Luanda  - O candidato a Presidente da República, pela lista do MPLA, João Lourenço, concedeu a sua primeira conferência de imprensa na passada sexta-feira, 14, a órgãos de comunicação social nacionais. Faço a seguir a minha análise do primeiro capítulo “Problemática da Corrupção” sobre o desempenho do candidato do MPLA e do trabalho de jornalismo prestado à nação. Noutras edições, seguem-se análises de outros capítulos.

Fonte: Peroladasacaias

Problemática da Corrupção

JL: “A necessidade de combate à corrupção é algo que consta nos principais documentos do nosso partido. É algo que consta na própria moção de estratégia do líder do partido. É algo que consta no programa de governação do MPLA. Porque quer o líder do partido, quer a direcção do partido concluíram que a corrupção é um grande mal que corrói a sociedade, portanto, daí a necessidade de todos nos empenharmos seriamente no combate deste grande mal que, entre outras coisas, coloca mal a reputação do nosso país perante a comunidade internacional. Como combater a corrupção?! Em duas palavras eu diria que com muita coragem, muita determinação, com muita vontade de combater um outro mal associado à corrupção, um mal a que se chama impunidade. Portanto, se tivermos a coragem, a determinação de combatermos a impunidade, com certeza que conseguiremos vencer a batalha da luta contra a corrupção. O problema da má gestão dos recursos públicos é que se criou na nossa sociedade a mentalidade de que tudo que é do Estado é para se cuidar de qualquer forma não há contas a justar a ninguém, não há patrão. Portanto, temos de trabalhar no sentido de inverter esta mentalidade com um conjunto de medidas que eu não vou enumerar aqui, nós ainda não somos Governo, pretendemos sê-lo depois de 23 de Agosto…”

 

ANÁLISE: Na qualidade de candidato número um pela lista do MPLA, como é possível que alguém que se propõe ser Chefe de Estado, Presidente da República, o principal gestor do país, dizer que não pode enumerar as medidas que vai tomar para combater a corrupção, sendo ele próprio o primeiro, nos comícios, que começou por dizer que uma das bandeiras da sua futura gestão, caso seja eleito, é “o combate à corrupção”?! Recordo que o MPLA já se tinha comprometido em 2012 “combater a corrupção, a criminalidade organizada e económico-financieira (subcapítulo II do “1.1.1 – Domínio da Justiça – do capítulo “1” – Consolidar a paz, reforçar a democracia e preservar a unidade e coesão nacional). Portanto, “combater a corrupção” não é uma promessa nova do MPLA. Qual é o balanço desse combate pelo seu antecessor José Eduardo dos Santos agora que está em fim de mandato?! Cumpriu o que prometeu?! Onde estão os resultados?! João Lourenço nunca vai conseguir enumerar medidas concretas para o combate à corrupção porque NÃO
EXISTEM.

JL não tem ideias concretas para combater esse mal que corrói a sociedade angolana. A prova disso é que não se percebe como um candidato que pretende conquistar a confiança do povo angolano não consiga dizer a sua estratégia, mesmo que de forma geral, como vai combater a corrupção, já que se sabe que muitos envolvidos em escândalos de corrupção pertencem ao seu partido: MPLA! Vai ou não “corrigir o que está mal” como está a prometer?! Como se vai confiar a gestão de um país num cidadão que não dá nenhuma garantia de ter soluções concretas?! Para combater o principal problema que Angola atravessa neste momento (a corrupção), o candidato do MPLA e os demais candidatos a Presidente da República devem dizer aos angolanos como o vão fazer. Tem de estar claro. Das duas uma: ou João Lourenço não tem noção da dimensão da infecção desse cancro para que pudesse prescrever já o remédio indicado e começar a combatê-lo ou está a demonstrar uma grande fragilidade política em não se demarcar do modelo de gestão de JES, o que seria “grave” para a multidão que apareceu nos comícios a dizer que pretendem votar na continuidade. João Lourenço não pode subestimar a inteligência do povo angolano. Não pode pensar que já ganhou e, por conseguinte, não precisa de dar explicações a ninguém. Não é favor à nação dizer como pensa resolver os problemas do país. É sua obrigação fazê-lo, enquanto candidato a Presidente da República de Angola, caso queira merecer a confiança de todos ou pelo menos da maioria dos eleitores angolanos de Cabinda ao Cunene.

