Luanda - Declaração Política do Presidente do Grupo Parlamentar da UNITA lida hoje na plenária para aprovação do OGE 2016 revisto

Fonte: Club-k.net

DECLARAÇÃO POLÍTICA
(15 de Agosto de 2016)

Sua Excelência Presidente da Assembleia Nacional
Membros da Mesa, Dignos Deputados,
Auxiliares do Titular do Poder Executivo,
Caros Jornalistas,
Angolanas e Angolanos


Estamos aqui hoje no segundo ano consecutivo, para apreciar e votar um Orçamento Geral do Estado revisto. Era óbvia a necessidade do governo ter de corrigir o Orçamento aprovado para 2016! Já em Novembro do ano passado, no início do debate para a aprovação do OGE para 2016 tornou-se evidente que as previsões estavam erradas, que as contas públicas iriam registar um deficit de 781,2 biliões de kwanzas, tendo o governo feito ouvidos de mercador a todas as vozes que aconselharam uma previsão mais realista.

Tal como o ano passado estamos a fazer uma revisão do OGE, no último quadrimestre do ano, quando aflito descobre que já não dá mais para esconder que estamos perante uma enorme derrapagem nas contas públicas.

E porquê esta derrapagem? Por causa da enorme teimosia e direi mesmo insensibilidade, por não ouvir os conselhos e as inúmeras críticas responsáveis e construtivas efectuadas na altura por nós, Grupo Parlamentar da UNITA, pelos outros Grupos Parlamentares dos Partidos da Oposição bem como pela sociedade civil, que publicou inúmeros alertas.

Fomos chamando a atenção para o irrealismo e excesso de optimismo nas previsões orçamentais. Avisamos sempre que a enorme dependência ao petróleo traria no futuro grandes problemas à economia nacional. Que a inflação galopante traria um aumento das despesas públicas. Aconselhamos vezes sem conta da necessidade de se diversificar de facto a economia.

Alertamos sobre os perigos do excessivo endividamento, principalmente à China e à pouca qualidade das obras, em geral, que estavam e que continuam a ser efectuadas. Porque o que se constata é de facto de em orçamentos sucessivos, voltarmos a alocar verbas para obras já executadas anteriormente.

Reiteradas vezes avisamos dos grandes prejuízos que iriam trazer ao país a elevada corrupção, a falta de transparência na gestão da coisa pública, a falta de fiscalização e o cabritismo, o despesismo e esbanjamento de dinheiros públicos. Males e vícios permanentes que encontramos por todo o lado, com incidências extremamente negativas na economia nacional e na vida de todos nós. Males que infelizmente prevalecem!

Perguntamos o que foi feito para corrigir estes males? Quanto a nós quase nada!

Agora as provas estão aqui, neste vosso Orçamento Geral do Estado, revisto. Com imensos danos: não nos devemos esquecer do preço pago em vidas nos primeiros meses deste ano, com uma crise sem precedentes a atingir o sector da saúde, onde contínua a permanecer prioritário, proceder a investimentos substanciais, em formação, em equipamento, em medicamentos, para não voltarmos a viver o mesmo drama com número de mortes que o governo nem teve a coragem de condividir publicamente.

Tínhamos razão quando votamos contra os vossos orçamentos. A sua execução só trouxe desgraça e mais pobreza ao nosso povo e retrocesso na economia do país. O poder de compra de qualquer chefe de família degrada-se todos os dias. O desemprego cresce e os despedimentos nas empresas são diários.

De facto é o que compreendemos ao ler este OGE: o país recua cada vez mais nos indicadores económicos, financeiros e sociais. Os senhores mesmo o escreveram, mas por falta de coragem, atribuem tudo à baixa do barril do petróleo! Não meus senhores: vejam bem. Como estão os empresários angolanos, com vocação e desempenho demostrados? Falidos, na sua maioria por culpa de incumprimentos do Estado! Os intermediários do estado cobram comissões leoninas para colocarem as empresas na lista de pagamentos da dívida pública... e não são combatidos. Queremos diversificar a economia, com quem? Com a entrega dos sectores vitais aos estrangeiros ou estamos a pensar que os ministros/empresários, os governantes empresários à custa do erário publico nos vão levar a algum lugar? É prioritário senhores governantes, potenciar a classe empresarial nacional e pagar-lhes a dívida pública, pois estes fundos virão dinamizar a economia, porque serão reinvestidos internamente e produzirão algum alívio e alguma riqueza a quem se encontra num total sufoco.

