Lisboa - O chumbo do PCP ao voto de condenação à prisão dos 17 ativistas angolanos está a motivar duras críticas de socialistas e bloquistas. Os comunistas votaram ao lado de PSD e CDS e acabaram por contribuir para que o voto de condenação fosse chumbado no Parlamento. Há, por isso, quem classifique a decisão destes três partidos de “miserável” e quem acuse o PCP de se ter juntado à direita “numa estranha geometria” cujo único propósito foi defender o regime angolano.

Fonte: Observador

É precisamente isso que diz Mariana Mortágua. No Facebook, a bloquista acusa PCP, CDS e PSD de se terem unido “numa estranha geometria para defender o regime de José Eduardo dos Santos”, não condenando a “prisão abusiva dos ativistas angolanos”.

Jorge Costa, deputado e dirigente do Bloco, também escreve no Facebook que PCP e os partidos da direita preferiram estar do “lado da família de José Eduardo dos Santos” e da “ditadura angolana”.


Catarina Martins criticou o chumbo do voto de condenação. Mesmo não se referindo diretamente ao PCP, a porta-voz e coordenadora do Bloco de Esquerda deixou uma garantia: “Se um dia formos [BE] chamados a defender 17 jovens comunistas presos na Hungria ou Ucrânia por lerem um livro, também não ficaremos em silêncio”.

Recorde-se que o PCP tem sido recorrentemente acusado pelos críticos de desvalorizar as sucessivas violações dos direitos humanos em regimes comunistas.


Do lado do PS houve igualmente críticas à orientação de voto do PCP – e de PSD e CDS. A deputada Isabel Moreira classificou o chumbo destes três partidos de “miserável”. “A mensagem que a casa da democracia acaba de dar acerca dos jovens ativistas angolanos é miserável. Miserável. Nota clarificadora – os votos contra foram do PSD, do CDS e do PCP”, escreveu a socialista.


Tiago Barbosa Ribeiro, deputado do PS, também se juntou ao coro de críticas. “Esta tarde [de quinta-feira] o Parlamento cobriu-se de vergonha com o chumbo da condenação da repressão em Angola graças aos votos de PSD, CDS e PCP. Não há ingerência na defesa dos direitos humanos, que estão obviamente em causa com condenações de 2 a 8 anos de prisão para um grupo de jovens que se reuniram para ler um livro. O silêncio perante este caso não serve o futuro de nenhum país. Continuemos a falar bem alto”.


O PCP justificou o chumbo ao voto de condenação, alegando que Portugal não devia intrometer-se em questões que são da exclusiva competência das autoridades angolanas. Para Edite Estrela, no entanto, este argumento é insuficiente. “Não percebo por que razão PSD, CDS e PCP rejeitaram o voto de Condenação, apresentado pelo PS, referente à condenação dos jovens angolanos e do luso-angolano Luaty Beirão. Estou chocada”, escreveu a deputada socialista no Facebook.


Os três – Isabel Moreira, Tiago Barbosa Ribeiro e Edite Estrela -, mas também Porfírio Silva, secretário nacional do partido e porta-voz do PS para as relações internacionais, Paulo Trigo Pereira e João Paulo Rebelo, por exemplo, chegaram mesmo a votar favoravelmente a condenação proposta pelo Bloco de Esquerda. O documento assinado pelos bloquistas era em tudo idêntico ao do PS, mas com uma diferença substantiva: os deputados do BE pediam a libertação imediata de Luaty Beirão e dos outros ativistas presos.

Entretanto, as críticas de que o PCP foi sendo alvo levaram António Filipe, deputado comunista, a explicar a orientação de voto do partido.

No Facebook, o parlamentar deixa claro que não tem qualquer “simpatia pela decisão do tribunal angolano” e que os manifestantes não deveriam “sofrer qualquer sanção administrativa ou judicial”. Ainda assim, não deve caber “à Assembleia da República Portuguesa aprovar um voto formal de condenação de uma decisão judicial angolana”, argumenta António Filipe.

“Seria muito fácil para o PCP alinhar na onda. Não deve nada a ninguém e ficaria a salvo das críticas”, reconhece o deputado comunista. Mas o partido não cai nessa tentação, diz o comunista. “A Assembleia da República é um órgão de soberania de um Estado que tem uma política externa que não pode ser a de uma ONG”.

Além disso, o comunista deixa várias perguntas aos que pediam uma condenação formal da Assembleia da República à decisão das autoridades angolanas. “Alguém imagina que [essa decisão] seria inócua do ponto de vista das relações de Portugal com a CPLP e com o continente africano”? Que “não se refletiria negativamente na comunidade portuguesa em Angola?”, interroga o deputado do PCP. “E com que cara iria o Governo português pedir o apoio de Angola à candidatura de Guterres a Secretário-geral da ONU?”

A terminar, o comunista atira ainda uma crítica ao PS, acusando os socialistas de terem duas caras: primeiro, com o fato de Governo vestido, foram cautelosos; depois, e “sabendo de antemão que o seu voto não seria aprovado” na Assembleia da República, decidiram surfar a onda e condenaram o regime angolano, diz António Filipe.