicamente Angola é governada por um regime autocrático e ditatorial”. E faz comparações com a Coreia do Norte.

O falso professor (ou falso jornalista) nem teve o cuidado de visitar a embaixada de Espanha em Luanda para se informar sobre a situação política em Angola. Assim fez figura de um herói que entrou clandestinamente em Angola. Nem os manos Samakuva acreditam nisso. Muitos jornalistas e políticos estrangeiros têm visitado Angola, a convite da UNITA. Esta “operação” foi montada porque em Espanha os jornalistas e órgãos de comunicação social são sérios e honram o jornalismo. Não se limitam à propaganda seja de quem for. Para “entrar” no mercado espanhol, a UNITA teve que comprar um professor disfarçado de jornalista ou jornalista disfarçado de professor, que veio a Luanda sob o pretexto de dar formação aos quadros da UNITA.

A “acção formativa” decorreu sob o signo da polémica. No final, Isaías Samakuva fez um discurso belicista. Garantiu aos jovens que vai tocar o apito de guerra em breve, quando as condições estiverem criadas. Mezquita ouviu, registou, mas nada escreveu sobre o discurso de um político da Oposição que ameaça o regime democrático com toques de apito para a guerra.

 

As estradas invisíveis

 

José Luís Barceló Mezquita escreveu um artigo no “El Mundo Financiero” sem qualquer interesse. Limitou-se a papaguear o que ouviu de Isaías Samakuva. Mas foi mais “papista que o papa” quando afirmou que em Angola não existem estradas. E as que percorreu sobraram do tempo do colonialismo e estão intransitáveis.

Só quem não quer, vai a Roma e não vê o Papa. Mas o jornalista Mezquita foi com Isaías Samakuva de Luanda a Malanje, de carro, e não viu a estrada excelente, construída desde que acabou a guerra. Foi ao Huambo e ao Bailundo por terra e também não viu estrada nenhuma. Mas estão todas asfaltadas e são das melhores de África. Algumas são tão boas ou melhores do que as de Espanha.

Mezquita sabe que Luanda e Huambo são as principais cidades angolanas, esteve lá, mas não viu nada da excelente rede viária nacional que já está construída desde que começou a Reconstrução Nacional. O professor espanhol que foi dar lições aos quadros da UNITA no papel de jornalista não tem futuro no jornalismo, mas no partido do “Galo Negro” tem tudo para triunfar.

*Texto do jornalista português Artur Queiroz publicado no Jornal de Angola com o pseudonimo de Pereira Diniz