Lisboa - As autoridades angolanas podem ter de investigar uma alegada falsificação de assinatura do pai do ativista Luaty Beirão, num caso que tem muitas ligações a Portugal.

Fonte: SOL

Um morto que assinava documentos

Há cerca de 15 dias, a Procuradoria Geral da República de Angola terá recebido uma queixa de José Eduardo Fernandes, um angolano que foi acionista fundador da empresa Plurijogos - que contava também como acionista fundador o empresário António Ferreira, marido da fadista Mariza, apurou o SOL.

 

Na documentação entregue é referido que a Plurijogos estava integrada na Gesti-Grupo, sociedade que tinha acionistas em comum com o Banco Angolano de Negócios e Comérico (BANC). Com a alegada falsa assinatura terá sido viabilizada a transferência de quotas de empresas, nas quais o BANC tinha participação, a favor de Agostinho Durães Rocha. E terá sido nas atas da Assembleia Geral de acionistas dessa entidade bancária que tudo terá acontecido, de acordo com a versão do denunciante.

 

É que João Beirão, que morreu em 2006, foi acionista fundador do BANC e José Eduardo Fernandes diz ter provas de que terá existido falsificação da assinatura. A queixa é apresentada contra o advogado português Henrique Doroteia, que foi notícia nos últimos tempos ao ser acusado por António Ferreira de traição, juntamente com um general angolano por assuntos relativos a estas empresas. (ver texto secundário)

‘Assinaturas’ podem ter sido usadas após a morte

«O participante [José Eduardo Fernandes] tomou conhecimento de práticas ilícitas levadas a cabo em atas da Assembleia-Geral de acionistas do BANC [...] conhecimento esse que não deixou alternativa a este, senão, tomar as providências adequadas, recorrendo aos Tribunais e aos demais órgãos de instrução criminal, como faz pela presente queixa-crime», começa por detalhar o documento a que o SOL teve acesso.

 

O pai do ativista luso-angolano detinha 9% do capital social do BANC e segundo a denúncia poderia já ter falecido quando se colocou numa ata que este abria mão de uma parte significativa da sua participação acionista para Agostinho Durães da Rocha.


«Em 12/10/2006 teve lugar uma assembleia-geral ordinária de acionistas do BANC, tendo como ponto único da ordem do dia a constituição do Banco Espírito Santo como correspondente do BANC em dólares e em Euros», refere o documento que deu entrada na PGR de Angola, acrescentando que foi elaborada uma ata relativamente a esta assembleia assinada pelos acionistas e pelos membros da mesa.

 

E é aí que surgem algumas incongruências revela o denunciante: «Encerrada a Assembleia-geral e lavrada a ata n.º2, foi aditada uma suposta continuação, a qual relata que 3 dos acionistas fundadores do BANC abriram mão de parte substancial da sua participação acionista a favor de Agostinho Manuel Durães Rocha, entre os quais o falecido João Beirão».

 

De acordo com a participação feita, esse aditamento em concreto não foi assinado por nenhum dos acionistas e entre as assinaturas constava a de Agostinho Rocha, ou seja, o beneficiário.

 

É ainda afirmado que tudo aponta para que nessa altura João Beirão já tivesse falecido.

 

Mas o mais grave de toda a denúncia é o facto de ser referido que a partir dessa ata todas as assinaturas apostas como sendo do pai do ativista seriam na verdade um carimbo: «É assim na ata n.º3 e é assim nas atas n.ºs 4 e 5 relativas a assembleias-gerais de acionistas do BANC, motivo pelo qual a assinatura do falecido Eng. João Beirão passa a ser a última das ‘assinaturas’ apostas nas atas n.ºs 3 e 4».

O papel de Herique Doroteia

E o advogado Henrique Doroteia entra exatamente aí. É que na queixa-crime é referido que fora o advogado português quem mandou elaborar em Lisboa o referido carimbo para que se pudesse usar daquela forma, sobretudo porque era Henrique Doroteia «quem redigia as atas relativas ao BANC e tratava de toda a sua formalização».

 

De acordo com o documento a que o SOL teve acesso, tudo se tratou de uma «falsificação grosseira levada a cabo sobre um instrumento jurídico relativo a um Banco Comercial com atividade em Angola», algo grave, uma vez que a atividade bancária pressupõe «confiança».

 

O denunciante diz não saber se o alegado esquema seria levado a cabo apenas por Henrique Doroteia e por isso a queixa apresentada é também contra terceiros.