Luanda  - A visita do Presidente Angolano à Província do Moxico, no dia 22 de Junho de 2016, foi uma grande revelação. Há situações concretas que mantiveram-se ocultadas e disfarçadas durante muito tempo, embora sua veracidade tivesse sido da percepção de muita gente. Um proverbio em Umbundo diz o seguinte. “O soi ua linga képia, kimbo ikulandula.” Quer dizer em Português: Não há atalho sem trabalho. Muita parra e pouca uva. Ou seja, não há mal que sempre dure. Pois, a mentira tem pernas curtas.

Fonte: Club-k.net

Na Cidade do Luena, o Presidente Angolano afirmara, em voz alta, de que, o país se encontrava numa situação extremamente difícil; por haver escassez de receitas para importação; por não haver liquidez para contratar e pagar os serviços de especialistas expatriados; por não haver outras fontes de receitas; e que, desde Janeiro de 2016, o Tesouro Nacional deixara de receber receitas da Sonangol, por esta não estar em condições de o fazer. Fim do extracto da afirmação do Presidente Angolano.


Nas minhas reflexões anteriores, ainda deste ano, já tivera afirmado que, o Governo Angolano não estava a dizer a verdade das condições financeiras reais em que o país se encontrava mergulhado. Pois que, desde 2013, os indicadores da «falência económico-financeira» do Estado Angolano já eram evidentes. Tinha sido na mesma altura em que os saques dos Cofres do Estado Angolano atingiram proporções alarmantes. Constatava, no mesmo período, fugas massivas de capitais para o estrangeiro. Passando pelo Portugal, que tornara uma autentica Colónia dos novos capitalistas angolanos; transformando-o em paraíso fiscal de branqueamento de capitais, vindo de Angola.


Recorde-se da pilhagem do Banco Espirito Santo Angolano, cujo capital tivera sido partilhado entre os dirigentes do MPLA, a custa dos Cofres Públicos, através do Banco Nacional de Angola, com receitas do sector petrolífero. O Fundo Soberano Angolano servia de pipeline da drenagem e de escoamento de capitais financeiros ao estrangeiro, com sede em Londres, como plataforma central, na Zona Euro, do Mercado da União Europeia.
No meu artigo do dia 15 de Junho de 2016, intitulado: «O Apogeu do Poder Nepotica», tivera feito a seguinte observação:


“O assalto à Sonangol, pela Isabel dos Santos, tem a intuição de cobrir os buracos nela criada; misturar as contas públicas com as contas da família presidencial; e obter acesso fácil ao mercado ocidental.”

Nesta perspectiva, a maior revelação feita no Luena, que preocupa toda gente, é de que, “desde Janeiro do corrente ano, o Tesouro Nacional deixara de receber receitas da Sonangol, por está não estiver em condições de o fazer.”

Esta afirmação, do Presidente Angolano, pelo volume das receitas do sector petrolífero, que é o pulmão principal da economia angolana, suscita interrogações sérias e preocupantes. Pois, o Presidente não justificou o porque da interrupção brusca das receitas do sector petrolífero, que continua a produzir o crude e a exportá-lo aos mercados internacionais. O que é sabido, por todos, é a baixa do preço do barril do petróleo nos mercados internacionais. Isso, em si, não tem nada a ver com a produção e a produtividade do Sector. O que está em causa é a redução de valores monetários das receitas petrolíferas. Há, sim, a baixa da produtividade em algumas plataformas, cujos custos de produção são elevados, e tenham obrigado as Empresas Operadoras retirar-se. Mesmo esta questão, em causa, nunca foi assumida publicamente pelo Executivo. Em contraste, ter dado indicações fortes da estabilidade do sector petrolífero.


Agora, este dado de cessação de receitas, durante seis meses, coloca-nos numa situação de profunda incerteza. Há três cenários prováveis que podem estar na base desta afirmação: a) encobrir as receitas realizadas durante este período na intuição de vir projectar o mérito da Sra. Isabel dos Santos, no que diz respeito a rentabilidade da Sonangol durante o consulado dela, que acaba de iniciar agora; b) servir-se disso (falta de receitas) de pretexto para o adiamento das eleições gerais de 2017; c) a baixa do preço do barril de petróleo tenha de facto elevado a quantidade de barris mensais para a amortização das Contas elevadíssimas dos Créditos Chineses; noutras palavras, a nossa produtividade mensal tenha sido inferior à quantidade de barris exigidas para a amortização das dívidas durante o período em questão.


