Luanda - A sabedoria popular ensina-nos que por mais nublado que um dia aparenta estar, há certezas que aquele mau clima é passageiro, tarde ou cedo o dia há-de clarear. O mau clima não dura para sempre. Esta é a confiança que os Angolanos sempre carregaram nos momentos mais difíceis da sua história. Há uma grande convicção que as grandes limitações que enfrentamos hoje também serão passageiras.

Fonte: Club-k.net

O ano de 2015 foi particularmente difícil para muitos angolanos e esperava-se que o 2016 fosse ligeiramente melhor. Porém, a realidade é que o 2016 está sendo ainda mais difícil. Estamos a passar por situações complicadas que estão acontecendo de forma consecutiva como se de uma punição divina se tratasse. As crises e as dificuldades sucedem-se como fossem as famosas pragas faraónicas retratadas na bíblia:

1. No final de 2015 muitos trabalhadores viram os seus contratos de serviço terminados, muitas empresas fecharam as suas portas. O desemprego é a principal causa da pobreza;

 

2. O mês de Janeiro começou com uma bombástica notícia da subida do preço dos combustíveis para números assustadores. Nos bairros, é fácil notar-se a redução de geradores em serviço quando se verificam cortes de energia.

 

3. As condições do saneamento básico em Luanda davam uma demonstração clara de como os cofres do Estado estavam vazios. Não se conseguiu honrar com compromissos junto das empresas de limpeza e saneamento básico. O lixo invadiu Luanda como se de novos jardins se tratassem;

 

4. O kwanza desvalorizou-se e com ele houve um aumento dos preços dos principais produtos básicos. A vida encareceu e o poder de compra das famílias reduziu para números que se assemelham aos períodos mais difíceis da guerra;

 

5. Depois do término de um surto de catolotolo, eis que reaparece uma doença que se acreditava erradicada do nosso território há muito tempo: a febre-amarela. Com ela surge a saturação das nossas unidades hospitalares e o início de uma situação de terror que não existe na memória no nosso país. Assistimos á uma situação de calamidade que fez muitas vítimas ao ponto das morgues não terem mais espaços para a conservação de cadáveres;

 

6. Quando se começava a respirar de algum alívio em relação ao sufoco provocado pela febre-amarela, eis que surgem as chuvas. Chuvas tão intensas e consecutivas que matam e destroem por quase todo o país. Vemos ruas intransitáveis, mortes, desalojamentos, perdas de bens, frustrações e longas filas de pessoas caminhando por falta de transportes ou devido aos engarrafamentos.

Face a todos estes problemas que se têm enfrentado, o velho adágio “azar não vem só, ou azar não é só óbito” ganhou corpo na boca de muita gente. Espero que Deus tenha misericórdia de nós e que nos livre destas “pragas” e de tanta má sorte.

Como comecei por dizer acima, que por mais nublado o dia aparenta estar, há certezas que há-de clarear. Devemos ter confiança e acreditarmos que os próximo dias serão melhores. Porém, há que tirarmos lições do passado e do presente para que situações como estas sejam minimizadas no futuro. O fraco saneamento básico está custar-nos muitas vidas e algumas pessoas ficarão irremediavelmente limitadas física e psicologicamente devido aos choques que sofreram com as doenças palúdicas. A crise que estamos a viver deve ajudar o país a vencer alguns dos males que têm impedido o seu desenvolvimento. É tempo de deixarmos a vaidade da megalomania cega de querermos impressionar o mundo externo quando a nível interno a maioria do povo não tem o básico para se ter uma vida condigna. Não precisamos de nos comparar com qualquer país ou povo algum no mundo. Essa mania de edificar obras para depois ouvirem-se discursos como “o maior de África, comparável ao que de melhor existe no mundo, dos mais modernos do continente, não se perde nada ao que de melhor existe…” não tem ajudado o nosso processo de desenvolvimento. Tornamo-nos arrogantes e vaidosos na nossa própria miséria, quando a maioria dos cidadãos não vê ou sente o benefício de muitos destes projectos megalómanos. Com humildade podem ser elaborados e implementados pequenos projectos de grande impacto socioeconómico. Aliás as grandes teorias de desenvolvimento comunitário indicam que um dos grandes problemas da ineficiência dos investimentos públicos em muitos países africanos se deve exactamente à noção errónea de “grande é melhor”. Os grandes projectos acarretam vários vícios, várias comissões e complexos esquemas de corrupção. Devemos elaborar pequenos projectos que concorram para o alcance de resultados macro. Não nos podemos dar ao luxo de continuar a desperdiçar dinheiro em projectos falidos ou pouco sustentáveis. O executivo deve implementar projectos onde se promova a ampla participação dos cidadãos na identificação, implementação, monitoria e avaliação.


Os cidadãos sabem melhor o que querem e precisam. A plena participação pode diminuir alguns dos problemas citados acima. Precisamos de promover o nosso desenvolvimento com humildade. As vezes, dá a impressão que queremos provar alguma coisa ao mundo exterior. Não precisamos de dar provas de nada a ninguém. A média do Orçamento Geral do Estado do país nos últimos 10 anos esteve entre os 65 maiores orçamentos de países do mundo. Isto quer dizer que o Estado Angolano habituou-se a trabalhar com muito dinheiro e agora precisa de mudar de paradigma e aprender a gerir os recursos de forma parcimoniosa. O país precisa aprender a trabalhar com pouco dinheiro mas fazer grandes coisas. Os orçamentos de muitos projectos públicos são excessivamente caros mas pouco sustentáveis.

Esta crise deve ajudar-nos a sermos mais realistas com relação aos preços. Existe um mau hábito das pessoas quererem enriquecer de um dia para o outro e, por isso, há excessiva especulação de preços em quase todos os níveis. Muitos produtos chegam a custar três vezes mais do que o seu real valor do mercado, porque as pessoas querem lucros fáceis. Os preços do aluguer de moradias, por exemplo, apesar de ter se ter verificado uma redução, continuam altos. O mesmo acontece com relação aos preços das unidades hoteleiras, restaurantes e locais de lazer em quase todo o país. Os preços dos alimentos não podem continuar a ser tão altos ao ponto da maioria das famílias gastarem quase 65% dos seus rendimentos mensais na alimentação.

Os chefes precisam de exercer a liderança e fazerem-no de forma exemplar, esse já não é mais tempo de chefia mas de liderança. Devemos terminar com os cargos de conveniência e apostar em quadros que podem de facto operar mudanças e ajudar o país a dar os passos que precisa. Tenhamos fé e muita coragem para enfrentar estas “pragas”.