Temos hoje os bancos com menos capacidade de financiamento e menos credibilidade no país e no estrangeiro. Muito pelo modelo de funcionamento e de propriedade adoptados, atirando-os para as listas vermelhas de classificação internacional. Urge abrir à sociedade a oportunidade de qualquer um que seja competente, poder ter sucesso e por consequência contribuir com o seu quinhão, para a riqueza e engrandecimento do nosso país. Continuamos muito arreigados aos partidos, com carreiras excessivamente ligadas à confiança política; com modelos de sucesso extremamente perigosos a repetirem-se na nossa sociedade, com “bajus” catapultados ao topo de carreiras, apenas por falar bem do chefe; invertendo valores para a juventude e empobrecendo o engenho e a arte!

Em resumo, os problemas multiplicaram-se em todos os domínios da vida nacional!
E o problema é de quem? Mais de 40 anos depois, há quem ainda atribua ao colonialismo, a caminho dos 20 anos depois outros continuam sem qualquer pudor a atribuir à guerra, esquecendo-se que existem hoje famílias em estado tão ou mais desesperado para garantir a sua sobrevivência, do que naqueles fatídicos anos!

É preciso reconhecer que hoje os enormes problemas que temos, não são justificados essencialmente na baixa do preço do barril de petróleo! Os culpados estão entre nós. Têm nome e rosto. Os culpados são a nossa elite predadora: que assalta os pilares da soberania; que mistura os negócios do estado com os seus negócios privados e obtém o enriquecimento do dia para a noite; que num orçamento de uma obra pública de 100 é capaz de desviar 80 e não permite a fiscalização do que daí resulta; aqueles que despedem angolanos e contratam estrangeiros, ainda estagiários mas pagos principescamente, para cuidarem de áreas estratégicas a que os angolanos não podem ter acesso!

O Titular do Poder Executivo e a sua equipa de colaboradores, a que a Constituição chama Auxiliares deveriam fazer muito mais, perante as potencialidades com que a natureza dotou o nosso país, que são muitas! Pensamos que os Senhores estão a fazer muito pouco, perante os orçamentos bilionários que têm tido ao dispor. Os senhores são os responsáveis por este país estar sem rumo: nem progresso e muito menos desenvolvimento para a população e as empresas deste nosso país; aos olhos de toda a gente, nem produzir mais, muito menos distribuir melhor!

E o slogan agora qual será? Trabalhar com muito pouco para obter muito mais? Faer mais com menos? E quem acreditará neste tipo de mensagem? Os gabinetes de acção e propaganda que consomem milhões e controlam monopólios da comunicação social existente? Já não resulta, porque os lares e até a classe média do nosso país estão a ficar destruídos!

A dita diversificação também não se revê neste OGE. Vamos a uma análise mais técnica:

Nos termos da Constituição, compete a Assembleia Nacional aprovar o Orçamento Geral do Estado (artigo 161º al.e) e fiscalizar a Conta Geral do Estado (artigo 16º alínea b).

Ora, por força do acórdão do Tribunal Constitucional, o poder legislativo encontra-se amordaçado do seu papel de representante do povo (representante dos dinheiros públicos na globalidade). A Assembleia Nacional começa a considerar inconstitucional o pleno exercício de fiscalização e ao deputado são sonegados direitos e poderes, cujas proibições têm como resultado o não incomodar os violadores da coisa pública e da Lei.

Apesar do desempenho económico perpectivado ainda ser considerado positivo (1,1%), o nível de eficácia e eficiência dos gastos públicos em nosso entender é baixo.