Sobre o desempenho da Imprensa neste capítulo

As perguntas sobre a corrupção foram um dar pão à boca de João Lourenço, para não variar. Um jornalista não pergunta para pôr na boca do entrevistado a confirmação do que ele quer ouvir. Quem faz isso não pode ser profissional. Um jornalista deve perguntar o que o interesse público precisa de ouvir de um candidato a Presidente da República. O facto de JL não ter dito nada de concreto, os jornalistas deviam ter rebatido na questão, até porque, no fim da conferência de imprensa, JL ainda ficou à espera que alguém se pronunciasse. O que aconteceu com os colegas?! Ficaram com medo de fazer o seu trabalho?! Ou não tiveram capacidade para perceber que João Lourenço não respondeu nada de concreto?! Quando um entrevistado não responde de forma concreta a uma pergunta, o jornalista deve rebater na pergunta. São regras do jornalismo. Estudaram ou não?! Podiam fazê-la de outra forma de modo a que o entrevistado percebesse que a sua anterior resposta não foi ao encontro das expectativas do interesse público. E João Lourenço é um candidato a Presidente como o é Isaías Samakuva, João Lourenço, Benedito Daniel, Lucas Ngonda e Quintino Moreira. Por que razão com outros candidatos conseguem fazer mais ou menos um trabalho de investigação para satisfazer o interesse público e com João Lourenço ficaram todos electrizados a Mr. Bean?! Será que houve um “pacto de electrificação uniforMe”?!


Não só foi um mau serviço público – o que João Lourenço fez neste capítulo e a imprensa que lá esteve só a ouvir sem rebater! – como uma falta de respeito e consideração a todo o povo angolano dizer que só pode anunciar as suas medidas quando for eleito. Num país normal, João Lourenço, com esse comportamento, não teria nenhum voto, porque ignorou claramente o interesse do público-eleitor. Por outro lado, ainda sobre o combate à corrupção, por que nenhum jornalista conseguiu perguntar sobre o seu eventual envolvimento no buraco financeiro do BESA (Banco Espírito Santo Angola), já que se veicularam notícias dentro e fora de Angola que apontam o seu nome como um dos mentores de crédito malparado naquela falida instituição?! Como é possível, na primeira entrevista com o candidato mais imediato a ser Presidente de Angola, não se ter perguntado se é, de facto, um moralista com moral?! Estamos a falar do possível Presidente da República de Angola, nosso Presidente, cuja conduta, em termos de gestão financeira, deve ser irrepreensível, deve haver transparência. Como é possível que ninguém tenha feito uma pergunta tão óbvia, sob o ponto de vista jornalístico (Interesse Público)?! Será que é por isso que os órgãos e jornalistas presentes foram escolhidos a dedo?! Afinal, o MPLA pretende ou não “Garantir o acesso dos cidadãos a uma informação cada vez mais objectiva, rigorosa e isenta, no domínio da Comunicação Social”, como se propôs cumprir em 2012, cujo mandato ainda está em vigor?!

 

“Outronão”, quais foram os critérios usados para se seleccionar apenas determinados órgãos de comunicação social internos?! Os órgãos ausentes não prestariam um “serviço desejável”?! E por que não se convidou também jornalistas angolanos independentes, se se pretende levar a mensagem real e fidedigna a todos os angolanos de Cabinda ao Cunene?! Há órgãos encomendados para o MPLA?!

 

O MPLA está a violar o seu próprio programa de governação quando disse em 2012, no ponto “1.3”, que garantiria o acesso dos cidadãos a uma informação cada vez mais objectiva, rigorosa e isenta. As palavras não são minhas.

 

Pertencem ao MPLA! Onde está o rigor, a objectividade e a isenção?! O MPLA vai continuar a mostrar reiteradamente aos angolanos que só promete e não cumpre?! Tem confiança que vai ganhar com esse comportamento?! Já tem o nosso “sim” antecipado?! O comportamento de João Lourenço – na resposta que deu sobre a problemática da corrupção – e o da imprensa “seleccionada a M” mostram claramente que o soberano não é tido nem achado nas eleições de 23 de Agosto. Se João Lourenço for eleito, fica a ideia de que o país vai atravessar cinco anos sem ideias anti-corruptivas. Será que João Lourenço e a Imprensa vão fazer melhor na próxima conferência de imprensa no capítulo “Combate à Corrupção” para mostrarem que sabem o que estão a fazer?!

*jornalista de investigação independente