Luanda - O pedido de ajuda ao FMI vai implicar algo que os portugueses conheceram nos últimos anos: austeridade, embora com formasde aplicação diferentes

Fonte: Lusa

Redução real dos salários na administração pública, cortes no investimento público e a criação de um imposto sobre o consumo como o IVA: estas deverão ser apenas três das medidas de austeridade que Angola deverá ter de adotar no âmbito do programa de resgate que o governo solicitou ontem ao Fundo Monetário Internacional (FMI).


O pedido das autoridades angolanas surge na sequência da forte quebra do preço do petróleo, matéria-prima de que dependem cerca de 80% das receitas de Angola.


O Ministério das Finanças angolano justificou o pedido de ajuda com o “declínio dos preços do petróleo”, revelando que pretende iniciar as negociações com o FMI em meados de abril, durante as próximas reuniões da primavera em Washington.


As discussões com o FMI serão prosseguidas “pouco depois, em Angola, para definir claramente o âmbito de medidas de política económica a serem tomadas no quadro dos requisitos do Programa de Financiamento Ampliado, com forte foco em reformas para remover ineficiências, manter a estabilidade macroeconómica financeira, estimular o potencial económico do setor privado e reduzir a dependência do setor petrolífero”, refere o comunicado do ministério.


Este não será o primeiro programa de assistência financeira do FMI a Angola. O último ocorreu entre 2009 e 2012 e, desde então, o FMI continua a fazer visitas regulares ao país.


No última visita que fizeram a Luanda, em outubro do ano passado, os técnicos de Washington deram recados claros. Face à descida do preço do petróleo e ao seu impacto nas receitas públicas, Angola teria de “racionalizar a despesa pública e aumentar as receitas não petrolíferas, para que a dívida pública e o défice do país pudessem descer”.


Em termos práticos, o FMI sugeria várias medidas orçamentais que deverão agora ser retomadas nas negociações para desenhar um novo programa de três anos. Por um lado, queria que o governo “racionalizasse” a despesa com salários na administração pública, em percentagem do PIB. Isso deveria ser conseguido com “a manutenção da fatura salarial em termos nominais” – o que reduziria os salários reais por via da inflação.


Por outro lado, o fundo propunha um aumento da receita fiscal não petrolífera. De acordo com o relatório publicado no final do ano passado, o FMI indicava que Angola poderia criar um imposto sobre o consumo como o IVA. “Se implementado de forma diligente e em devido tempo, um IVA poderia ser uma fonte de receitas mais estável para o Orçamento, reduzindo a dependência das receitas do petróleo e protegendo-o melhor da receita petrolífera”, argumentavam os economistas do FMI.


Ainda no sentido de controlar as finanças públicas, o Estado deveria rever os investimentos públicos previstos, o que implicaria “priorizar” e avaliar cada projeto em curso. E devia ainda ser reduzida a subsidiação dos combustíveis, para reduzir a despesa pública. O governo tem vindo a reduzir de forma progressiva estes subsídios, cuja despesa chegou a atingir 5,9% do PIB em 2013 e deverá ter sido reduzida para 2% do PIB no ano passado. Mas o FMI quer mais esforço e que acabem os subsídios que ainda existem em alguns combustíveis, como o gasóleo ou o querosene, muito utilizados no país.


O histórico angolano Em 2009, quando foi pedido o anterior resgate, as reformas visavam dois importantes objetivos: a restauração da estabilidade macroeconómica e, em segundo lugar, a restauração da credibilidade de Angola em relação aos mercados financeiros. De acordo com o African Economic Outlook de 2010, do Banco Africano de Desenvolvimento, o empréstimo concedido a Angola, por esta altura, era “o maior pacote de financiamento captado por um país africano”, por meio de um programa de ajustamento apoiado pelo FMI. O organismo internacional concedeu então 1400 milhões de dólares, ou seja, o “limite máximo que se podia dar num programa de SBA (stand-by agreement)”. Agora, quatro anos depois de terminar o programa de assistência, Angola volta a pedir ajuda. Os detalhes deste novo empréstimo vão ser acertados durante as reuniões de primavera em Washington e ainda numa visita a Angola.

*Com João d’Espiney e Sofia Martins Santos