Luanda - O julgamento do caso Jorge Valério continua a decorrer na sala de audiências da 3.a secção do Tribunal Provincial de Luanda cuja sessão de segunda‐feira, dia 26 de Outubro de 2015, foi marcada com apresentação um vídeo bastante comprometedor para a DNIC. Neste vídeo os réus apresentados como supostos criminosos estavam a ser ensinados por oficiais da DNIC sobre as respostas que teriam que dar, demonstrando não conhecerem o local do crime nem como o mesmo se teria passado.

 Fonte: Club-k.net

DNIC suspeita de ter apresentado falsos assassinos

Nesta sessão, foram respondidas todas as questões prévias colocadas pelo Ministério Público, Assistente de acusação e pela defesa dos réus. A sessão de julgamento, prevista para iniciar as 9h00 da manhã, apenas começou as 12 horas e logo de imediato foi suspensa para serem discutidas a porta fechada a apreciação de 2 vídeos, apresentados pela defesa de Jéssica Coelho e pela PGR. Tendo recomeçado cerca das 15h00, o Juiz que preside ao julgamento deu a palavra ao Ministério Público, representado pela procuradora Yemanjá Videira para leitura da acusação, seguindo‐se a assistente dos familiares do malogrado Dr.a Ana Paula Godinho, para também proceder a leitura da acusação particular, que pediu uma condenação de 24 anos e uma indemnização de 500 milhões de Kwanzas (a mais alta até hoje pedida num tribunal de Angola) e por último foi dada a palavra a defesa dos réus para apresentarem a sua contestação. De notar que apenas a defesa de Jéssica Coelho, assegurada pelo Dr. Benja Satula, apresentou contestação. Este foi um facto que estranhou toda a gente presente, pois os advogados dos restantes réus (5 réus), pertencentes ao escritório do Dr. Alcino Cristóvão, não quiseram apresentar a sua contestação, apesar de solicitados pelo Juiz Presidente, dando a entender que não estão interessados em fazer uma verdadeira defesa dos seus constituintes, como mandam os princípios e deontologia da Ordem dos Advogados de Angola.

 

Entretanto, o Club‐K soube de uma fonte junto do TPL que as discussões para a admissão das provas de parte a parte foram bastantes acesas, pois que a defesa de Jéssica Coelho terá apresentado um vídeo bastante comprometedor para a DNIC, onde os réus apresentados no tribunal como sendo os autores do crime e que teriam agido por ordens de Jéssica Coelho, estavam a ser ensinados por oficiais da DNIC sobre as respostas que teriam que dar, demonstrando não conhecerem o local do crime nem como o mesmo se teria passado. Benja Satula terá apresentado também uma factura original da Unitel de um telefone adquirido pelo falecido Jorge Valério que o terá ofertado a Jéssica Coelho, quando o Ministério Público na sua acusação dizia que seria outro o telefone em causa. Perante estas provas, a representante do Ministério Público e a assistente da acusação terão entrado em pânico, pretendendo a todo o custo que o tribunal se recusasse a aceitar estas provas da defesa. Porém, segundo o Juiz da causa, estas provas foram consideradas essenciais para a descoberta da verdade material, tendo‐as aceitado.

Na sua contestação, Benja Satula reafirmou que a sua cliente Jéssica Coelho é completamente inocente das acusações que lhe estão a ser imputadas e que estaria a ser vítima de uma trama armada contra si, para esconder os verdadeiros culpados do crime. Das questões levantadas pela defesa, Club‐K anotou 3 que nos pareceram muito pertinentes e para as quais a acusação não conseguiu apresentar nenhuma justificação aceitável, que transcrevemos:

Integra da contestação da defesa de Jéssica Coelho

1. É uma inverdade gritante, caluniosa e injuriosa, a afirmação de que ela Jéssica Coelho tenha solicitado um encontro com os demais coarguidos e que estes tivessem sido levados à sua presença na sua escola no dia 28 de Setembro de 2012, pelo coarguido Manuel Lima Bravo. A única vez que a Jéssica viu o coarguido Teodoro foi no acto da acareação no MP junto da DNIC, tendo ela aí ficado boquiaberta quando ouviu dele dizer que a conhecia, o que só agora compreende que assim tenha procedido na sequência da instrumentalização a que foi submetido com vista a justificar as incriminações contra ela. Entretanto, e não obstante o que acima se disse, nesse dia em concreto (28.09.2012), não era possível, humanamente e pelas leis da física universal, ter‐se dado o predito encontro, pois ela, ré Jéssica, depois de sair da escola, ao terminar o seu período normal de aulas, isto cerca das 12h, fartou‐se de telefonar para o coarguido Manuel Lima Bravo, por não o ter encontrado do lado de fora da escola a sua espera. Essas chamadas para o coarguido Manuel Lima Bravo foram feitas nomeadamente às 12h 19 minutos, 12h:24m e 13h:09m (vide extrato telefónico e tráfego do telemóvel da coarguida Jéssica Coelho no dia 28.09.2012 – fls. 243) e, não tendo o motorista aparecido para a recolher, ela, Jéssica, acabou por ter de sair do Colégio para sua casa com o seu tio que nessa altura por lá esteve com o propósito de deixar a sua filha, prima da Jéssica, estudante do turno da tarde do mesmo colégio. Estas provas técnicas, que são juridicamente irrefutáveis, foram juntas aos autos pelo próprio MP em Instrução preparatória, e indicam que entre as 12h e as 14h deste dia (28.09.2012) o tráfego telefónico do telemóvel do co‐réu Manuel Lima Bravo, mostra expressamente que estava sob cobertura da “antena dos Combatentes/São‐Paulo e depois Liga Africana (fls. 455), e o telemóvel da Jéssica Coelho indicava “antena da Jembas/1.o de Maio ‐ Unitel B (fls. 243), o que prova TECNICAMENTE que estavam em diferentes zonas da cidade de Luanda, ou seja, que não estavam juntos, e que portanto, o tal pseudo encontro não passou de uma INVENÇÃO para se conseguir forjar prova a fim de imputar inverdades contra si, e com isso ilibar os reais autores deste hediondo e vil acto contra o infeliz nos autos.

