Luanda - Novos elementos foram introduzidos na nossa política doméstica, que podem alterar substancialmente o futuro do MPLA e determinar o curso das eleições em 2017. Mas, até à realização do VII Congresso desse partido, previsto para o próximo ano, muita água passará ainda debaixo dessa ponte.

Fonte: AGORA

O presidente do MPLA comunicou ontem aos seus camaradas e, logicamente, à Nação que, no próximo ano, aquando da realização do VII Congresso Ordinário, serão 'forçados' a "uma profunda reflexão" sobre a "selecção de candidatos aos cargos de direcção e a sua posterior eleição, incluindo ao cargo de presidente do partido e ao candidato à eleição a Presidente da República".


A questão, que tem sido tabu nas hostes dos camaradas, suscitou, a quente, os mais variados comentários favoráveis e desfavoráveis, porque, embora tudo pareça apontar para uma mudança na direcção dos camaradas, também se pode interpretar do discurso que ainda é demasiado cedo para se chegar efectivamente a essa conclusão. Até porque é o próprio a alertar aos seus confrades que "deveremos estudar com muita seriedade como será construída a transição". Na sua opinião, deixou claro e será com certeza adoptado como princípio, "é conveniente escolher o candidato a Presidente da República (...) antes da eleição do presidente do partido".


Com base apenas nessa curta abordagem pouco incisiva em meia dúzia de linhas de um discurso mais focalizado em questões de âmbito económico, não podemos afirmar categoricamente que o candidato a Presidente da República não será o próprio pela simples razão de que o próprio também não disse que não será candidato.


Postos aqui, é suposto que, consequentemente, tenha início um novo ciclo democrático no interior do MPLA, porque a tal "selecção de candidatos aos cargos de direcção e a sua posterior eleição" obrigam a que todo o processo tenha como ponto de partida as estruturas de base. E, neste domínio, também nada está clarificado. Será que as candidaturas, por exemplo, para o exercício dos cargos de primeiros secretários provinciais será aberta, ou melhor, livre? Colocamos aqui algumas reticências (e não seremos certamente os únicos), pois nos parece que se está a dar nova roupagem a um 'filme' de democratização no interior do MPLA que, noutra versão, a de 2006/7/8, já vimos e deu buuummm, interrompendo o que já estava a ser tido como o princípio de mudanças e de ensaio para a retirada de José Eduardo dos Santos, pelo menos da presidência do partido.


O que se viu foi, inclusive, o afastamento do então secretário-geral, João Lourenço, tido como seu eventual sucessor. E, na sequência da alteração desse 'jogo democrático', as eleições legislativas em 2008 garantiram uma vitória folgada de 82% ao MPLA que, com essa maioria qualificada, fez adoptar, em 2010, que estipula que o cabeça de lista do partido mais votado é automaticamente Presidente do Estado. E venceu.


É claro que os cenários deste novo filme são outros e a conjuntura é de maior aperto fruto do descontentamento generalizado. Contudo, os interesses em torno do poder permanecem iguais e há, certamente, até quem tivesse sentido um certo frio na barriga, ao ouvir que está lançada no ar uma certa perspectiva de renúncia do chefe, que pode deixar muita gente órfã. E esses órfãos têm sido um entrave na democratização do MPLA e consequentemente do País. Contudo, como dizem os tugas "até ao lavar dos cestos é vindima".


Mas não acreditamos que, no interior do MPLA, haja alguém que se pronuncie contra uma 'moção' de renovação de voto de confiança ao presidente. Até porque, ao fazê-lo, seria um indicador de que no partido já não há unanimidade na aceitação da liderança de JES. E a intenção pode ser exactamente essa: perceber quem pretende a cadeira presidencial. Daí que, muito francamente, não estamos a ver quem terá essa coragem. Mas, por favor, provem-nos que estamos enganados!