Luanda - Um tanto quanto por critério subjectivo, a realização da V Conferência de Advogados, na minha qualidade de membro da classe, foi o facto dominante da quinzena. Ainda mais quando realizada na fresca capital da Huila, a cidade do Lubango, com todos os seus pitorescos ícones; desde humanos, gustativos e naturais.

Fonte: facebook

Diferentemente da IV Conferência de Advogados, que teve lugar no Huambo, em 2013, em que intervim em painéis relacionados com as normas e violações flagrantes dos direitos fundamentais, ausente por períodos prolongados do país e curioso em aperceber-me da evolução das coisas, no pensamento dos preletores e dos colegas de profissão ao longo desses anos, limitei-me, desta vez, a tirar apontamentos.


Num primeiro apontamento, anotei que na estrutura do primeiro painel, justamente a que tratava da matéria dos direitos fundamentais, área que muito me toca como especialidade profissional e como interventor cívico-político que sou, havia algo de positivo, a saber, a promoção de um debate contraditório. Nele pontificavam, de forma positiva, de um lado, Luís Mota Liz (ML), Procurador-Geral Adjunto da República, como defensor do “sistema”, insistindo na necessidade de “perdoar” o que considera apenas insuficiências, e, do outro lado, os docente universitário Fernando Macedo (FM) e o jornalista Reginaldo Silva (RS), inconformados, de forma geral, com as incompatibilidades reiteradas das práticas de agentes público-políticos em relação aos dispositivos de um proclamado Estado democrático e de direito. Tudo parecia ir ao encontro de uma aparente maior cedência do regime que por tantas vezes nem perdeu tempo com subtilezas, no sentido de controlar e ditar as suas “ordens superiores” na área da Justiça e do Direito. Cedência que, aliás, se vai notando também na área do contraditório, na comunicação social, como ali mesmo o sublinhou o sénior e experimentado jornalista RG.

 

Diria que a boa organização da Conferência permitiu uma excelente discussão sobre as matérias agendadas, abordando, contudo, muito mais os aspectos teóricos dos que os práticos, que existem em abundância e em curso. Basta lembrar os casos escandalosos do processo 15+2 e as correntes demolições de casas de populações de forma abusiva e sobretudo desumana, com a participação superiormente orientada do exército, apenas abordados “en passant”, quando deveriam merecer uma atenção especial, para permitir a audição da justificação dos representantes da Procuradoria-Geral da República. Se houve uma observação pertinente, neste sentido, foi a do prelector FM, ao chamar atenção que os operadores do Direito, especialmente os advogados, não deveriam continuar a perder a oportunidade histórica de prestarem a sua contribuição activa para a construção de um verdadeiro Estado Democrático e de Direito.


Escasso o espaço e o tempo, meus apontamentos na Conferência devem voar para o quarto e último painel, onde os advogados presentes foram presenteados com uma interessante panorâmica, também do tipo contraditório, sobre o actual pensamento angolano, em relação à necessidade premente da “diversificação da economia”. Minha nota: um recente texto meu, aqui, intitulado “Do monopólio petrolífero ao monopólio na diversificação” foi perfeitamente corroborado. Particularmente, José Severino, dirigente associativo no ramo empresarial que actuava como prelector, falou da perigosa apetência pelos latifúndios (que, dizia ele, constituíram o último buraco em que colonialismo se enterrou) em vez de se priorizar a agricultura familiar do tipo tradicional. Sem serem citados nomes, falou-se do punhado de endinheirados que investem lá fora, aos magotes, quando deviam, ao menos, trazer para cá esse dinheiro, para aqui ser investido, sem mais questionamentos, para fazer crescer a economia e o emprego consequente, entre os jovens; que o perdem também perante a “invasão” chinesa, que com as suas reconhecidas vantagens tinha de ser profundamente racionalizada. Não faltou a alusão à construção de estradas descartáveis e obras grandiosas entregues, de bandeja, a determinada gente (de família, acrescento eu) sem concursos públicos, sem nada.


De tantas irregularidades lembradas, fiquei a pensar no que seria Angola se se comparasse o nosso sistema judicial, este que blinda lindamente os do Executivo, ao sistema judicial brasileiro ou português, estes mesmo que dizem não quererem meter-se na “nossa soberania”, mesmo quando se suspeita de dinheiros nossos que por lá dizem estarem a ser lavados!