Luanda - O Tribunal Constitucional de Portugal não aceitou um recurso apresentado pelo Ministério Público a um acórdão do Tribunal Relação de Lisboa (TRL) favorável ao general angolano Bento dos Santos 'Kangamba' no caso das investigações que decorrem desde 2014.

Fonte: Lusa

Conforme decisão do Tribunal Constitucional de 19 de abril, a que a Lusa teve hoje acesso, o TRL decidiu em 07 julho de 2016 não ter ocorrido em qualquer omissão de pronúncia no arquivamento anterior do caso contra o general angolano, conforme pedia o Ministério Público (MP), que decidiu levar o caso à última instância, alegando inconstitucionalidade da decisão.

 

Pretensão negada agora pelo Tribunal Constitucional, que decidiu "não conhecer do objeto do presente recurso", por insuficiência no cumprimento de requisitos de inconstitucionalidade do pedido do MP.

 

Em causa está uma investigação iniciada em Portugal por suspeitas de corrupção passiva na forma agravada, corrupção ativa na forma agravada, branqueamento e falsidade informática, segundo informou em 2014 a Procuradoria-Geral da República (PGR), o que levou à "apreensão preventiva" das contas bancárias e propriedades em Portugal do empresário e general angolano.


O caso Bento dos Santos 'Kangamba', dirigente do MPLA e sobrinho do Presidente angolano José Eduardo dos Santos, mas arrasta-se nos tribunais portugueses há três anos, com vários incidentes processuais.

 

O mesmo general confirmou a 04 de março último, em comunicado, que tinha apresentado um recurso pedindo o arquivamento do inquérito ainda pendente, alegando a decisão anterior do Tribunal da Relação de Lisboa, que se declarou incompetente.

 

"Interpus efetivamente um recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, em que pugnei pelo arquivamento do inquérito que o DCIAP [Departamento Central de Investigação e Ação Penal] instaurou contra mim", lê-se na "nota de esclarecimento" enviada na altura à Lusa e assinada pelo general angolano.

 

No mesmo comunicado de então, o general e empresário recorda que o inquérito dura desde 2013, mas que foi "declarada a incompetência internacional das autoridades portuguesas", tendo em conta que os factos estariam relacionados com a sua atividade em Angola, segundo a decisão do TRL de 26 de março de 2015 "já transitada em julgado" e que tem sido alvo de recursos pelo MP.

 

"A Lei prevê expressamente que, quando assim sucede, o arquivamento é obrigatório para as autoridades encarregues do inquérito. Contudo, o DCIAP e o TCIC [Tribunal Central de Instrução Criminal] têm ignorado propositadamente essa decisão e as suas legais consequências, bem como todo o teor da minha defesa, que, em último grau, demonstra a total falta de suporte das suspeitas que me são lançadas no inquérito", refere a nota, que surgiu na altura face a notícias em Portugal sobre o objeto do recurso.

Bento dos Santos 'Kangamba' afirma que a atitude das autoridades portuguesas "constitui efetivamente uma denegação de Justiça", mas que, apesar das suas queixas, públicas e no processo, "isso tem suscitado apenas indiferença".

Em entrevista à Lusa, também em março, o general angolano admitiu a intenção de processar o Estado português pelos prejuízos decorrentes do não arquivamento desta investigação, apesar das decisões que lhe foram favoráveis.

"Em Portugal não existe mais processo contra o general. Foi ganho, nós esperamos só que feche o processo, o Ministério Público tem de fechar o processo. Faltaram ao respeito a mim e à minha família quando mandaram pessoas assaltar [buscas] a minha casa para irem ver o que tenho lá quando eu não sou criminoso", afirmou o general, em Luanda, questionado pela Lusa.

No final de 2015, uma decisão do TRL ao recurso interposto pela defesa decretou a nulidade do arresto dos seus bens em Portugal. O mesmo tribunal referia que o general angolano, mais de um ano depois, "não foi constituído arguido" e que, até 14 de outubro de 2015, "não fora sequer deduzida acusação nem mesmo ainda proferido despacho de encerramento de inquérito".

Uma outra decisão da Relação sobre este caso, de 26 de março de 2015, referia a apreensão em Portugal - em propriedades do general angolano - de pelo menos 450 mil euros, mas também recordava que no processo penal "o ónus da prova cabe ao detentor da ação penal, não o inverso", pelo que "é o detentor da ação penal que tem de provar essa origem ilícita, com factos, não com suposições".