Luanda  - Considero que o debate sobre questões eleitorais, na sua plenitude tem de ser permanente, inclusivo e construtivo; mas, só é útil, em países dirigidos por elites decididas a aprofundar a sua democracia, se procurar estabelecer, em primeira instância, consensos entre as forças politicas sobre uma matéria de natureza fracturante; sobretudo, no nosso continente porque as eleições visam, acima de tudo, a substituição de uns por outros, e, no caso angolano, a mudança para a alternância política por via democrática.

Fonte: Club-k.net

De facto, existem países africanos que fizeram progressos consideráveis em matéria de gestão eleitoral, como é o caso da República da África do Sul que realizou recentemente eleições locais, sem turbulência e sem contestação em que o ANC saiu fragilizado. Refira-se também o caso do Senegal, de Cabo Verde e do Botswana para citar apenas estes países que têm realizado regularmente eleições gerais que têm conduzido à alternância política, geridos e conduzidos por órgãos eleitorais, estabelecidos por consenso entre os actores políticos.

Para estes países, em que os árbitros não interferem na gestão eleitoral, impedidos, naturalmente, por imperativos de ordem constitucional de serem também jogadores, o processo eleitoral deixou de ser um factor de conflitualidade, gerador de crises cíclicas e de desconfianças endémicas. De facto, e a prática assim nos ensina, e tem-se verificado que quando as lideranças politicas interferem em processos eleitorais, querendo ser árbitro e jogador ao mesmo tempo, mergulham os respectivos países num ambiente de crise, como ocorre actualmente na República Democrática do Congo e no Burundi.

Do ponto de vista constitucional, a lei mãe angolana consagra fundamentos importantes para a construção do processo democrático, ainda teórico; pois, a prática, como critério da verdade, indica que se tem ainda um longo e sinuoso caminho a percorrer para se atingir esse objectivo consagrado por lei. No que diz respeito a administração eleitoral, a Constituição angolana é demasiado clara sobre este assunto. Consagra o principio de que os processos eleitorais são organizados por órgãos de administração eleitoral independente, cuja estrutura, funcionamento, composição e competências são definidos por lei.

De facto, a lei orgânica sobre a Organização e Funcionamento da CNE no seu artigo 3, diz, sem ambiguidades, que “a CNE, nos termos do artigo 107 da Constituição da República de Angola, é um órgão independente que organiza, executa, coordena e conduz os processos eleitorais”. O que quer dizer, que toda a interferência, venha ela de onde vier, e de quem quer que seja, no processo de organização e execução, cria mal entendidos, desencontros, desconfianças e tensão política que pode degenerar em conflitos, como ocorre em muitos países africanos.

Se houver vontade política, respeito aos princípios da Constituição e a lei que rege os processos eleitorais, pode-se ter em 2017 eleições livres, justas, credíveis e transparentes. Nesta perspetiva, tem de se dar poder a Comissão Nacional Eleitoral. É perigoso esvaziá-la das suas funções legitimas, como esta a acontecer neste preciso momento; o que indicia má fé e fraude processual. Ainda vamos a tempo para inverter este quadro. Se estes pressupostos forem atingidos, os processos eleitorais no nosso país vão se transformar em elemento catalisador, capaz de proporcionar credibilidade, confiança entre os angolanos e estabilidade para o processo de transição que se avizinha.

Sublinhe-se que a prática eleitoral de qualquer país, permite avaliar o grau de democraticidade do respectivo sistema político. No caso angolano, tem de haver bastante vontade política para aceitar os erros e tirarem-se ilações dos processos eleitorais anteriores que não foram de forma nenhuma exemplares. Deve-se ter a capacidade de corrigir tudo o que foi negativo. Um processo eleitoral fraudulento, cria um ambiente de conflituosidade e enfraquece o próprio processo democrático.

Alcides Sakala
Deputado