Luanda - Enquanto cidadão e político tenho voz e liberdade de expressar a minha opinião, em particular num momento particular como o que vivemos.

 Fonte: Club-k.net

O ponto de partida da minha reflexão em torno das detenções dos jovens é uma pergunta. Porque é que os jovens saem à rua para se manifestarem? Considero que só com uma resposta reflectida a esta pergunta podemos compreender as razões dos jovens, dos que saem à rua e de outros que ficam em casa, porém insatisfeitos e mesmo indignados.

 

Em Democracia Representativa a soberania reside no Povo. A voz do Povo é a voz de Deus. Esta é uma expressão secular, que carrega todo um significado que não devia ser ignorado pela classe política. O Povo tem legitimidade de nos conferir poder, do mesmo modo que pode nos retirar esse poder. É nisso que consiste o princípio da soberania popular consagrada por Jean Jacques Rousseau e por nós adoptada constitucionalmente.

 

Considero por isso que o que se coloca hoje é que os cidadãos entendem que os políticos não estão a agir, nem a gerir no seu interesse. É uma realidade transversal. Em Angola como noutras realidades. Os brasileiros têm saído à rua precisamente porque consideram que Dilma Rousseff os traiu e até já se fala num possível impeachment. Os burundeses achavam que o seu presidente já não merecia uma oportunidade, apesar deste ter contrariado os apelos que lhe foram lançados por alguns líderes políticos do seu próprio país e homólogos noutras partes do continente africano e no resto do mundo. É legítimo que os cidadãos tenham pressionado para que este não se recandidatasse.

 

 

Blaise Compaoré foi obrigado a abandonar o seu projecto de continuar no poder porque os cidadãos do seu pais já não o queriam lá. É uma atitude legítima. Não se pode governar quem não quer. Desse modo, mais do que considerar uma legítima reunião dos jovens como acto preparatórios para um golpe do Estado, o que não tem qualquer sustentação politica e tecnicamente, acho que não devemos ignorar alguns sinais de fraqueza da Democracia Representativa.

 

Não tenho, claro está, qualquer ilusão de que poderemos voltar à Democracia directa. Em face disso considero que o melhor remédio é consultar os cidadãos, ouvir quem nos concedeu o poder, para aferirmos da sua satisfação ou insatisfação. Isso é Democracia. Quando se faz o contrário, quando se ignoram explicações vitais como as garantias que o país ofereceu à China para o empréstimo, não se pode esperar outras posições dos governados.

Considero, pois, que os jovens no nosso pais não têm sido nem ouvidos tão pouco compreendidos. O Encontro Nacional da Juventude, realizado há algum tempo, não pode ser visto como o único barómetro para se aferir o sentimento desta franja essencial para o desenvolvimento do país. Têm ou não legitimidade de exigir que os recursos do pais sejam melhor geridos? Têm ou não legitimidade de exigir que as instituições funcionem a favor de todos? Têm ou não legitimidade de exigir que a Democracia seja materialmente sentida por todos ao invés de o ser formalmente apenas?

 

Podem ou não manifestar-se contra a gestão desse ou daquele político, seja ele governante ou deputado? Se for afirmativa a resposta a estas questões, considero ser trabalho dos políticos explicarem-se mais e melhor perante o povo, pois governar é também fazer pedagogia. Dizer ao povo o que se quer fazer e como.

 

Os políticos que governam, sobretudo, estão obrigados neste contexto a encontrar estratégias políticas capazes de responder as exigências dos cidadãos. Prender, por exemplo, para inibir que outros sigam o mesmo caminho pode não ser uma solução sábia. Porque não se atacam as razões da sua insatisfação.

 

Em democracia, o recomendável mesmo nestas circunstancias era o executivo solicitar um estudo de opinião e agir sobre o mesmo. Tentar contrariar com ações concretas, estruturantes e não apenas paliativas.

 

Considero que as estruturas que compõem o partido que governa o país deviam sentar-se, discutir os problemas e apresentar uma solução. É preciso não ignorar perpectuamente a vontade do Povo. Se os políticos ignoram quem lhes conferiu o poder, então não tem legitimidade para falar em nome deles. Porque o povo atribui aos políticos um mandato. Um mandato que embora sociológico e não jurídico, deve porém ser uma fotografia da realidade. Ou seja, deve ser um mandato que coincida com as expectativas dos cidadãos.

 

Os jovens que vão às ruas não pedem casa, não querem carros, não exigem dinheiro. Logo, devem ser considerados lúcidos e preocupados com a gestão do país. Não são essas mesmas razões que fizeram nascer os Movimentos de Libertação para lutar contra a colonização? Os que lutaram pela Independência não encontram nas razões dos jovens coincidência de reclamações e exigências? Ouçamos a voz do povo e devolvamos a Liberdade aos rapazes!