O mais intrincado, deste dilema, dos Créditos Chineses, é a falta de transparência e de informações devidas aos Deputados no sentido de poder exercer sua função fiscalizadora e de controlo. Os Deputados e o Tribunal de Contas não sabem os teores e as modalidades dos Tratados celebrados entre as partes, que pudessem facultar dados fiáveis para agir com maior propriedade e responsabilidade requeridas, como membros dos Órgãos de Soberania do Estado. Nas circunstâncias actuais, em que os legisladores se encontram, sem acesso à informação sobre os Contractos celebrados, fica-nos bastante difícil fazer uma avaliação ponderada e objectiva do contexto acima referido. Obrigando-nos a fazer pesquisas e análises subtis e profundas sobre o desempenho do Governo. O que leva o Poder Executivo a considerar os Deputados da Oposição de «advogados do diabo», encarregados de levantar sempre objecções às propostas de canonização.

 

Este quadro, de interrupções de receitas petrolíferas ao Tesouro Nacional, compromete gravemente a politica, que tem sido propalada, da diversificação da economia. Pois que, a diversificação da economia só é viável com recursos financeiros. Mesmo que seja um Programa de Resgate do Fundo Monetário Internacional, exigirá um mínimo de receitas do mercado interno para servir de base de Créditos estrangeiros. A não ser que seja uma forma indirecta de facilitar ou simular o repatriamento de capitais angolanos, que se encontram sedeados no estrangeiro. O que seria bem-vindo, desde que sua aplicação na economia nacional sirva os interesses do povo angolano. Alias, eu já tivera feito uma alusão, em termos de sugestão, ao FMI para a persuasão dos novos capitalistas angolanos, optar-se pelo repatriamento dos seus capitais ao País, a fim de sustentar o Programa da restruturação da economia.

 

Nesta lógica, tive a impressão de que, a deslocação do Presidente Angolano à Cidade do Luena tivesse dois objectivos essenciais: a) transmitir palavras de apreço ao povo do Moxico, que o esperava em massa no Aeroporto, tendo os seus anseios e aspirações profundas para expressar directamente junto do Chefe do Estado Angolano. Infelizmente, isso não aconteceu, nem sequer uma palavra foi dita. b) Sondar o mercado e assegurar os investimentos privados, na produção de arroz, de madeira, do mel, da mandioqueira, do milho, do massango, do feijão, da jinguba, do peixe, da criação do animal, da fauna, do turismo e dos recursos minerais.

 


Para ter uma mínima ideia das potencialidades económicas da Província, só o Município de Alto Zambeze (Kazombo) possui mais de treze minerais estratégicos. O Corredor entre Kangamba, Lumbala Nguimbo e a Orla do Rio Kuando, a título de exemplo, está cheio de filões de rochas de diamantes e das jazidas imensas de diversos minerais importantes. Alias, eu sou nato desta área, que a conhece muitíssimo bem, como palma da mão. De facto, a Província do Moxico é um grande celeireiro, um autentico Paraíso, com recursos hídricos abundantes, ocupando uma posição chave, na Região da Africa Austral e da Africa Central.


Numa conversa recente com um dirigente histórico do MPLA, Membro do Bureau Politico, do Comité Central do Partido, dizia-me o seguinte:

 

A diversificação da economia, do sector agrícola, só será sucedida se for feita com envolvimento massivo das comunidades locais e dos fazendeiros que se radicam no campo e dedicam essencialmente à Agricultura, como sua actividade primordial. O Governo deve apenas criar condições técnicas, financeiras e expertise para auxiliar e orientar os agricultores. Dando-lhes conhecimentos técnicos, alfaias, fertilizantes, sementes, infra-estruturas, meios de transporte e o acesso aos mercados internos e externos, a fim da comercialização dos seus produtos do campo. Infelizmente, o que me transparece, dizia ele, é estabelecer o monopólio económico sobre o sector agrícola pelos detentores dos poderes políticos e financeiros. Se isso concretizar-se, então não resultará em nada, desabafava ele. Fim da citação.


