Luanda - Quando penso nas potencialidades naturais e os recursos que Deus colocou no nosso subsolo pátrio e penso na forma como o angolano usufrui destes recursos, logo me consciencializo que algo não está bem. É verdade que tivemos um longo periodo de guerra que atrasou a vida da maioria dos angolanos, enquanto que, para uma minoria, a mesma guerra foi a mola impulsionadora que os transformou numa espécie de oligarcas. Vezes sem conta escutamos a discursos onde se afirmam que os recursos naturais que o país dispõe precisam de homens capazes de os extrair para que possam gerar riqueza e servir o povo.

Fonte: Club-k.net

Bem, ao olhar para a crise que vivemos e atendendo que a indústria petrolífera poderá nunca mais ser a mesma, opções devem ser encontradas para minimizar as dificuldades que vivemos. Uma vez que acabamos de completar os nossos 40 anos de independência, é tempo de reflexão, análises e balanços sobre como temos trabalhado para que Angola seja o país que os nossos pais e antepassados sonharam. Acompanhei com muito interesse os vários depoimentos e reflexões que foram feitos sobre os ganhos da independência do ponto de vista social, económico e político. Uma vez que a educação é o ponto nefrálgico para uma verdadeira independência, é desse elemento que quero aqui enfocar.

O número de angolanos com curso superior em 1975 era muito reduzido e se tivermos que comparar com o tempo actual, não teremos dúvidas em afirmar que o país deu um salto de gigantes neste domínio. As várias instituições públicas e privadas de ensino superior espalhadas pelo território nacional têm injectado milhares de licenciados ao mercado de trabalho todos os anos. A pergunta que devemos colocar‐nos é se estamos a ser equipados com as competências e habilidades necessárias para darmos resposta cabal aos desafios que o país nos apresenta. Ou estamos a sofrer da doença de “doctormania aguda” que muito nos eferma? Será que estes quadros satisfazem as exigências das necessidades do país?

Num discurso na Universidade de Cape Town em 2013, Barack Obama fez referência sobre a maneira como em algumas zonas da África, os países passaram a adoptar uma politica proactiva de resolução dos problemas que mais afligia os seus povos. Obama falou sobre a maneira que alguns países tinham encontrado soluções proactivas para reduzir os casos de doenças evitáveis. Falou sobre algumas iniciativas pioneiras de grande sucesso em África que tinham grande repercursão mundial, tais como o pionerismo do transplante do coração humano na África do Sul, a revolução e inovações da indústria de microfinanças em Kampala (Uganda), as transações bolsistas de Lagos (Nigéria) e o empreendorismo de telefonia célulares de Nairobi (Kénia).

Obama partilhava da ideia segundo a qual estas realizações eram uma demonstração clara que o continente estava em movimento e que alguns países haviam decidido deixar de ser simples importadores de tecnologias e produtos acabados para passaram a ser inovadores e ensinar o mundo. Todas estas conquistas só são possíveis com um sistema de ensino rigoroso onde não se queimam etapas. Não interessa a imensidão dos recursos naturais que um país tenha, se os seus cidadãos não forem suficientemente capazes não poderão ser sustentáveis, não poderão proporcionar a qualidade de vida que se almeja. Aliás hoje é entendimento comum que o recurso mais importante que um país pode ter é a qualidade de formação dos seus cidadãos. Quanto melhor preparados técnica e cientificamente forem os cidadãos melhor estes poderão produzir riquezas.

No passado mês de Outubro a Ethiopian Power Engineering Industries (EPEI) anunciou que no prazo de dois meses iria iniciar com o fabrico de automóveis e maquinarias militares made in Ethiopia. Diariamente, serão fabricados vinte motores de automóveis e outros equipamentos. Este projecto visa aumentar o número de automóveis per capita por cidadão no país, que neste momento é de dois automóveis por cada 1,000 pessoas. Com cerca de 94 milhões de cidadãos, a Ethiopa tem somente 587,400 veículos em circulação, por isso precisa urgentemente de suprir este déficit. Ao andar pelas ruas de Adis Abeba é impossível não se notar a antiguidade dos carros que circulam nela. Vemos Ladas, Nivas e outros carros que eram vistos nas estradas de Angola nos finais dos anos 70 e nos anos 80 e que agora raramente são vistos por cá. Se aquelas velhas máquinas conseguiram vencer os desafios do tempo e continuam intactos servindo os Etiopes e seus visitantes, isto quer dizer que existem bons mecânicos naquele país. Aliás isto não deveria ser de admirar porque a Ethiopian Airlines, uma das maiores e melhores companias áreas de África, tem uma equipa invejável de engenheiros e técnicos nacionais que faz a manutenção da sua frota de aeronáveis. Eles recorrem muito pouco à assistência técnica de expatriados. Mesmo os grandes projectos imobiliários espalhados pela Adis Ababa são quase todos liderados por empreiteiros e equipas nacionais. O mais interessante é ver que os andaimes e extensores usados para sustentar os pilares e lajes dos modernos edifícoos em construção na cidade são feitos de material local. O que é nacional está na moda na terra do Imperador Haile Selasie.

Diz‐se que hoje não precisamos de "inventar a roda quando essa já foi inventada", tudo o que precisamos de fazer é ver o que os outros têm feito bem e tentar replicar para a nossa realidade. A Etiopia aprendeu com as lições dos novos países industrializados da Ásia que cedo se aperceberam que o maior investimento que um país pode fazer é garantir uma formação de qualidade aos seus cidadãos. O Japão, a China e a Correia do Sul são os maiores e melhores exemplos de países cujos governos assumiram metas concretas sobre o nível de desenvolvimento que queriam alcançar num dado momento.

