Luanda - A riqueza e o poder político são dois factores inseparáveis, que conjugam-se, complementam-se e sustentam-se reciprocamente. Na manutenção do Estado, os dois factores constituem em peças fundamentais e distintas, que funcionam numa engrenagem, em espaços diferenciados, visando os objectos comuns e as metas convergentes. Pois que, o poder politico visa essencialmente alcançar o bem-estar do povo, e o bem-estar do povo é realizável com a riqueza – equitativamente distribuída.

Fonte: Club-k.net

Nesta equação, o poder financeiro (riqueza) tem como meta final a realização de lucros, como rendimentos, que geram receitas, impulsionam investimentos, que viabilizam o crescimento económico. Nos tempos modernos, das sociedades avançadas e globalizadas, a riqueza (o poder financeiro) suplanta o poder politico, e sujeita este aos seus interesses, por via das Instituições Financeiras, que dominam o mercado e a economia mundial. A supremacia do poder financeiro tornou-se hoje o foco de colisão ideológica entre diversas correntes políticas do mundo capitalista.

 

Note-se que, o modo da acumulação da riqueza (capitais) e a forma da conquista do poder político são diversos, caracterizados por processos quer lícitos quer ilícitos. Nesta lógica, o estado de licitude ou de ilicitude tem o carácter provisório, que passa por diversas fases complexas, condicionadas por um conjunto de factores, que criam um novo ente jurídico, dando-lhe um estatuto legal ou ilegal. Noutras palavras, alcançado o poder financeiro (riqueza) e o poder político torna-se viável a criação de condições necessárias para que a riqueza acumulada de forma ilícita seja dado um cunho jurídico- legal e legítimo. No caso da adversidade, verifica-se geralmente uma inversão dos termos, em que, diante o desmoronamento do poder politico, surja uma alteração substancial no que diz respeito o estado da legalidade e da legitimidade adquirido por artifício.

 

Este fenómeno, da adversidade do poder politico, na fase de desmoronamento, tem sido mais frequente nos países em desenvolvimento, com destaque em África, na Asia e na América Latina, nos quais a transição do poder político não tem sido pacífica, ordeira, transparente, justa, legítima e legal. A título de exemplo, em que a riqueza e o poder politico se conjugavam-se, complementavam-se e sustentavam-se reciprocamente, foi no Zaire. O Presidente Mobutu Sesse Seko era um grande ricaço – todo-poderoso. Que tinha acumulado ilicitamente uma fortuna fabulosa, que sustentava o poder totalitário e ditatorial. Porém, a queda do regime do Marechal Mobutu não só foi sucedida por desmoronamento total das instituições políticas erguidas, mas igualmente, por desaparecimento brusca da riqueza e dos imoveis luxuosos adquiridos no estrangeiro. Como consequência, deixara a família real cair em desgraça, vivendo no exílio, à custa de subsídios sociais do Governo de Marrocos.

 

Em termos de analogia, a situação actual de Angola é impar de tal ordem que ela atingiu os níveis mais avançados dos Estados totalitários, autocráticos, repressivos, corruptos e segregacionistas. Pois, Os seus instrumentos governativos estão bem enraizados numa Doutrina bem concebida e bem definida, assente na cultura de violência, de repressão, de segregação, de egocentrismo, de corrupção, de exclusivismo, de centralização absoluta, de monopólio (controlo exclusivo do capital e do mercado), de hegemonia (supremacia politica, étnica e cultural), de xenofilia e de prepotência.


O regime absolutista em geral funciona nos moldes de um Gângster, de um bando de mafiosos, que obedece as regras e normas restritas, bem definidas, que conduzem e regulam a conduta e o comportamento dos seus membros. Quem fizer o contrário é afastado do círculo interno do poder politico, ou é eliminado fisicamente. O poder politico gira em torno das mesmas pessoas, do mesmo clique, que trocam-se as cadeiras, numa rodagem constante. Não deixam outros sujeitos, que não pertencerem ao círculo interno (outsiders) desta casta, entrar no sistema fechado da distribuição ilícita da riqueza do País. Criando assim uma espécie de monopólio económico-financeiro, que sustenta a hegemonia político-partidária, em todas esferas do Estado.

 

O Conceito dominante deste sistema político reside no «egocentrismo», enraizado no «centralismo político-partidário», e estimulado por «corrupção». Estes três princípios, acima referidos, não conjugam-se com os valores de «solidariedade e de boa governação» que, de grosso modo, constituem uns dos pilares principais da democracia liberal, das sociedades abertas e modernas, que respeitam as liberdades e os direitos individuais dos cidadãos livres. Pois, o liberalismo democrático liberta as mulheres e os homens das algemas do absolutismo e do centralismo político-partidário.