Para dizer que, no seio do MPLA há muitos patriotas, com ideias lucidas e válidas. Só que, seu patriotismo está amordaçado; precisando de se libertar do jugo neocolonial. Como é do conhecimento geral, a cultura política do Poder instituído reside no Conceito filosófico, que aposta-se na «formação da classe burguesa» dominante, capaz de impor sua hegemonia socioeconómica sobre a sociedade. Em parte, esta Doutrina do Capitalismo selvagem, prevalecente no País, explica a inclinação havida, durante todo tempo, ao sector petrolífero, sem aplicação das suas receitas na agricultura e noutros ramos da economia. Porém, este Conceito, acima referido, não tem hipótese de vincar, sobretudo com a actual crise do crude, agravado agora pelo Referendo malsucedido do Reino Unido, que terá consequências drásticas sobre a União Europeia, cujo espaço é um dos maiores mercados internacionais, com taxa de consumo do petróleo muito elevado.

 

Na verdade, esta situação, da separação do Reino Unido do restante da Europa tem implicações negativas sobre Angola, que precisa da «moeda euro estável» para mitigar a escassez do dólar norte-americano no nosso mercado interno. Alias, na última visita à Pequim, o Presidente Angolano tivera celebrado um Acordo Monetário, com fim de introduzir o Yuan-Chinês no mercado angolano, como alternativa ao USD, nas transacções comerciais. O que parece, na prática, este desiderato, não tenha dado certo, devido a desvalorização gradual do Yuan-Chinês e do abrandamento da Economia Chinesa, que parecia robusta e crescente. A própria, Moeda Kwanza, entrou em deslize, em queda livre – devido a má-gestão da economia.

 

Por isso, a persistência no Conceito da «criação da classe burguesa», como estratégia, inibirá a dinâmica da diversificação da economia angolana. Alias, esta política, assente na promoção da grande burguesia, é caduca e é já combatida ferozmente pelos grandes multibilionários, como Candidato Republicano, Donaldo Trump, da extrema-direita. Mesmo Bernie Sanders, Senador Democrata, do Centro-Esquerda, opõe-se resolutamente aos grandes multinacionais, que apenas sugam os recursos públicos e empobrecem as forças produtivas e a classe média. Portanto, a crise actual, em que Angola está mergulhada, é o fruto desta política egocentrista e antipatriótica.

 


Em síntese, penso que, somente através das reformas profundas da doutrina politica, assente na integração global das forças produtivas e na congregação de todas sinergias e todos estratos sociais, permitirá um processo sustentável da restruturação e da diversificação da economia do país. O que implicará romper com as desigualdades sociais; com a cultura da insensibilidade e da indiferença; com a cultura de corrupção; e com a cultura da partidarização da sociedade. O que representa um grande desafio, que requer uma mudança profunda de mentalidade, de comportamento e de actuação. Exige, sobretudo, a credibilidade e a legitimidade do poder politico, que derivam do espirito altruísta, da honestidade e da confiança mútua. Pelos vistos, parece que, o Presidente Angolano já não confia ninguém fora dos seus filhos, que também lhes faltam a coesão, a solidariedade e os laços fraternais sólidos e patrióticos.

 

Enfim, na qualidade de nacionalista, que combateu o colonialismo português, com a espingarda na mão, este quadro sombrio, acima exposto, entristece-me, ofende a minha consciência patriótica e enche o meu coração de lagrimas. Por pertencer a uma geração que pouco fizera para deixar um legado digno e respeitável, assente na liberdade, na honestidade e na igualdade de direitos. Hoje, pelas ruas das nossas cidades e pelas aldeias recônditas das nossas terras de infância, somos vistos como Mais Velhos que lutaram somente para enriquecer-se a si próprios, e transformar-se em opressores do seu próprio povo, que reclamavam de ter liberto do jugo colonial português. Quo vadis Angola?


Luanda, 28 de Junho de 2016