Luanda - Nos últimos dias, entre os assuntos mais discutidos em fóruns familiares, de amigos ou mesmo entre desconhecidos nos taxis ou nos mercados, com certeza que a crise e o reaparecimento da febre amarela se destacam.

Fonte: Club-k.net

No último final de semana, uma vizinha que prestava assistência a um familiar seu que se encontrava internado no hospital geral de Luanda contou‐nos sobre o terror que diz ter vivido nos três dias que pernoitou naquele hospital. Ela ficou espantada pelo número de mortes que eram evacuados para a morgue todos os dias. Segundo ela, em média, tomava conhecimento de mais de 20 óbitos por dia. Contou que a cena que mais a marcou foi a morte no mesmo dia de dois filhos de um casal jovem. Um morreu as 5h00 e o outro as 7h30. Ambos por sintomas que se assemelhavam à febre amarela.

 

Quase todos os bancos de urgência dos hospitais e centro de saúde públicos em Luanda estão sempre abarrotados de gente procurando por socorro. Vemos pessoas deitadas no chão, algumas aos gritos e outros quase inconscientes. É uma vista de quebrar o coração.

 

Um articulista descreveu uma breve conversa com um coveiro do cemiteiro da Viana que, com um desabafo e aparente estado de exaustão expressou‐se preocupado pela média acima dos 50 funerais que realizavam naquele pequeno cemiteiro todos os dias. Quantos funerais estarão a ser realizados todos os dias nos outros cemitérios formais e informais espalhados por Luanda?

 

Estamos a viver uma situação caótica e de calamidade, não encontro palavras diferentes que classifiquem a presente situação . É doloroso ver indíviduos cheios de energia e que muito tinham para dar ao país partirem de forma tão prematura por causa da picada de um mosquito malandro. Mas, o que mais me indigna é o facto desta situação ter sido anunciada há já algum tempo. Tudo começou nos meados do ano passado quando a situação do saneamento básico em Luanda ficou totalmente descontralada. As nossas pesquisas realizadas no âmbito da Rede Contra Pobreza Urbana indicaram que o saneamento básico nas zonas peri‐urbanas se encontrava num estado tão degradado que a saúde dos cidadãos estava ameaçada. Alertamos que era imperioso que de forma urgente se invertesse o quadro antes do início da queda das chuvas.

 

Como é sabido, a quantidade do lixo produzido em Luanda é superior à capacidade de recolha das operadoras. Este deficit faz com que os populares em alguns bairros recorram à queimadas do lixo e, quando as torneiras do céu se abrem, a água espalha o lixo por todo o lado. Em alguns bairros peri‐urbanos existem zonas onde os problemas ambientais causados pelo lixo são tão graves que um visitante teria dificuldades em acreditar que alí vivem seres humanos.

 

Não se pode falar em desenvolvimento de um país com uma população doentia. Engana‐se quem pensa que a construção de mais hospitais ou centros médicos irão resolver os graves problemas de saúde que vivemos no país. A falta de proactividade tem sido um dos grandes entraves que emperram o desenvolvimento de Angola. Parece que somos bons a agir somente quando a casa já está em chama, não preveninos. Somos reactivos, e mesmo assim de forma lenta.

 

Estamos sempre a escutar que os poucos recursos que o país dispõe neste momento devem ser canalizados para áreas estratégicas e prioritárias. O que é mais prioritário do que a perservaçao da vida do cidadão? A recolha e o tratamento do lixo é tão prioritário como o fornecimento de água, luz e a disponibilidade de comida. Por causa da negligência de alguém que não soube negociar ou abrir os cordões da bolsa para pagar as empresas de recolha de lixo, agora temos que enterrar os nossos ente queridos. E para piorar a situação, alguém disse que tivemos que pedir emprestados USD 500 mil à China para comprar vacinas de febre amarela. A ser verdade, é uma autêntica vergonha, uma vez que é para emergências do género que se devem usar as reservas do país. A vida de cada Angolano deve ser preservada até às últimas consequências, tal como é feito nos países onde a vida dos cidadãos é valorizada. Qual é o valor da vida do Angolano?