 

Ou seja, a democracia liberal concede a liberdade politica, económica, financeira, cultural e religiosa, em que os cidadãos livres têm melhores garantias contra o arbítrio do governo, separando deste o poder legislativo e judicial, a fim de estabelecer a justiça, a igualdade, a transparência e o equilíbrio. Para este efeito, a doutrina da democracia liberal fixa limites bem definidos à acção reguladora do Governo, não lhe permitido o direito de transformar-se no Dono da riqueza do País. Na condição de Dono do País, instala-se a Ditadura, fazendo o que entender, em plena impunidade, distribuindo a riqueza de forma arbitrária, na base da militância partidária, do favoritismo, do nepotismo ou do tráfico de influência – excluindo a maioria esmagadora da população.

 

O saque espectacular do Banco Espirito Santo Angola (BESA) pela nomenclatura do MPLA, numa acção planificada minuciosamente, revela nitidamente a natureza do capitalismo selvagem. Neste sistema, a acumulação da riqueza, de forma ilícita, visa essencialmente a criação de condições necessárias para a manutenção do poder politico. A lista dos beneficiários desta pilhagem, do BESA, sem precedente, no total de mais de 70 pessoas, entre governantes, dirigentes políticos, profissionais, quadros destacados e familiares do Presidente do MPLA, espelha claramente a Doutrina do Regime. Veja só que, o dinheirão dos Dirigentes do MPLA nas suas Contas Bancárias no Estrangeiro é duas vezes mais do que existe neste momento no Tesouro Público do Estado Angolano. Mergulhando o País na falência.

 

No fundo, a acção do saque e de branqueamento de capitais, que actua a todos os níveis dos órgãos do Estado e das instituições públicas, visa essencialmente criar um regime do monopólio económico-financeiro, dominado por uma casta, capaz de condicionar a sociedade angolana – depauperá-la, domesticá-la e reprimi-la absolutamente. Na base deste princípio, o poder politico passa a depender exclusivamente do poder financeiro, que estabelece as normas e regulamentos de clientelismo, de dependência e de obediência absoluta. Este sistema político é idêntico ao feudalismo medieval, que vigorou na Europa e na Asia.

 

Neste sistema supra referenciado, a democracia, como sistema político, serve apenas de ornato, para ocultar o sistema, em referência. Ressaltando, neste respeito, o facto de que, a ausência absoluta da separação dos poderes executivos, legislativo e judicial, garante a «impunidade»; inibe os tribunais; e doméstica o parlamento. Realçando, deste modo, o Poder Unipessoal. Nesta óptica, baseando-se na teoria da Monarquia Absoluta, há uma Máxima do Rei Luís XIV, da França, que diz: «O Estado sou Eu». Em Francês: “L ́État c ́est moi.”

 

Em analogia, o Regime actual de Angola, do MPLA, atingiu o nível mais elevado do Absolutismo, como sucedeu na França. Tendo provocado e radicalizado a Revolução Francesa, que teve lugar entre 1789 e 1799. A Revolução Francesa foi dramática, passando por várias fases criticas, que não convinham detalhar neste texto. Realçando apenas a queda de Bastilha (14.07.1789); proclamação da Primeira Republica Francesa (21.09.1792); morte do Rei Luís XVI (21.01.1793); Golpe de Estado (09.11.1799) de 18 de Brumário; ascensão do Maximilien Robespierre; proclamação do Imperio Francês; Napoleão Bonaparte toma conta do poder no dia 18 de Maio de 1804.

 

Dai para diante, iniciara uma nova Era de agitação, de Guerras, e de transformações profundas na Europa e na América. Surgindo assim os valores democráticos, enraizados na liberdade, na igualdade, na fraternidade, na justiça social, e no sufrágio universal. Ficam banidos os privilégios monárquicos, feudais, aristocráticos e religiosos, da Igreja Católica, que era parte integrante e mais poderosa do poder imperial e monárquico da Europa. A propriedade da Nobreza e do Clero, acumulado ilicitamente, foi transformada num «bem-comum», ao serviço do público, para a edificação gradual do «Estado- Providência», que vigora hoje na França e na maior parte dos Países Ocidentais.

 

Repare que, o “Estado-Providência,” na França e noutros Países Ocidentais, atingiu agora os níveis muito elevados, absorvendo cerca de dois terços do Orçamento Geral do Estado. O que exige, neste momento, reformas profundas para ajustá-la à realidade contemporânea, diante os seguintes desafios: a supremacia das multinacionais e da bancocracia; o outsourcing de capitais; os desempregos crescentes; a globalização; o declínio das instituições multilaterais; o êxodo migratório; o terrorismo internacional; os conflitos internos; a tripolarização do mundo; a incerteza do futuro da União Europeia; e a renascença do nacionalismo europeu – da Extrema Directa.

