Luanda - A falta de visitas íntimas nas cadeias do país é a razão apontada para os envolvimentos homossexuais. Na Cadeia de Viana, em Luanda, uma das maiores do país, existe um espaço para encontros íntimos entre casais, mas não é usado “por falta de regulamentação”.


Fonte: Nova Gazeta

Privadas de liberdade por longos períodos e sem direito a visitas íntimas, reclusas da Cadeia de Viana de Luanda recorrem a companheiras de cela para se satisfazerem sexualmente.

 

A opção é justificada como uma forma de suprir as necessidades fisiológicas, uma realidade que atesta o aumento exponencial do lesbianismo naquela unidade. Para alguns, o envolvimento com alguém do mesmo sexo era impensável, mas, como a ocasião faz o ladrão, o desejo carnal fala mais alto. “Não sei como aconteceu, é a necessidade”, confessa uma reclusa, que prefere o anonimato.

 

Em liberdade há alguns dias, a antiga reclusa em Viana Josefa Eduardo (nome fictício) confirma os casos de envolvimento entre mulheres. Conta que tudo acontece diante dos olhos das guardas prisionais.

 

“Os guardas sabiam, algumas vezes eram separadas as celas”, lembra e nota que algumas reclusas “já traziam esses hábitos de fora”. Os ciúmes entre parceiras têm causado inúmeros problemas, como lutas entre as detidas. “Neste momento, estão na comarca de Viana cinco mulheres com hormonas masculinos elevados, com comportamentos masculinos marcantes”, diz Josefa.

 

Outra detida, também forçada a mesmas práticas homossexuais, revela ter descoberto a sua atracção por mulheres mesmo antes de ter sido presa, mas admite a possibilidade de que seja bissexual.

 

As reclusas atribuem culpa à direcção da cadeia, por manter encerrado o quarto conjugal que está destinado a encontros entre casais. “Se a direcção do presídio quer terminar com o lesbianismo, deve pensar seriamente na abertura do quarto”, afirma a detenta.

Sexo em troca de comida

Nas celas masculinas da mesma unidade, o cenário é diferente.Detidos chegam a ser violentados por outros. No ano passado, Gomes Ribeiro (nome fictício) esteve detido na Comarca da Viana por posse ilegal de arma de fogo. Garante que lá a situação é “rija”. “Se não pertenceres a um grupo ou não tiveres pessoas conhecidas, dificilmente se consegue sobreviver”, conta. Para ele, foi mais fácil, pois antes pertenceu a famosas gangues, como ‘Os Metralhas’ e ‘Os Alameda’. Entre os vários episódios que presenciou, Gomes lembra que a alimentação era rigorosa.

 

“Um pouco de comida que pode ser o matabicho, almoço e jantar até às 12h. E tens de esperar a alimentação da família. E, se não tiveres família, acabas por virar “prostituta”, lembra o jovem, que acrescenta que há sempre alguém disponível a ‘ajudar’, mas a um custo. “Sempre aparecerá um camarada que te vai propor comida em troca de sexo.”

 

Do tempo que lá esteve, lembra que a convivência era “complicada”. E muitos reclusos, principalmente os novatos, são obrigados pelos ‘chefes’, como são chamados os mais antigos, a envolver-se sexualmente com semelhantes. “Muitas vezes, acontece no momento do banho. Se não tiveres cuidado, eles agarram-te e violam-te.” Vítimas calam-se por receio de retaliação dos prevaricadores.

Visitas íntimas em estudo

Fonte dos Serviços Prisionais do Ministério do Interior confirma ao NG os relatos sobre práticas homossexuais na Comarca de Viana e assegura que a situação preocupa a direcção penitenciaria. Segundo a mesma fonte, as autoridades elaboraram um estudo sobre essas incidências nas cadeias do país, sendo que, neste momento, está em curso um estudo que visa regulamentar a utilização dos blocos conjugais, já existentes no país desde 2010.

 

Actualmente, apenas a Cadeia de Viana tem disponíveis estes blocos, mas ainda sem uso por falta de uma regulamentação. As autoridades avaliam expandir a medida para as outras cadeias “em breve”.

A realidade pelo mundo

Em Portugal, o Código de Execução de Penas, aprovado em 2011, prevê que qualquer recluso que esteja preso há mais de seis meses possa ter um encontro sexual pelo menos uma vez por mês, durante três horas. Um antigo director dos serviços prisionais daquele país disse ao diário local ‘Público’ que a criação de um espaço de visitas íntimas entre o recluso e a sua companheira contribui “para o equilíbrio psicoafectivo do recluso, da família e, eventualmente, de tensões no interior da instituição prisional”. Outros estudos mostram que a medida pode levar a uma diminuição da violência nas prisões e nos índices de reincidência criminal.

 

No Brasil, o direito foi formalizado em 1984 apenas para homens, mas foi estendido a mulheres encarceradas mais tarde. Por sua vez, o Canadá estipula dois meses para que os prisioneiros recebam, durante 72 duas horas, as esposas e familiares num apartamento para o efeito. O direito inclui cozinhar e brincar com crianças durante esse período.