Luanda - Empreiteira mantém relação política com José Eduardo dos Santos desde 1984. Segundo dono da Odebrecht, angolano queria evitar que ex-generais perturbassem estabilidade política do governo.

Fonte: G1

Presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, pediu a Emílio Odebrecht – um dos donos do Grupo Odebrecht – que a empresa brasileira auxiliasse ex-generais do país africano a se tornarem empresários. O pedido do chefe de Estado de Angola foi relatado em um dos trechos da pré-delação premiada de Emílio com a Procuradoria Geral da República (PGR).

 

Maior empreiteira do Brasil, a Odebrecht mantém relações comerciais com Angola desde os anos 70. A construtora atua no país tocando obras a partir de financiamentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

 

Nas últimas quatro décadas, a construtora atuou em importantes projetos de infraestrutura do país africano, como a construção da usina hidrelétrica de Capanda, em consórcio com a antiga União Soviética.

 

Em documento apresentado aos procuradores da República antes mesmo de prestar depoimento, Emílio Odebrecht contou que, desde 1984, tem um canal direto com José Eduardo dos Santos, que está à frente do governo angolano há 37 anos. O presidente angolano pretende deixar o poder no ano que vem, tanto que já convocou eleições para agosto para a escolha de seu sucessor.

 

Um dos 78 executivos e ex-dirigentes da Odebrecht que fecharam acordo de delação premiada com a PGR, Emílio ressaltou ao Ministério Público que o bom relacionamento com o presidente de Angola se manteve, especialmente, porque a empresa sempre conseguiu atender "com qualidade e no prazo os desafios constantemente impostos" pelo chefe de Estado do país africano.

 

De acordo com Emílio, a empreiteira influenciou, inclusive, na assinatura, em 1992, do acordo de paz que pôs fim a uma sangrenta guerra civil que durou 16 anos e deixou cerca de 300 mil mortos. À época, contou o empresário brasileiro, a Organização das Nações Unidas (ONU) chegou a pedir apoio logístico da Odebrecht em Angola para as tropas da missão de paz da entidade internacional.

 

Em razão do longo relacionamento político com o presidente angolano, afirmou Emílio Odebrecht, José Eduardo dos Santos chegou a pedir que a empreiteira o auxiliasse a desenvolver programas para que parte dos ex-generais do país que atuaram na guerra civil trocassem a caserna pela atividade empresarial.

 

O objetivo do pedido, explicou o dono da Odebrecht, seria evitar que os antigos comandantes militares angolanos "viessem a perturbar a estabilidade política" do governo de José Eduardo dos Santos.

 

"O presidente [de Angola] também pediu que apoiássemos o desenvolvimento de programas para alguns de seus ex-generais e como poderíamos ajudar a transformá-los em empresários para que tivessem uma ocupação e não viessem a perturbar a estabilidade do seu governo em Angola", relatou Emílio Odebrecht.

 

O empreiteiro disse que, diante da solicitação presidencial, a Odebrecht atuou, por meio de associações e sociedades com os ex-generais, nas quais a empresa transferia know-how aos novos sócios. Em contrapartida, os militares angolanos entravam com o capital necessário para tirar o negócio do papel.

 

"Essas associações, sem a menor sombra de dúvida, é um dos fatores que favorecem também o tratamento diferenciado da Organização [Odebrecht] em Angola", ponderou o empresário.

 

Emílio Odebrecht afirmou aos procuradores da República que, desde a década de 1980, ele faz reuniões anuais com o presidente de Angola para prestar contas dos projetos da construtora em andamento no país africano e também para negociar novos empreendimentos. Segundo o empreiteiro, ele trata pessoalmente das demandas de José Eduardo dos Santos.

 

Delator ( Marcelo Odebrecht ) diz que Lula fez BNDES socorrer Odebrecht por prejuízos


Em sua delação premiada, Emílio Odebrecht e o filho, Marcelo Odebrecht, contaram sobre o socorro que a construtora recebeu do BNDES por ordem do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O empresário disse que a suposta ajuda do ex-presidente ocorreu por conta das dificuldades econômicas sofridas por Angola em 2009.