 

Tudo isso indica que, o Velho Continente está numa Revolução constante contra a «acumulação primitiva de capitais», que põe em causa os valores da liberdade, da igualdade, da fraternidade e da justiça social. Em termos da riqueza do País, na França, por exemplo, 73% é composta por propriedades herdadas das famílias antigas. Noutros Países da Europa Ocidental a quota herdada, do património público, é de 50% das famílias antigas, de origens aristocráticas, das monarquias absolutas, da Idade Média. Esta classe de bilionários, cujo capital é herdado, exerce uma influência enorme sobre o mercado. Nalguns casos, como na França, esta classe bilionária, tem estado a dificultar o acesso dos novos empresários aos mercados de investimentos.

 

Na verdade, se a Europa Ocidental não tivesse feito um combate efectivo contra a aristocracia, das monarquias absolutas, que tinham acumulada ilicitamente enormes fortunas de bens, dos quais ainda representam uma fonte importante de receitas do Estado, não teria sido possível edificar um «Estado-providência», que floresce hoje em todas Democracias Ocidentais. Com efeito, foi o Estado-providência que serviu de instrumento principal de desenvolvimento e do crescimento económico, através do qual foi possível erradicar a pobreza na Europa, e construir gradualmente uma «classe média» bem avançada, vasta, estável, próspera e crescente.

 

Interessa notar que, neste esforço da construção do Estado-providência, os impostos sobre o rendimento e sobre as heranças das famílias ricas têm sido bastante elevados, ao ponto de causar o êxodo significativo dos Bilionários Europeus aos Países em via de desenvolvimento, onde tiram proveito da mão-de-obra barata, dos baixos impostos e da isenção fiscal. Causando, em consequência disso, o aumento crescente de desemprego nos países de origem. Nesta conformidade, urge neste momento, empreender «reformas apropriadas» no sentido de valorizar o trabalho e o capital; bem como, equilibrar a distribuição da riqueza entre os ricos, a classe média e as camadas vulneráveis. No fundo, o cerne do problema consiste em como libertar-se da supremacia dos detentores de grandes capitais financeiros, que controlam as multinacionais e as instituições financeiras?

 

No caso especifico de Angola, a tendência não aponta em direcção do Estado- providência, sobretudo nesta fase crucial em que a classe pobre representa cerca de 93% da população do País. O que se nota, pelo contrário, é a fortificação de uma pequena classe de capitalistas selvagens. Que se encontra inclinada em acumular cada vez mais riquezas, com poderes absolutos. Explorando, empobrecendo e subjugando os membros da sociedade. Tornando-os cada vez mais pobres, dependentes e obedientes – idêntica ao estado de vassalagem feudal, que prevaleceu na Europa, na Idade Média. Portanto, a política da partidarização do Estado e da domesticação partidária visam o monopólio financeiro e a hegemonia política, com os quais se torna viável estabelecer o totalitarismo, de facto, com capacidade de eternizar o poder político, sem alternância democrática, feita de uma forma transparente, justa e credível.

 

Esta visão política, acima referenciada, enquadra-se no sistema do «Partido Único», com poderes centralizados, utilizando a democracia como um mero instrumento da consolidação do sistema totalitário e monopolista. Alias, a Constituição actual de Angola é deste calibre, que consagra o «poder unipessoal», que domina os poderes executivos, legislativo e judicial – sem qualquer forma de fiscalização e de prestação de Contas reais. Por isso, o problema de Angola não resume-se no Eng.o José Eduardo dos Santos e sua família, mas sim, na superestrutura do MPLA, como Instituição Politica, que adoptou o capitalismo selvagem, como política do Estado, na manutenção do poder público.

 

Na verdade, o MPLA transitou-se invariavelmente da «Esquerda Socialista» para a «Aristocracia Burguesa». Alias, Dr. Jonas Malheiro Savimbi, na luta Anticolonial, na Frente Leste de Angola, defendia insistentemente a tese segundo qual: “A Liderança do MPLA é composta por uma cambada de burgueses corruptos, filhos de colonos, que fingem-se de ser Socialistas.” Fim de citação. Nesta referência, acredito que, esta característica, «de burguesia e corrupção», foi um dos motivos principais que estiveram na origem da «discórdia» entre ele e a Direcção do MPLA, que se encontrava na Algeria.

 

Em suma, feita esta abordagem profunda e extensiva, coloca-se o País diante um grande desafio, dentre a Revolução Democrática e a Ditadura Burguesa. Pois as transformações políticas, económicas, sociais e culturais não resumem-se numa revolução. Pelo contrário, é uma dinâmica constante, que adapta-se à conjuntura nacional e internacional – de cada época e de cada situação concreta. Por isso, cada geração de um povo tem uma missão espinhosa a cumprir, em nome da Pátria. O desafio actual do país cabe à Juventude Angolana erguer as cabeças e defender o Estado Social, Democrático e de Direito. A nossa responsabilidade patriótica, como nacionalistas, que combateram o colonialismo português, é de despertar e consciencializar as mentes do povo angolano. Quo vadis Angola!


Luanda, 08 de Maio de 2017