Olhando para este OGE, verificamos que a função Defesa, Segurança e Ordem Interna é corresponde a 13,36% do total, valor superior a de toda a actividade económica que é de 12,29%. Também a defesa e segurança continua a ser superior a dotação dos sectores da educação e saúde que é de 10,90%! É curioso que esta mesma percentagem de 10,90% é atribuída a protecção social (muito gostaríamos de ir fiscalizar e avalizar da eficácia e da transparência aplicadas a este bolo)! Aqui chamamos a atenção para o uso incorrecto que se está a dar às nossas Forças Armadas, envolvidas em demolições, que não são o objecto da sua missão. Também urge responsabilizar o autor do disparo contra o jovem Rufino António, que não deve ser protegido, em nome da justiça!

Também verificamos que continua a existir uma alínea, no Ministério do Interior com verba muito elevada (2.505.962.862,00) para a Defesa Civil, corpo ilegal e actualmente inexistente à luz da Lei. Urge esclarecer esta questão. A mesma alínea consta nas Reservas Orçamentais – Defesa Civil com uma outra dotação de 17.400.000.000.00 kzs! Também aqui carecemos de explicações claras. São estas milícias ilegais que vão até ao ponto de atacarem deputados, que depois a Assembleia não investiga porque considera inconstitucional!

Pelos números atrás indicados e a título de exemplo, gostaríamos de saber: qual o impacto deste orçamento revisto nas áreas de Emprego? É que se assiste a uma desarticulação das políticas promotoras de emprego, envolvendo inúmeras instituições da administração direta e indireta, tais como o Ministério da Justiça, Ministério da Economia, Ministério do Emprego, Ministério do Comercio, Ministério das Pescas, Ministério da agricultura, Ministério da Família e Promoção da Mulher, assistindo-se também a uma desarticulação idêntica nos mesmo ministérios ao combate ao subemprego.

No caso da Agricultura e Segurança Alimentar, uma área muito estratégica no nosso país, apetece direccionar ao Exmo Ministro algumas perguntas: quais os indicadores de produção previstos por cultura? Que incentivos reais aos agricultores, quais os níveis de auto emprego na agricultura familiar e emprego na agroindústria? Qual a produção de feijão do ano agrícola de 2015 ou mesmo no primeiro semestre deste ano e qual a estimativa para 2017? Quanto à segurança alimentar, o Sr. Ministro da Agricultura sabe dizer-nos qual é o nível da produção nacional desta ou daquela cultura agrícola, indicadores de procura ou de acesso aos principais mercados desses produtos, com as estradas que temos? Quais os custos de intermediação? E se com o orçamento que lhe é atribuído sente que pode ter algum tipo de eficácia e de resultados? 0,39 % do OGE são muito poucos e espero que desta vez, sr Ministro não nos diga que está satisfeito, como o fez no passado, quando quisemos solicitar o aumento da verba atribuída ao seu Ministério.

É persistente a descoordenação das políticas públicas entre os departamentos ministeriais. Dou exemplos: o Programa de Fomento da Actividade Agrícola possui dotação orçamental nos Ministérios da Economia e da Agricultura; o Programa de de Desenvolvimento da Actividade comercial e de Infraestruturas Básicas possui dotação orçamental nos Ministérios da Economia e do Comércio; o Programa Água para Todos possui dotação orçamental nos Ministérios da Energia e Águas e por mais que possa parecer surrealista do Ministério do Turismo, entre outros programas com a mesma nominação cujos ministérios receberão dotações para concorrerem num vulgar DESPESISMO.

Tal como vem mencionado no relatório de fundamentação, a importação dos bens da cesta básica no 1º semestre sofreu uma redução de 40% comparado ao período homologo do ano passado; se entretanto olharmos para a insipiente produção interna, fruto da desastrosa execução do programa de diversificação da economia, percebemos o nível de insegurança alimentar que grassa o país, trazendo fome para os lares dos angolanos , o que representa uma ameaça à segurança nacional (que deverá merecer atenção adequada).

No sector das Infraestrutura e Transportes – perguntamos qual o nível de emprego de cidadãos nacionais? Quais as medidas de combate ao cartelismo no sector de infraestruturas? Como é possível haver concorrência quando o Executivo primou pelo monopólio do mercado de fiscalização às infraestruturas públicas, sendo esse mesmo fiscal (DAR CONSULTING) também o projectista da obra?

