Luanda  - A política, na sua essência, é uma ciência ou arte de governar; que baseia­ se num conjunto de valores, princípios e objectivos, servindo-­se de guia para a formulação de programas e tomada de decisões, capazes de determinar a planificação de um conjunto de actividades, em vários domínios.

Fonte: Club-k.net

A ciência, por sua vez, é arte ou prática baseada num corpo organizado de conhecimentos e regras, fundados num conhecimento exacto, racional e verificável, que se expressa por leis; visando, nesta dimensão, um objecto pré­ determinado e um método próprio, que é objectivo, bem concebido, fundamentado e demonstrativo nas suas relações essenciais.

 

Neste contexto, a ideologia, no sentido lato, é um sistema de ideias, valores e princípios que definem uma determinada visão da sociedade e do mundo, fundamentando e orientando a forma de agir de uma pessoa ou de um grupo social, politico ou religioso; visando determinados objectivos e metas.

 

Nesta conformidade, a ideologia de um partido politico parte de uma base teórica bem definida, que visa a conquista do poder do Estado, como condição sine qua non para poder materializar os objectivos preconizados, assentem num conjunto de valores e princípios previamente delineados.

 

Logo, o elemento básico que define e determina a ideologia do partido político é o relacionamento deste sujeito às classes sociais e aos meios de produção, em termos de trabalho, serviços e investimentos.

 

Ou seja, o ideário teórico de um partido politico não é bastante para determinar sua ideologia, sem que este seja relacionado com o seu posicionamento prático diante as forças produtivas e os meios de produção. Sendo estes, no seu conjunto, mecanismos mais adequados para estabelecer as modalidades e regras de compensação e ajustamento entre os três factores principais produtivos, nomeadamente: O trabalho, o investimento e o rendimento; que se traduzem, em concreto, em salário, renda, juro e lucro.

 

Nesta lógica, as sociedades democráticas, do mundo contemporâneo, são estratificadas em três camadas socias, sendo: a classe alta (abastada), a classe média (menos rica) e a classe baixa (pobre).

 

A «classe alta» é composta por capitalistas, proprietários das indústrias, das fábricas, dos bancos e das grandes empresas; dominam os mercados internos e externos dos seus países; sendo sócios das multinacionais.

 

A «classe média», em geral, é composta por elementos de rendimento médio, com nível de vida razoável, confortável e estável. Nisso incluem, intelectuais, trabalhadores especializados, técnicos, operários, profissionais, artistas, comerciantes, fazendeiros, agricultores, funcionários públicos, etc.

 

A «classe baixa» comporta os segmentos vulneráveis; com padrão de vida baixa; vivendo no limiar da pobreza; de baixa renda; lançada no mercado informal; sem capacidade de poupança ou de elevar o nível escolar e académico da família. Nisso incluem: as classes trabalhadoras; camponeses; empregados; vendedores informais; desempregados; e, diversos segmentos vulneráveis.

 

Esta conjuntura, da estratificação das sociedades democráticas contemporâneas, faz com que os partidos políticos definam e determinam o seu alinhamento ideológico, na defesa de cada uma dessas classes sociais. Interessa-­me, neste respeito, resumir as três correntes ideológicas dominantes, sendo: Comunismo, Socialismo e Capitalismo.

 

O COMUNISMO é o regime político, económico e social caracterizado pela comunhão de todos bens (meios de produção e bens de consumo) e pela ausência da propriedade privada; uma sociedade sem classes; monopartidário; e, de economia planificada e centralizada.

 

O SOCIALISMO preconiza a política, segundo a qual, toda a gente ter o direito igual na partilha da riqueza do país; a direcção e domínio do Estado nos bens de produção e de consumo; a distribuição justa da riqueza; e, a defesa das classes trabalhadoras.

 

O CAPITALISMO é o regime económico caracterizado pela grande produção, pelo investimento de grande massa de bens, pela propriedade individual dos capitais, e por um mercado livre e competitivo; o poder político é dependente dos detentores de capitais, que estabelecem o monopólio e o neoliberalismo, que reduzem sobremaneira a intervenção do Estado nos assuntos económicos do país, para a defesa das classes trabalhadoras.

