Luanda  - A história rocambolesca do português Luís Castanhas, vivamente descrita por Rafael Marques no MakaAngola ( https://www.makaangola.org/2017/04/portugues-cumpre-pena-de-um-ano-por-furto-de-batatas/) demonstra que o sistema processual penal angolano não se libertou do seu passado colonial insistindo em copiar as práticas lusas no seu pior, e se possível elevando ainda mais o patamar da asneira.
 
Fonte: Club-k.net
 
Roubar Batatas é Grave, Roubar o Pais é Normal
 
Castanhas foi acusado de 1 crime de furto doméstico nos termos dos artigos 425.º, n.º 3, 421.º, n.º 5 e 55.º,n.º 3, todos do Código Penal. 
 
 
Lendo a acusação do Ministério Público torna-se muito difícil perceber em concreto os factos de que Castanhas é acusado. Num momento, refere-se, sem explicitar data, ou apresentar qualquer prova específica, um furto de batatas que terá prejudicado o empregador de Castanhas em 75.000 kwanzas. Depois, apesentam-se outros factos ocorridos em 16 de Dezembro de 2016, que teriam lesado o empregador em 660.000 Kwanzas. O problema reside no facto de neste último caso, o crime não se ter consumado. Na verdade, tanto quanto se percebe do texto da acusação, as batatas não chegaram a sair da propriedade do seu dono e Castanhas muito menos recebido o produto da sua alegada actividade criminal.
 
 
Mas o importante a reter é que factos ocorridos em 16 de Dezembro de 2016 numa Fazenda propriedade da empresa Agrolíder são imediatamente objecto de “eficiente“ actuação do Ministério Público. Em quatro meses tudo é investigado e decidido!
 
 
Contudo, outros casos bem mais graves que uma tentativa de furto de batatas de uma fazenda, são tratados com uma enorme displicência ou nem sequer são tratados, custando milhões de dólares ao país.
 
 
Veja-se , por exemplo, o que se passa com o Fundo Soberano de Angola. Este Fundo perdeu milhões e milhões de dólares pertencentes aos contribuintes e ao povo angolano ao longo dos anos. Esse facto em si mesmo não é um crime. “Apenas“ é estranho. No entanto, as informações que quotidianamente chegam ao conhecimento público apontam para factos graves que obrigatoriamente deviam levar a uma investigação da PGR.
 
 
Muitos indícios fazem suspeitar que o filho do Presidente, Zenú e o cidadão angolano Jean-Claude Bastos de Morais constituíram uma parceira de facto para benefício mútuo, em que este último é o mentor do primeiro. Nesse sentido, o Fundo Soberano não teria qualquer autonomia estratégica e operacional, sendo indistinguível da Quantum Global (empresa financeira liderada por Jean-Claude Bastos de Morais), e através de um elaborado esquema, estes dois apropriar-se-iam de substanciais quantias em dinheiro pertencentes a Angola.
 
 
Em primeiro lugar o pessoal do Fundo é treinado pelo Quantum Global. O Fundo Soberano enviou os seus recursos humanos para a Suíça para serem preparados e enquadrados pelo Quantum Global Group. 
 
 
Mas, o mais importante, é o esquema para obtenção de dinheiro. As mesmas fontes do MakaAngola alegam também que a tarefa fundamental do Quantum Global é cobrar comissões ao Fundo Soberano, por trabalhos que aparentemente não efectua, como a gestão de capitais. Por sua vez estas comissões são reportadas como lucro da empresa, e seguem caminho como "dividendos" para Jean-Claude Bastos de Morais em transferências para a Quantum Global Wealth Management, baseada em Chipre, accionista maioritária do  Quantum e da qual JC Bastos é único accionista.
 
 
Se esta descrição da relação entre o Fundo Soberano e a Quantum Global está correcta percebe-se porque é que o Fundo dá prejuízo: porque os seus capitais não são realmente geridos, mas estacionados retirando-se deles apenas comissões; e também se vê facilmente o modo de apropriação de dinheiro do Estado Angolano: através da cobrança de comissões por gestões de capitais que não são realizadas. Finalmente, observa-se também que o dinheiro assim obtido termina no Chipre, país da União Europeia, que ficou famoso por guardar o dinheiro dos oligarcas russos (e pelos vistos dos angolanos). Tempo para a Eurodeputada Ana Gomes intervir com a sua acutilância habitual!
 
 
Obviamente, que o PGR de Angola deveria investigar este assunto com tanta diligência como investigou o caso das batatas. E começando por averiguar a questão da licença que o Quantum Global tem na Suíça e o que está a fazer nas Maurícias? Estas são as pistas para uma investigação inicial.
 
 
Ou o Procurador-Geral da República vai ficar, mais uma vez, inerte, e nada fazer?
 
Temos dois casos: o Castanhas das batatas e o Jean-Claude do Quantum Global. Num caso o MP reagiu com rapidez, no outro caso dorme. 
 
É isto que se quer: um PGR que persegue os fracos e se agacha perante os fortes?