Luanda - Integra da carta do prisioneiro político Marcos Mavungo aos amigos e activistas sociais de Angola

Fonte: Club-k.net

MENSAGEM AOS AMIGOS
E
ACTIVISTAS SOCIAIS DE ANGOLA

Meus queridos amigos,

Na segunda feira, 14 de Setembro de 2015, o Juiz J S J declarou no Tribunal da Comarca de Cabinda (T.C.C) que me condenava à Pena de 6 (seis) anos de Prisão Maior, por crime de rebelião P.e.P pelo artº 21º da Lei 23/10 de 03 de Dezembro. O Juiz pronunciou o seu veredicto sem qualquer discussão dos quesitos entre a acusação e a defesa, conforme as necessárias formalidades.

O absurdo da sentença deixou a Sala de Audiências na depressão, dando a pensar que o Juiz brincava assim com a honra do Tribunal. Posso afirmar que, quando fui preso, já tinha sido proclamada a Lei Marcial – o que por outras palavras significa nenhuma lei – e instalou-se um Tribunal de excepção. Por isso, a sentença só pode ser proclamada sem base em provas e em flagrante violação da Justiça.

Portanto, o acusador já tinha decidido a condenação a sofrer seis anos de prisão: quiz apenas a aprovação do Juiz do TCC.
J S J apareceu assim como o representante dos Juízes que condenam inocentes e absolvem culpados, fazem chantagens e extorsões.
Ouviram-se murmúrios de discordância na Sala de Audiências. Muitos amigos e familiares choraram por mim.

O TCC tornou-se uma abominação, na medida em que podia ser prostituido, isto é, ir contra os factos da causa para condenar um homem de boa vontade, um inocente.

Mas, saí do Tribunal algemado e fui reconduzido à prisão com um sorriso. Sabia que eu estava condenado, mas tinha orgulho no meu crime. Eu estava condenado por defender os pobres e os oprimidos do meu povo. Eu estava condenado por delito de opinião e por procurar convencer a Comunidade que é um dever legal e moral não pactuar com o mal, tanto como colaborar com o bem. Eu estava condenado por desejar para o povo de Cabinda os direitos inalienáveis à vida, à Liberdade e à dignidade.

Curiosamente, o veredicto foi pronunciado no dia 14 de Setembro, festa de exaltação da Santa Cruz. Foi na Cruz que Jesus Cristo ofereceu ao Pai o seu sacrifício em expiação dos pecados de todos os homens. Por isso, alegro-me de sofrer “Pois vou completando na minha carne o que falta aos sofrimentos de Cristo, a favor do seu corpo” (Col 1, 24).

As informações difundidas sobre o meu estado de saúde logo após a sentença da condenação são falsas. Não estive no hospital sob intensos cuidados médicos nem me desfiz em lágrimas por causa da condenação. Continuo forte, como sempre fui, embora os tratamentos tidos em Abril e Maio últimos não me curaram de todo.

Estou mais determinado do que nunca a prosseguir a luta pela liberdade e pela justiça. Se todos os dias somos explorados, se todos os dias somos espezinhados, se todos os dias somos presos e condenados injustamente, nem por isso vou baixar os olhos diante da “peste” que elegeu domicílio em Angola.

Considero a minha detenção e condenação, bem como a prisão dos activistas sociais em diversas partes de Angola como o aspecto de um único acontecimento que revela a aurora jubilosa que vem pôr fim à longa noite do actual cativeiro.

A história ensina-nos que o sofrimento injusto é redentor.

Quero pedir-vos que prossigais na nobre luta pela liberdade, pela justiça e pela dignidade. Pelo que não há razão nenhuma para que os actuais activistas sociais sob detenção impeçam o prosseguimento da luta pelas mudanças em Angola. O nosso destino final é o Reino da Liberdade e da Justiça e não podemos parar enquanto não tivermos entrado nas portas da metrópole e ver raiar o sol da Justiça.

José Marcos Mavungo
Activista dos Direitos Humanos