 

No mundo contemporâneo, do mercado global, regista­se transformações profundas em relação as correntes ideológicas dominantes, acima referenciadas. Mesmo nos países comunistas, como a China, a ideologia comunista, já não assume­se como tal, no ponto de vista da sua matriz ideológica tradicional; reformando­se e adoptando alguns valores e princípios do sistema capitalista. Mantendo intacto o cerne da sua ideologia, consubstanciado nos princípios da centralização e planificação económica; liberalizando ligeiramente a propriedade privada, nalguns sectores menos estratégicos; afirmando o princípio da realização de lucros como objectivo principal de investimentos; abrindo­se parcialmente aos investimentos estrangeiros e ao comércio externo, junto do mercado internacional.

 

Isso aplica ­se igualmente ao socialismo que ficara moderado e ajustado ao sistema capitalista; mantendo os princípios sagrados da defesa das classes trabalhadoras, da valorização do trabalho, da solidariedade social, da equidade e da criação do equilíbrio entre o capital, o trabalho e os serviços, no processo da distribuição do rendimento nacional; não descurando os mecanismos da economia do mercado livre.

 

O capitalismo apresenta­se como a matriz central do sistema democrático contemporâneo, que vincula e regula o mercado global entre os Estados membros da comunidade internacional, nos diversos domínios industrial, comercial e financeiro. Em função disso, o mundo capitalista, assente na democracia ocidental, é dominado por duas famílias politico­ideológicas, sendo:

 

Centro­ Direita, que engloba todas correntes da Direita. Centro­ Esquerda, que abrange todas correntes da Esquerda. O elemento fulcral que divide e distingue as duas famílias politica, são:

 

O Centro­-Direita, defende o «Capital»; isto é, os capitalistas, os proprietários das grandes empresas, das indústrias, dos bancos, das fazendas e dos grandes negócios; ou seja, a Classe Alta.

 

O Centro­-Esquerda, por outro lado, defende o «trabalho e serviços», isto é, a Classe Média e a Classe Baixa.

 

Na realidade, as duas correntes ideológicas, por natureza, são opostas diametralmente – na ideologia, nos valores, nos princípios e nos objectivos estratégicos. Pois, as suas «bases sociais» são efectivamente opostas, entre a entidade patronal e os empregados.

 

A título de exemplo, nos Estados Unidos da América, o Partido Republicano defende os Ricos. Ao passo que, o Partido Democrata defende a Classe Média e a Classe Baixa. O Reino Unido, tem igualmente o Partido Conservador e o Partido Trabalhador, assumindo linhas ideológicas distintas e contraditórias.

 

A contradição principal, neste momento, reside na acumulação cada vez maior da riqueza do mundo nas mãos de um pequeno número de magnatas; em detrimento da maioria esmagadora da humanidade; sujeita a fome e a pobreza; resultando em problemas sociais enormes, como por exemplo, os conflitos internos e os êxodos migratórios, que se verificam no dia de hoje, a nível mundial.

 

Neste respeito, a Social­Democracia (centro­esquerda) defende a criação da Classe Média ampla, extensa e estável, com fim de equilibrar a sociedade, distribuir a riqueza a uma escala ampla; reduzindo gradualmente a classe baixa. Ao passo que, a Democracia­ Conservadora (centro­direita), defende a concentração da riqueza nas multinacionais (grupos económicos), enfraquecendo e reduzindo a classe média, que permite o ingresso nela da classe baixa. A concentração da riqueza, na classe alta, viabiliza o surgimento do monopólio económico, capaz de sujeitar os poderes políticos aos detentores de capitais.

 

Analisando bem a sociedade angolana, verás que, as linhas ideológicas partidárias já estão bem definidas e distintas. Alguns Partidos históricos, como MPLA, que eram da esfera da Esquerda, com uma ideologia socialista ou comunista, hoje já não reúne condições necessárias para permanecer na grande família política da Esquerda. Dando o facto de que, o processo da transição do sistema socialista (da propriedade colectiva), para o sistema capitalista (da propriedade privada), fez com que, os meios de produção e de bens de consumo ficaram partilhados entre os detentores do poder político, que se transformaram em detentores de capitais públicos.

