Lisboa - Joana Marques Vidal soube antecipadamente das suspeitas de corrupção que envolvem o procurador Orlando Figueira e Manuel Vicente, vice-presidente da República de Angola, antes da Operação Fizz sair para a rua. Ao que o Observador apurou, Amadeu Guerra, diretor do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), informou a procuradora-geral da República (PGR) dos contornos do caso e das diligências que foram efetuadas na terça-feira.

Fonte: Lusa

A PGR não transmitiu tal informação a Francisca Van Dunem, ministra da Justiça. Questionada pelo Observador, fonte oficial assegurou:

A Ministra da Justiça não foi informada pela Procuradora Geral da República sobre as diligências que iriam ocorrer e não tem comentários a fazer relativamente a processos-crime em curso.”
O Observador contactou igualmente a Procuradoria-Geral da República. Fonte oficial afirmou:

Desde sempre e em todos os momentos, a procuradora-geral da República procede, e continuará a proceder, em conformidade com o princípios consagrados na Constituição e na lei.

Na República Portuguesa vigora o princípio da separação entre os poderes legislativo, executivo e judicial, estando constitucionalmente consagrada a independência dos tribunais e a autonomia do Ministério Público, designadamente no que respeita ao exercício da acção penal.
Assim, não houve qualquer contacto com a ministra da Justiça sobre qualquer processo.

O cuidado de Amadeu Guerra em explicar o caso Figueira antecipadamente à sua superior hierárquica, prende-se com a imagem do Ministério Público (MP), em geral, e do DCIAP, em particular. Sendo Orlando Figueira um ex-procurador daquele departamento, sendo o DCIAP um corpo de elite que investiga os casos mais complexos na criminalidade económico-financeira e estando em causa suspeitas de corrupção que envolvem igualmente o vice-presidente de Angola, Manuel Vicente, Amadeu Guerra não quis que Joana Marques Vidal fosse surpreendida com notícias da comunicação social.

Fonte oficial garante que ministra da Justiça não foi informada pela PGR das diligências que envolveram o nome do n.º2 do governo angolano. A PGR soube antecipadamente do caso pelo diretor do DCIAP.

O MP, como enfatizam diversas fontes judiciais, é uma magistratura hierarquizada em que a procuradora-geral da República é o líder máximo. Acresce que o DCIAP é um órgão da Procuradoria-Geral da República. Isto é, responde diretamente perante Joana Marques Vidal.

No que diz respeito às relações entre a Procuradoria-Geral da República e o Governo, impera o princípio da separação de poderes entre o poder político e o poder judicial. Ou seja, o Ministério Público tem autonomia para proceder ao exercício da ação penal e não responde legalmente perante o poder político.

Recorde-se que o MP está a investigar o ex-procurador Orlando Figueira devido a alegados subornos pagos a troco do arquivamento de um inquérito criminal aberto no DCIAP contra Manuel Vicente, por suspeitas de branqueamento de capitais.

MNE diz que não tem “informação credível”

Francisca Van Dunem é o segundo membro do governo a assumir publicamente que nada sabia sobre o caso Figueira. Augusto Santos Silva, ministro dos Negócios Estrangeiros, já tinha afirmado o mesmo:

Não uso informações de processos que estão em segredo de justiça. Não tenho informação da parte da única entidade que pode falar pelo Ministério Público, que é a Procuradoria-Geral da República”, disse à Lusa.
Santos Silva, contudo, fez questão de recordar que “vigora, no nosso ordenamento constitucional, e bem, o princípio da separação de poderes e da independência do poder judicial”.

Também o novo embaixador de Portugal em Luanda, que esta quinta-feira apresentou as suas credenciais ao presidente José Eduardo dos Santos e teve direito a uma audiência de 30 minutos, afirmou que a investigação judicial a Manuel Vicente não afetará as relações bilaterais entre os dois países. Repetindo o argumento de Santos Silva (são “questões do foro judicial”), João Caetano da Silva afirmou que tenciona “promover as relações institucionais entre os dois países, que estão acima de circunstâncias conjunturais, e que continuarão a ser relações muito próximas e de grande amizade”.

João Caetano da Silva aguardava desde dezembro a sua acreditação em Angola por parte das autoridades judiciais angolanas.