Lisboa  - Helder Bataglia deverá ser o 13º arguido na investigação em que o ex-primeiro-ministro está indiciado por corrupção e, segundo o SOL apurou, já terá mesmo seguido para Luanda uma carta rogatória para notificar o empresário luso-angolano, onde constarão todos os factos que lhe são imputados.

Fonte: Lusa

O Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) acredita que o empresário assume um papel central na Operação Marquês. Os investigadores sustentam que o fundador da Escom e acionista do empreendimento de luxo Vale do Lobo terá sido o intermediário que fez chegar 17,5 milhões de euros às contas de Carlos Santos Silva na Suíça, dinheiro que na verdade seria do ex-primeiro-ministro.

Segundo o DCIAP, desse montante, 5,5 milhões ainda passaram pelas contas de José Paulo Pinto de Sousa, primo de Sócrates, antes de chegarem às referidas contas na Suíça. Além de beneficiar o Grupo Lena, o MP suspeita também que o ex-primeiro-ministro terá concedido benefícios a Vale do Lobo. Neste ‘capítulo’ da Operação Marquês, são já arguidos Diogo Gaspar Ferreira, diretor executivo de Vale do Lobo, e a sociedade Oceano Clube Empreendimentos Turísticos do Algarve.

Bataglia tem os seus negócios sediados há vários anos em Angola e tem relações familiares com o ex-primeiro-ministro, pois é pai da filha de uma prima direita de Sócrates.

Constituição de arguido

Segundo o n.º2 do artigo 58.º do Código de Processo Penal, “a constituição de arguido opera-se através da comunicação, oral ou por escrito, feita ao visado por uma autoridade judiciária ou um órgão de polícia criminal, de que a partir desse momento aquele deve considerar-se arguido num processo penal e da indicação e, se necessário, explicação dos direitos e deveres processuais referidos no artigo 61.º que por essa razão passam a caber-lhe”.

Neste caso, a carta rogatória enviada pela Procuradoria-Geral da República portuguesa à sua congénere angolana poderá – além da notificação – solicitar ainda que Helder Bataglia seja ouvido sobre as suspeitas do procurador Rosário Teixeira. Ou até solicitar outras diligências.

A negociação da audição

Esta decisão do procurador Rosário Teixeira surge depois de um período em que foram tentadas várias hipóteses para ouvir Helder Bataglia. A defesa chegou a sugerir que o empresário viajasse até Lisboa com a garantia de que não seria detido, de forma a que pudesse voltar a Luanda, onde reside – uma imunidade que é conferida pela convenção da Comunidade de Países de Língua Oficial Portuguesa (CPLP).

Mas o DCIAP não autorizou, uma vez que, caso a imunidade fosse aceite, seria válida para outros inquéritos em curso – ou seja, Bataglia poderia vir livremente a Portugal sem que pudesse ser privado da sua liberdade, quer no caso que envolve o ex-primeiro-ministro quer no âmbito de outros inquéritos em curso e em que é visado, como os do Monte Branco, Escom e BES.

Ainda houve conversações entre o Ministério Público e o advogado de Helder Bataglia para que se chegasse a um acordo quanto a uma viagem que não estivesse ao abrigo daquela convenção. Aliás, o procurador titular do inquérito em que se investiga José Sócrates terá deixado claro no processo que tinha interesse numa apresentação voluntária de Bataglia para que este pudesse ser constituído arguido e ouvido nessa qualidade.

Defesa de Sócrates nega favorecimento

Segundo o Diário de Notícias avançou nesta segunda-feira, a defesa do ex-primeiro-ministro entregou entretanto no processo um parecer jurídico em que se conclui que não houve qualquer benefício do seu governo a Vale do Lobo.

O MP defende que a aprovação pelo Conselho de Ministros, em 2007, do ponto 6 do Plano Regional de Ordenamento do Território do Algarve (PROTAL) trouxe benefícios ao empreendimento de luxo, relacionando tal suspeita com a coincidência temporal de fluxos financeiros que tiveram como destino as contas de Santos Silva. Este é um dos factos que estão na origem dos indícios de corrupção contra o ex-primeiro-ministro.

O parecer, assinado pela professora Fernanda Paula Oliveira, da Universidade de Coimbra, concluiu que não existiu, porém, qualquer relação entre a aprovação e o benefício.

Os outros arguidos

Atualmente são 12 os arguidos na Operação Marquês.

José Sócrates é o arguido central, suspeito da prática dos crimes de corrupção passiva para ato ilícito, fraude fiscal qualificada e branqueamento de capitais.

Carlos Santos Silva, segundo o Ministério Público, terá aceitado manter nas suas contas um acervo de 23 milhões de euros do ex-governante. O empresário e amigo de Sócrates é ainda suspeito de ter feito entregas em numerário e de ter simulado compras de imóveis para que o dinheiro pudesse ser transferido para o ex-primeiro-ministro de forma aparentemente legal.

O ex-ministro Armando Vara também já foi constituído arguido. Segundo a investigação terá conseguido, enquanto administrador da Caixa Geral de Depósitos, um empréstimo com condições mais vantajosas para o empreendimento Vale do Lobo.

Lalanda e Castro, responsável pela Octapharma em Portugal – farmacêutica para a qual Sócrates trabalhava – também está indiciado no inquérito. Segundo a equipa liderada pelo procurador Rosário Teixeira, terá aceitado entrar no esquema de branqueamento de capitais montado por Santos Silva e Sócrates. Isto porque, além dos 12.500 euros de salário, Sócrates terá a determinado momento passado a receber mais 12.500 euros mensais de outra sociedade de Lalanda e Castro. Os investigadores acreditam que esta última parcela era uma remuneração simulada com vista a trazer mais recursos para a esfera do ex-governante. Na verdade, Lalanda e Castro era compensado com transferências feitas a partir de contas de Santos Silva.

Entre os outros arguidos está o ex-motorista de Sócrates, que foi o ‘correio’ de envelopes com dinheiro que lhe eram entregues por Santos Silva e aceitou depositar alguns montantes nas suas contas. E ainda o advogado de Santos Silva (Gonçalo Trindade Ferreira), o vice-presidente do Grupo Lena (Joaquim Barroca), a mulher de Santos Silva (Inês do Rosário), o administrador da Sociedade Vale do Lobo (Diogo Gaspar Ferreira), o empresário Rui Mão de Ferro e a filha de Armando Vara (Bárbara Vara). A empresa Oceano Clube Empreendimentos Turísticos do Algarve, dona de Vale do Lobo, é única empresa arguida.