 

Este fenómeno acentuado, de desvios de fundos públicos, não ficou registado na China e na Rússia, onde a propriedade do Estado não foi alvo de assalto e de saque pelos governantes. Existe ainda, nesses países acima referidos, a distinção nítida entre a propriedade pública e a propriedade privada. O que não acontece em Angola. Neste momento, por exemplo, decorre o processo da restruturação da SONANGOL (empresa pública dos combustíveis), por uma Comissão Ad ́hoc, dirigida e controlada pela Dona Isabel dos Santos, filha do Presidente Angolano, a mulher mais rica da África. Esta Empresa Pública, a SONANGOL, de dimensão estratégica, estará em via de privatização e da partilha do seu património pelos membros destacados do poder.

 

No discurso do Presidente José Eduardo dos Santos, alusivo às celebrações do dia da independência de Angola (11 de Novembro de 2015) foi pertinaz na sua afirmação, defendendo a «essência da acumulação primitiva do capital, criando grandes empresas e grupos económicos, com recursos públicos, como forma de garantir a estabilidade e a independência do nosso país».

 

Esta Visão, da acumulação e concentração de capitais (depauperando o Estado), num pequeno grupo de pessoas, em detrimento da maioria (classe média e classe baixa) esmagadora da população angolana, não reflecte a ideologia capitalista, de Centro­ Esquerda. Pois que, esta política, acima referida, está na base da crise financeira actual, que tem estado a desarticular constantemente a classe média angolana, que vinha desabrochar­se lentamente dos escombros da Guerra Civil.

 

Por isso, verifica­se hoje, o agravamento das assimetrias sociais, em todos sectores da sociedade angolana, à medida que o custo de vida soube vertiginosamente, devido a desvalorização do Kwanza, da inflação, da queda do preço do barril do petróleo, da escassez de divisas, da queda de importações de bens de consumo, do desequilíbrio acentuado entre a oferta e a procura, da subida constante dos combustíveis, e da falta de aumento de salários. O que retira automaticamente o poder de compra das famílias angolanas. Se o Estado Angolano mantivesse o seu fundo de serva (como a Rússia) teria eficiência e capacidade de gerir bem o mercado interno e proceder eficazmente à diversificação da economia nacional, sem sacrificar duramente o povo, conforme está sendo feito agora.

 

Mesmo assim, o Presidente do MPLA ainda acha que, a sua política, de acumulação primitiva do capital, garante a estabilidade e a independência de Angola. O que revela que, o MPLA perdera a sensibilidade social; e esta política não se enquadra no sistema capitalista, tanto da Esquerda, quanto da Direita. Logo, mesmo se este Partido tiver a vontade política de manter­se no Centro­Esquerda, mas as condições materiais, espirituais e morais não o permite sê­lo.

 

Pois, os Dirigentes do MPLA, do círculo interno do poder, são proprietários de todos grandes negócios no país; donos das grandes empresas, das fábricas e indústrias, dos centros comerciais e supermercados, dos bancos, dos imoveis das centralidades e outros, das terras vastas ocupadas e privatizadas, das fazendas extensas, dos colégios e das clinicas, de referência, etc. Esta classe abastada, do regime, monopoliza todo mercado interno e externo, sem dar oportunidades a ninguém, fora do seu círculo interno do poder. Na verdade, os Dirigentes do MPLA estão mais preocupados com os seus negócios e lucros, lá fora do país, carregando o fardo pesado da crise financeira sobre os ombros do Povo Angolano.

 

A Lei Geral de Trabalho, aprovada em 2015, (somente com o voto da maioria qualificada da Bancada Parlamentar do MPLA) pela Assembleia Nacional, espelha explicitamente o carácter ideológico deste Partido, que era nacionalista; que hoje desvaloriza o trabalho e explora as classes trabalhadoras angolanas, em proveito das suas empresas.

 

Em síntese, nesta altura, o MPLA é dirigido por uma classe de capitalistas selvagens e altamente corrupta, que enriquece­se ilicitamente através do saque e da pilhagem impiedosa do Cofre do Estado Angolano, sob a «teoria» reaccionária e antipatriótica, que consiste na acumulação primitiva do capital.

 

Em meu entender, o premente nesta altura, e o garante da estabilidade e da nossa independência, não é a criação de grupos de capitalistas selvagens, mas sim, promover uma classe média ampla e estável, capaz de engrossar ­se nela a classe baixa, e de assegurar o bem­ estar da sociedade, dos combatentes pela liberdade, dos ex-­militares, dos antigos combatentes e dos seus descendentes, que vivem hoje em condições lastimáveis, de penúria.

Luanda, 10 de Fevereiro de 2016