Esta proposta de OGE indica-nos que no mercado primário de divisas, a taxa de depreciação da moeda nacional é de 47% em relação ao 1º semestre do ano passado. Gostaríamos de saber qual a taxa de depreciação da moeda nacional no mercado informal também chamada de economia real? Sim porque todos os bens de primeira necessidade e os outros também, estão afectados nos seus preços pela depreciação do kwanza , bem como pela super-inflação do dólar.

Ficamos perplexos com alguns indicadores constantes no relatório de fundamentação e pedimos ao Poder Executivo que nos convidem para visitar os polos comerciais e industriais nas províncias do Uíge, Cuanza Norte e Malange assim como os propagados projectos de agricultura empresarial e de desenvolvimento industrial sedeadas em Benguela, Bié, Huambo e Huíla e quantos empregos estáveis criaram?

Reconhecemos que a consolidação orçamental e a diminuição da dívida pública são essenciais, mas, urge fiscalizar e reduzir a despesa onde ela é desnecessária ou exorbitante, para isso precisamos auditar os programas de financiamento público, renegociar contratos e dívidas dos sectores de infraestruturas (construção, transporte e energia e águas); reestruturar o sector empresarial público e consolidar os seus fluxos financeiros; reduzir as consultorias com mão de obra não residente, entre outras medidas de contenção das despesas.

A criação e implementação de novos paradigmas de regulação, que obedeçam a uma política de redução dos preços de bens e serviços essenciais, impõe-se imediata, por intermédio da conjugação de mecanismos de intervenção directa.

A presente proposta perpetua a violação aos princípios da unidade, universalidade e da publicidade por falta de informação quanto a identificação de todas as pessoas que beneficiam de receitas públicas (artigo 1º da lei –Quadro do OGE) ao omitir as dotações orçamentais do sector público administrativo (Institutos Públicos) e do sector empresarial público. É altura do OGE vir também dotado, com rigor, do desempenho das empresas do sector público. Impõem-se algumas perguntas: Qual o balanço real da ZEE? Quanto foi investido? Quais os resultados líquidos do seu funcionamento? A quem pertencem hoje todas essas empresas criadas com fundos públicos e hoje algumas a serem vendidas? Quem as está a comprar e a que preços? Quais os resultados reais do fundo soberano? Que activos detém hoje e onde se encontram? Porque o que tivemos foi uma acção de marketing sem qualquer fundamentação sustentada em relatórios com balanços financeiros. Qual a real situação financeira da Sonangol? Qual o seu real estado antes da actual transição de administração? A Assembleia Nacional respondeu ao Grupo Parlamentar da UNITA, considerando inconstitucional a Comissão Parlamentar de Inquérito por nós solicitada. Teríamos prestado um relevante serviço público, ao realizá-la, pois são imensas as indicações de praticas de corrupção, nepotismo, peculato, enriquecimento ilícito, entre outras ilicitudes.

A Supervisão ao Sector Empresarial Público, deve vir acompanhado de incentivos aos gestores cumpridores, bem como de sanções aqueles que provadamente incorrerem em más praticas na gestão do bem público, ambas devidamente publicitadas, como pedagogia.

Um outro aspecto não menos importante para a saída da crise: um rigoroso controlo da posição orçamental requer que o Executivo apresente informação financeira transparente e comparável; que seja regularmente monitorizada e analisada. Isto de forma a assegurar que os objectivos orçamentais são cumpridos e que são tomadas medidas para corrigir excessos de despesa, de forma atempada, para isso é necessário que haja entre outras medidas, a responsabilização (política, disciplinar, civil e penal) dos dirigentes das unidades orçamentais tal como previsto nas regras de execução orçamental em vigor, sob pena de nunca atingirmos objectivo no nosso horizonte. Estamos convictos que a corrupção é mais danosa do que a baixa do barril de petróleo.

Por fim algumas chamadas de atenção ao facto de este OGE nada trazer quanto ao real valor da dívida pública, que tudo indica já ter ultrapassado os limites permitidos pela Lei. Também o OGE nada diz quanto aos reais valores do Kwanza em relação ao dólar, procurando esconder as debilidades da nossa realidade.

Muito obrigado pela atenção merecida.

Luanda, aos 15 de Agosto de 2016

O Presidente do Grupo Parlamentar da UNITA

Adalberto Costa Júnior