 

Resulta dos autos que várias testemunhas do ocorrido, residentes nos arredores do local do crime, afirmaram (vide declarações de Fernando Lucamba, à fls. 193 e 194, Dias Carlitos à fls. 377e 378 e António Baptista à fls. 396 e 397 e ainda vídeos junto aos autos) que na noite dos factos ouviram MUITOS TIROS e QUE SÓ DEVIDO A ISSO (TIROS) NÃO PUDERAM PRESTAR SOCORRO A VÍTIMA. Entretanto, PASME‐SE, a instrução juntou nos autos uma arma apreendida, supostamente usada pelos réus aqui presentes para ameaçar a vítima, arma essa que não disparou, pois conforme eles mesmo dizem, a pistola encravou por 2 vezes em que tentaram usá‐la contra o infeliz. Entretanto, foram recolhidos invólucros de arma de fogo no local do crime. É possível existirem muitos tiros de uma arma que não disparou? E será possível recolherem‐se invólucros se a arma não dispara? (vide prova junta aos autos pelo MP fls 377, 378, 396 e 397). Os vizinhos afirmam que na noite de 29.09.2012, no local do crime, houve vários disparos de armas de fogo e ruídos de pelo menos duas viaturas. Que pela manhã eram visíveis os rodados das viaturas (Jeeps) no local do crime. Por que razão estes factos não aparecem claros na reconstituição policial?

 

A PISTOLA -  junta aos autos disparou ou não no local do crime? Repare‐se que a entrevista recolhida/exibida pela Televisão Pública de Angola (TPA) foi concedida por cidadãos anónimos, sem que se soubesse ainda quem era a vítima nos autos, isto é, sem nenhum interesse no caso, falando apenas a verdade do que viram e ouviram (bem diz o ditado: “Vox populi, Vox Dei – A voz do povo é a voz de Deus), portanto das duas uma, ou a instrução escondeu os verdadeiros algozes da vítima ou estamos diante de uma péssima instrução, cujo objectivo era apenas vitimizar uma menor inocente para desviar atenções e instigar o ódio entre famílias. Quaisquer das opções, estamos diante de um péssimo serviço à justiça e ao combate a criminalidade.

 

  1. Os autos fazem referência de que houve uma prova de lofoscopia, ou seja, foram recolhidas no local do crime várias impressões digitais de vestígios palmares, (dedos e mãos) com realce para as digitais de dedos ensanguentados que submetidas ao teste de lofoscopia do Laboratório Central de Criminalística teve como resultado não condizerem com as impressões de nenhum destes co‐arguidos que estão aqui nesta sala apontados como autores do crime, nem sequer corresponderem com as da vítima, o infeliz Jorge Valério. Note‐se bem meritíssimos, não são quaisquer impressões digitais, mas sim de dedos ensanguentados, de quem esteve lá e teve contacto com o sangue da vítima. Ora, se assim é, quem lá esteve não são esses que estão aqui e neste caso porque é que aqui estamos? Porque é que aqui estamos com estes arguidos? (fls. 842) Então, nós, defesa perguntamos e pedimos encarecidamente que V.Ex.as meritíssimos juízes façam a mesma pergunta: quem são os donos desses dedos? Facto curioso e que levanta diversas interrogações não esclarecidas é que a data do ocorrido crime todas as residências no locus delicti estavam inacabadas e inabitadas e precisamente semanas depois, apenas a única casa habitada era aquela onde o Jorge Valério foi violentamente morto. Mais ainda, foram feitas imediatamente obras nessa casa, enquanto todas as outras permaneceram por acabar por mais de dois anos. Alguém acha isso normal? Quem é o ilustre e destemido forasteiro que sozinho ocupa uma casa onde tinha acabado de ocorrer um crime tão violento? A quem interessava alterar e promiscuir o local do crime? Com que objectivo? De eliminar provas remanescentes ou vestígios? Quem era o verdadeiro proprietário daquela residência naquela altura em que os factos ocorreram? Mais ainda Meritíssimos, mais: Quem vive nessa casa até hoje?

Fim de citação 

A imprensa presente na sala de audiências procurou obter uma cópia dos referidos vídeos apresentados, o que foi negado pelo Juiz da causa, pelo facto de ainda não terem sido exibidos para o público presente no julgamento, o que se prevê acontecer durante a próxima sessão. Club‐K conta durante a próxima semana exibir na íntegra os mencionados vídeos.

A próxima sessão de julgamento ficou marcada para sexta‐feira, dia 30 de Outubro, na qual se iniciará o interrogatório dos réus.

 

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