Luanda  - Esta discussão em torno de qual será a melhor colocação institucional do BNA na paisagem económico-financeira do País e muito particularmente no seu relacionamento com o "Nguvulu", não é de hoje, nem é de ontem. 

Fonte: Opals

Estamos a viver um momento em que olhos dos angolanos e dos estrangeiros estão cada vez mais virados para o que se passa nos corredores do imponente edifício que nos foi legado pela administração portuguesa.  Possivelmente, o mais belo de toda a arquitectura colonial que herdámos.


O maior ex-libris da antiga marginal colonial que, como a palanca negra, virou símbolo de todo país dentro e fora das nossas fronteiras.

 

Se no tempo das "vacas gordas" os angolanos e os parceiros estrangeiros viviam entusiasticamente com os olhos postos nos portos e aeroportos a espera dos contentores, hoje as "vacas" emagreceram de tal forma que já nos contentamos em apreciar apenas o edifício do BNA a aguardar pelo próximo comunicado sobre a venda de divisas com a esperança de que o Dr. Valter Filipe faça algum milagre parecido com o dos pães e dos peixes.
O assunto da independência do BNA voltou novamente à baila, na sequência do recente esclarecimento feito pelo Presidente da República que agora é o único Titular do Poder Executivo, mas que na altura deste pronunciamento, estava apenas a envergar as vestes de líder partidário, considerando as circunstâncias.

 

Para uma pessoa que concentra tanto poder e ao longo de tantos anos consecutivos, acreditamos que não seja muito fácil fazer automaticamente esta separação de águas, sendo ainda mais difícil pensar e agir apenas numa ou noutra condição.

Isto faz-nos lembrar um pouco as pessoas que são realmente bilingues de nascença ou mesmo trilingues, ficando por saber depois em que língua é que elas pensam ou falam com os seus botões na hora das reflexões mais profundas.


Por associação de ideias e com base na "teoria do nexo da casualidade", somos tentados a pensar que este esclarecimento presidencial tenha resultado de uma acalorada discussão mediática de que fomos participantes, onde aqui o escriba de serviço, defendeu a ideia segundo a qual o BNA também faz parte do Executivo.

Em abono da verdade, ou seja, formalmente, não faz e agora, o que acontece pela primeira vez nestes 40 anos de independência, até já tem dignidade constitucional (CRA-2010), onde figura com o numero 100 (artº.), que dá sempre para fazer aqueles trocadilhos entre o cem e o sem.

O BNA consta pois do referido texto como sendo "o banco central e emissor [que] assegura a preservação do valor da moeda nacional e participa na definição das políticas monetária, financeira e cambial."
A CRA remete-nos depois para a lei ordinária, onde o BNA é actualmente "uma pessoa colectiva de direito público, dotada de autonomia administrativa, financeira e patrimonial".

Mais do que isso, a lei esclarece-nos de forma inequívoca, que toda a intervenção no BNA em matéria de condução, execução, acompanhamento e controlo das políticas monetária, financeira, cambial e de crédito terá de ser feita necessariamente no âmbito da política económica do Poder Executivo.

Só ao nível da política cambial é que o BNA é considerado a autoridade do país e com competências ao nível da sua definição, mas mesmo assim, também tudo também é feito na órbita/tutela do Poder Executivo. Em nenhum momento da legislação em vigôr (pós CRA-2010), note-se, conseguimos divisar a palavra independente como referência da actuação do BNA em qualquer um dos domínios/competências da sua intervenção.


Na comparação feita com a anterior lei que balizava a actuação do Banco Central e que remonta ano de 1997, verificamos, curiosamente, que o BNA perdeu bastante da autonomia que tinha em relação Executivo, muita mesma, apesar de actualmente lhe ter sido conferida a tal dignidade constitucional que, pelos vistos, parece ser só mesmo para inglês ver.

 

A tal ponto a dependência do BNA do Governo se estreitou, que o seu Governador hoje pode ser a qualquer altura exonerado pelo Chefe do Executivo, quando no passado isto só poderia acontecer por justa causa.
Julgamos conhecer mais ou menos bem as razões históricas que levaram a esta "involução".

 

Há outros elementos que resultam desta comparação e que atestam como é que hoje na prática o BNA acaba mesmo por fazer parte do Executivo, por mais que nos queiram convencer do contrário com recurso aos aspectos mais cosméticos das normas vigentes.

Na Constituição anotada pelos juristas Raul Araújo e Elisa Rangel podemos ler que a independência em causa, significa que o Banco Central "actua como consultor, mas não toma parte nas decisões relativas a politicas governamentais, nem está sujeito a poderes de superintendência".

A presença do Governador nas reuniões do Executivo continua a falar bastante bem do estatuto do nosso BNA.

Pela primeira vez na história da banca angolana, segundo julgo saber/até onde vai a minha memória, o nosso sistema financeiro conta com um Provedor de Serviços e Produtos Financeiros (PSPF) numa iniciativa do actual Governador do BNA, que para o efeito escolheu o jurista Domingos das Neves (DN), uma conhecida figura do nosso espaço público mediático.

Pela primeira vez também, e aqui a opinião já é da minha exclusiva responsabilidade, o Estado vai buscar a este espaço uma figura da sociedade civil de reconhecida independência de pensamento.


O Domingos das Neves (DN) foi "catapultado" para o espaço público pela Emissora Católica de Angola, tendo com ele partilhado nos últimos quatro anos a Revista de Imprensa que está no ar todas as segundas-feiras, desde que Justino Pinto de Andrade a criou como um programa de opinião, tendo sido durante cerca de dez anos consecutivos o seu comentarista residente.


Ao DN gostava naturalmente de lhe desejar os melhores sucessos nas suas novas/nobres funções, numa altura em que uma das grandes preocupações dos clientes dos bancos é o acesso ao dinheiro que têm nas suas contas em moeda estrangeira.

Aqui está pois uma questão que gostaríamos que o Provedor se encarregasse de dar o devido tratamento, pois em causa estão direitos dos clientes, que a Banca comercial não está a respeitar.


Ps-Lembro-me que há uns anos atrás, antes de ser "expulso" da RNA e ainda na vigência do anterior PCA, tentei convencer a direcção da emissora oficial a criar também o cargo de Provedor dos Ouvintes, tendo a minha sugestão conhecido o caminho do ralo, onde ainda se deverá encontrar.

In “O PAÍS”/08-07-2016