 

“Marcelo realmente me pediu que eu conversasse com o Lula. Foi num período em que houve uma queda de petróleo muito grande. E que Angola tava com isso, com restrições orçamentárias da, vamos dizer assim, de disponibilidade deles, então… o orçamento mingou bastante, e que era importante que houvesse uma ampliação de uma linha de crédito que o Brasil tinha com Angola”, destacou Emílio Odebrecht.

 

“Eu me lembro que eu cheguei para o Lula, eu pedi a ele, porque estava em tramitação. Se ele pudesse prestigiar para que não houvesse dificuldades na extensão dessa linha de crédito. Era um pedido que eu estava fazendo para ele”, complementou.

 

Conforme Marcelo Odebrecht, a atuação de Lula para prestar socorro financeiro de US$ 1 bilhão aos negócios da Odebrecht em Angola gerou um pedido de propina por parte de petistas. O empresário afirmou que o ex-ministro do Planejamento Paulo Bernardo o procurou, em meio à negociação do empréstimo do BNDES, para pedir US$ 40 milhões.

 

“Nesse caso específico foi a negociação que ocorreu em 2009 e se concretizou em 2010, de um aumento da linha de crédito. Essa linha de crédito acabou sendo fechada no valor de R$ 1 bilhão. No meio dessa negociação, o Paulo Bernardo, que foi indicado pelo Lula para tratar desse assunto, pediu pra gente, pediu pra mim, 40 milhões (de dólares) pra que essa linha de crédito fosse para 1 bilhão (de dólares). Eu concordei com o pedido de Paulo Bernardo, mas fui no Palocci, que tava acompanhando tudo. Na época, Palocci não tinha no governo, mas era meu interlocutor, e combinei com o Palocci que esse dinheiro, como viria de Angola, ele tinha uma geração de 10% e eu consegui abater esse crédito que ele passaria a ter comigo por conta desse assunto, para 36 milhões de dólares, que deu R$ 64 milhões”, contou Marcelo Odebrecht.

 

Os donos da Odebrecht afirmaram ainda que a campanha da senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) – mulher de Paulo Bernardo – para o governo do Paraná, em 2014, recebeu R$ 5 milhões por causa do acerto de Angola.

“Eu sei o seguinte: quando o Paulo Bernardo conseguiu que esse dinheiro viesse da conta Italiano, com toda a certeza foi também pelo fato de que ele conhecia, tinha se envolvido nesse assunto. E daí veio autorização de Palocci, porque, novamente, não era Paulo Bernardo que autorizava o pagamento, era Palocci. Então, veio autorização de Palocci para dar esse apoio a Gleisi, da conta Italiano, foi descontado da conta Italiano, com certeza por causa do envolvimento de Paulo Bernardo nesse assunto”, observou Marcelo.

 

Emilio Odebrecht também falou de outro favor que fez a Lula, dessa vez para beneficiar o sobrinho da primeira mulher do ex-presidente, Taiguara Rodrigues.

“Numa viagem dessa para o exterior, ele falou com Alexandrino: ‘olhe, eu tenho um sobrinho que tem uma sociedade em Portugal com um sócio português e se vocês puderem dar uma oportunidade de trabalho’. Alexandrino me falou, e eu disse: Alexandrino, filho, nós sempre demos oportunidade a qualquer pedido, seja de político, de setor público, de privado, seja lá o que for, a não ser que a gente não tenha mesmo. Mas de um modo geral, eu digo é para dar, a qualquer pedido. Agora, o que nós não podemos é levar, depois de 90 dias, sem uma avaliação, e só fica quem pode contribuir com alguma coisa para a organização porque tem valor, seja ele pessoa física, seja ele pessoa jurídica", relatou Emilio Odebrecht.

 

No último dia 15, após a divulgação dos depoimentos de Emílio e Marcelo Odebrecht, o BNDES anunciou que vai investigar internamente denúncias feitas pelos delatores referentes ao suposto favorecimento à empresa em Angola