Logo após a sua rendição na II guerra mundial o Japão mandou os seus melhores alunos estudarem nas melhores universidades dos países ocidentais. Após o regresso à pátria, muitos dos quadros japoneses formados começaram a replicar as tecnologias que haviam aprendido no exterior. Os seus produtos eram considerados de “maiuias” (emitação) e para confundir ainda mais, o governo japonês resolveu batizar um dos seus municípios/cidade de USA. A cidade de USA era onde se encontravam as maiores e melhores fábricas do Japão. Os produtos fabricados naquela cidade eram... made in USA. Porém, os quadros Japoneses foram se sofisticando e não foi de admirar que em poucas décadas se tenham tornado líderes em produtos tecnológicos e na indústria automóvel. Algumas décadas depois a China de Deng Xiaoping seguiu o mesmo caminho. Muitos dos produtos chineses, apesar da melhoria que têm registado nos últimos anos, são ainda considerados de “maiuias”. A pujança da economia chinesa e a sua resiliência não passa despercebida aos olhares até dos mais incautos dos críticos. A China passou de uma economia rural retrógrada para uma economia multi sectorial sem precedentes na história mundial. Isso não veio por acaso, pois que a china sabia que não precisava de inventar ou criar algo novo. Tudo o que precisava para se desenvolver estava criado e eles só precisavam de aprender como fazé‐lo. O que fizeram? Desenharam um plano de formação estratégico de quadros em quase todas áreas chave para a sua economia. Os bolseiros do governo chines tinham uma missão de estado bem específica e não podiam dar‐se ao luxo de falhar. Apesar de se terem tornado já na segunda maior economia mundial, a governo Chines não se dâ por satisfeito. Ele compreende que muito há ainda lá fora para o povo chines aprender e solidificar as suas bases económicas. Andemos por este mundo fora e veremos que os estudantes chineses estão em quase todas as universidades de renome. Os estudantes chineses são a maior população de estudantes estrangeiros nas universidades europeias, americanas e até nas universidades Africanas de renome. Quando foi necessário “copiar” tecnologias os estudantes chineses tinham essa missão. Não é atoa que hoje a china é considerada como um dos Estados líderes na espionagem mundial. Daqui há poucos anos iremos descobrir que afinal as famosas imitações da Nigéria passaram a ser originais reconhecidas mundialmente. A questão é bem simples de compreender essa história de passagem de tecnologia não existe. A tecnologia ou know‐how não se passa – imita‐se ou rouba‐se. Os dentores das tecnologias não quererão passá‐las a outros Estados porque a sua vantagem comparativa é imperiosa para tirarem maior partido dos Estados“atrasados”. Portanto essa história que estamos constantemente a ouvir nos mídias que os quadros estrangeiros que vêm para o nosso país devem passar o know‐how aos quadros angolanos é uma utopia. Nínguém vai passar expertise aos angolanos de mãos beijadas. Por isso andamos nesta lenga‐lenga de passagem de know‐how no sector petrolífero e nada é visto de concreto. Como se explica que continuamos ainda muito dependentes em quase todas as fases da indústria petrólifera depois de quase 40 anos? Porque ninguém quer dar a sua tecnologia de mãos beijadas. Não culpemos a guerra por isso.

É muito difícil compreender‐se as políticas de formação de quadros que o país tem levado a cabo nos últimos 40 anos. A maioria dos primeiros bolseiros do Angola pós‐independência foi para Cuba e alguns países da europa do leste. Países que eram exemplares em alguns sectores chave, tais como a agricultura e a indústria. Mas infelizmente, Angola quase que nada beneficiou com o eventual know‐how adquirido por estes quadros. A rica agricultura deixada pelo sistema colonial desapareceu, a parque industrial, até mesmo em Luanda (que não teve guerra) também desapareceu. Muitos dos bolseiros não tiveram enquadramento nas áreas em que foram formados. Muitos bolseiros enviados ao exterior por ministérios e outras instituições não regressaram ao país e muitos dos que voltaram não tiveram colocação. Não houve uma política de aproveitamento de quadros e isso explica um pouco as grandes dificuldades que temos vivido com o dilema da diversificaçao da economia. Ou seja os quadros que deveriam ter impulsionado a produção agrícola não foram aproveitados como devia ser. Mesmo muitos dos engenheiros agrónomos e extensionistas agrários formados no país não foram aproveitados e alguns passaram a exercer actividades de escritório ao invés de estarem no campo. Isto explica igualmente os problemas dos elevados preços dos principais produtos básicos. Não se compreende como os preços dos alimentos sejam dos mais altos do mundo, quando temos uma imensidão de terras aráveis e águas abundantes em quase todo o território. Creio que as nações que não foram bafejadas com a sorte que a natureza nos proporcionou riem‐se de nós. Não precisavamos de ser o país mais undustrializado de África até a essa altura, mas já deveriamos ter um uma agricultura robusta e com a sorte do mar que temos os nosso portos já deveriam estar a exportar produtos agrícolas por quase todo o mundo. As terras aráveis que a província de Luanda sempre teve deveriam ter sido ultilizadas para produzir alimentos para todo o país durante os momentos mais difíceis do conflito armado.

O país nunca teve uma política séria de formação e aproveitamento de quadros. Mesmo o actual plano de formação de quadros no âmbito do PND, já começou mal. Foram traçados planos e definidas áreas prioritárias mas quase que nada se fala sobre como se irão atingir às tais metas. As universidades Angolanas continuam pouco competitivas e fora do ranking das 100 melhores universidades de África. O estado criou e incentivou o surgimento de instituições do ensino superior por quase todo o país, como se de escolas do ensino de base se tratassem. Como podem criar instituições do ensino superior quando não se alocam recursos financeiros suficientes para promover a investigação científica?