Luanda - Hoje completa um ano desde que a tão exigida liberdade dos 15+Duas se concretizou. E já várias vezes agradeci publicamente a todos os que estiveram envolvidos na concretização dessa libertação, e mais uma vez agradeço-vos do fundo do coração.

Fonte: Facebook

Mas hoje tenho de enaltecer a busca incansável da minha libertação feita pela minha esposa, Neusa Marques De Carvalho, e de todas as mulheres que estiveram envolvidas. Elas foram muito fortes. A minha esposa foi muito forte. Cheguei a dizer-lhe (a ela) que estava surpreso com aquela força que ela irradiava sempre que me ia visitar. Passavam dois meses desde que tínhamos completado um ano de casados quando fomos presos, e estávamos a acostumar-nos a dividir o mesmo espaço e a cuidar da nossa filhinha que na altura tinha um ano e oito meses de idade. Ela desistiu do curso de Direito logo no início do processo, que ocorreu numa fase em que começariam os exames na universidade, afirmando que só retomaria assim que eu saísse daquela situação. E dizia na esperança de que a libertação seria em breve, talvez uma ou duas semanas depois da detenção. E o tempo lá foi passando.


Quando fui transferido para o Calomboloca, fiquei completamente desesperado. Ela chegava ali e tranquilizava-me com o seu optimismo superior ao de Pangloss, personagem do livro Cândido, de Voltaire. Então passei a ter os dias de visita como os dias de terapias. Levava-me livros e mais livros, todos os que estavam em casa há muito precisando de serem lidos. Não levava alguns propositadamente porque achava impróprios para o local. Era a psicóloga a ditar regras. E chegou a fase em que já não tinham livros para serem lidos, e ali eu incomodava-a para comprar uns baratinhos com o pouco dinheiro que tinha, e lá ela levava-me uns básicos duma colecção feita pelo GRECIMA e que custavam 500 Kwanzas cada. Todos autografados por ela e com mensagens moralizadoras. Destes livros constava um do professor Aníbal Simões.


Obrigado por estares ao meu lado, esposa! Sem ti, certamente seria mais difícil enfrentar o calvário. Agradeço também às minhas três irmãs por tudo que fizeram: Núria Alves, Engrácia de Carvalho e Tamara de Carvalho. Agradeço aos meus pais desde o meu nascimento, com sorrisos infantis primeiro e agora com acções positivas que simbolizam a boa educação que me deram.

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Tenho de frisar também a prestação duma mulher que vi fazer esforços colossais: Laurinda Manuel Gouveia. O meu companheiro Arante Kivuvu Lopes foi colocado comigo no bloco B em Calomboloca, e ali passámos algum tempo juntos, embora em celas solitárias diferentes. Ficámos juntos também em São Paulo e em Caboxa. Ele começou a receber assistência familiar muito tarde e, enquanto isso, era a Laurinda quem tratava de prestar-lhe essa assistência. Três vezes por semana, pacientemente lá estava a Laurinda na longínqua penitenciária para transmitir uma palavra de coragem e um sorriso ao Arante, e Kivuvu recebia o sorriso e usava-o diariamente. Uma companheira de convicções de honra. E no final do julgamento ela foi também condenada com a Rosa Conde Conde, e do tribunal seguiram para a ala feminina da comarca de Viana onde sofreram bastante mas se mantiveram fortes como foram ao longo do processo. Bravas mulheres