Cunene - Espero, antes de mais, que, no fim dos seus mandatos governativos, estejam em ótimas condições de saúde em companhia das suas famílias. Endereço-lhes esta reflexão em gesto de missiva com exausto sentimento de tristeza e de vergonha, ao mesmo tempo, para não dizer de revolta. Cresci sempre a ver os camaradas Kundi Paihama e Pedro Mutindi, como os mbwale da nossa tribo nyaneca-nkumbe, e como governantes provinciais e ministeriais, no governo do MPLA. Fui educado a respeitá-los e a tê-los sempre em consideração como exemplo de referência de bons camaradas a seguir na nossa tribo e não só. Anos passaram e fui crescendo em idade, em formação intelectual e em experiência humana. Felizmente, já presenciei três governações mais marcantes na história do Cunene. Duas delas dos nossos tatekulu nyaneca-nkumbe: (1) a do General Kundi nos finais dos anos 70 e agora 2016-2017; (2) a do Mutindi, desde a Castanheira, anos 80 até 2008, e é a mais longa de todas, quase 20 anos de governação e (3) de um ambó (cuanhama), a do Didalelwa, de 2008-2016. Cada uma das três governações nos oferece momentos oportunos de reflexão e, consequentemente, devidas ilações a tirar. Os historiadores honestos, isentos, descolonizados e despolitizados, um dia nos trarão, em livros, os factos crus e nus dessas governações.

Fonte: Club-k.net

Eu porém, como filho originário da tribo nyaneca-nkumbe, ao fazer uma séria reflexão sobre a governação do tatekulu Paihama, no Cunene, e fazendo um recuo no tempo, até à governação do mbwale Mutindi e em gesto de balanço, fiquei, deveras triste, revoltado e confuso com atuação destes dois políticos da nossa tribo.

Sempre ouvi dizer que uma sólida educação humana e a formação académica de qualidade, são o melhor investimento e a melhor herança ou presente que os pais, ou as pessoas que amam, podem deixar aos seus filhos, como riqueza inalienável. Porque uma pessoa, com uma formação académica verdadeira e humanista, pode respeitar os outros nos seus direitos fundamentais, e não só, pode exercer a justiça e promover os outros em ordem ao desenvolvimento em todas as vertentes humanas. Também uma pessoa formada, à partida, está capacitada para gerir, no sentido material, os bens que os seus pais lhe possam ter deixado como herança. É sabido, também, que a formação é o motor e alavanca do desenvolvimento humano, civilizacional, sociocultural, económico e democrático das nações. Se olharmos para as nações do primeiro mundo (o chamado ocidente), vemos milhões e milhões de dólares investidos na pesquisa científica, através de bolsas de estudos para doutorandos, pós-doutorados e cientistas nas universidades, gabinetes de estudos e laboratórios, verdadeiros incubadores de ideias e de inovação. Os frutos desses investimentos são os medicamentos, as técnicas e equipamentos na saúde, o desenvolvimento exponencial dos meios tecnológicos refletido na área informática, com iPhones e iPads, na aeronáutica, no fabrico de armamento, de automóveis, de vestuário e de calçado. Também é assim na agricultura de produção industrial para os bens de consumo, na engenharia e arquitetura urbanística e paisagística, na robótica e no fabrico de maquinaria de todo tipo, etc. etc.

Por isso, ao refletir sobre as guerras palacianas que se instalaram entre o Sr. Charles (assessor do general Kundi) e o empresário Zé Brigadeiro (membro do comité central do MPLA) e o empresário Abílio Lubamba (membro do comité provincial do MPLA, e ambos da nossa tribo nyaneca-nkumbe) e o tribalismo atualmente existente no governo provincial do Cunene e olhando para as funções importantes já exercidas pelos camaradas Kundi e Senhor Mutindi, fico estranhamente alarmante pelas conclusões para nós os nyaneca-nkumbe da província do Cunene. Por isso, é de recordar que:

- O camarada Paihama foi: (1o) Comissário do Cunene e como coordenador nas provinciais do Huambo e do Bié, como governador provincial de Luanda, da Huila e de Benguela e, ultimamente, do Huambo e, agora, do Cunene, e depois (2o) foi ministro do interior; ministro de segurança de estado; ministro da inserção e controlo estatal, ministro da defesa, ministro dos antigos combatentes e veteranos da pátria.

- O camarada Mutindi foi (é), Comissário e governador do Cunene e, agora, do Cuando Cubango e foi ministro de Hotelaria e Turismo.

Durante esses preciosos longos anos de oportunidades de poder político e económico, nunca, o tatekulu Kundi e o mbwale Mutindi, ajudaram formar quadros, nem promover academicamente homens e mulheres da nossa tribo nyaneca-nkumbe, dando bolsas de estudos aos nossos filhos e mandando-os para as boas universidades dentro e fora do país. À conta dessa falta de quadros da nossa tribo, vemos as contradições no staff dos dois mbwales. Sempre tiveram os Ambós como secretários e diretores de gabinetes e pessoas mais próximas. Porque será? Isso quer dizer que os ambós tem mais formação e são mais trabalhadores do que nós nyaneca-nkumbe?

Porque não nos confiam os seus gabinetes, onde se exerce o verdadeiro poder e os segredos onde eles pensam se escrevem, mas ao invés disso, nos dão muitas “ordens de saque”!

Como intelectual, eu interrogo-me: os camaradas Kundi e Mutindi será que nos amam verdadeiramente como nyaneca-nkumbe? Como disse, atrás, a maior riqueza inalienável e a garantia do futuro que os pais, que amam, podem deixar aos seus filhos, não são os cargos políticos ou gestão de empresas públicas, mas sim uma boa educação e uma formação académica de qualidade. Por isso, olhando para nós os nyaneca- nkumbe, fica-se com a ideia, felizmente (?), de que somos os empresários mais ricos e bem-sucedidos no Cunene (como são os casos dos empresários Charles, Lubamba, Zé Brigadeiro, Tulumba, todos nyaneca-nkumbe), com o dinheiro das “ordens de saque”. E como afirmara, um dia, o doutor Pahula que nós os nyaneca-nkumbe somos a tribo maioritária no Cunene, pergunta-se, contudo, onde estão, então, os quadros, da nossa maioritária tribo, fruto do apoio de muitos anos das governações e do poder político e económico dos camaradas Kundi e Mutindi? Como podemos rivalizar com Ambós se eles têm quadros bem formados, educados, competentes e nós quase nada? Todos os ovashamane Ambós do Cunene ligados à política, têm os seus filhos com formação universitária, quadros competentes, e os nossos filhos nyaneca-nkumbe, quase nada. Só ficamos a vender cabritos na praça e fazer de táxis de motos. Até o próprio mbwale Mutindi, o tatekulu Kundi não têm todos os seus filhos com formação universitária. O nosso único doutor Ovídio Pahula, infelizmente não está humanizado. É um arrogante e prepotente que está sempre a nos envergonhar. Como podemos confiar nele para um futuro dirigente se até a nós, os nyaneca-nkumbe, insulta e ofende dizendo que somos analfabetos, gentios e arruaceiros e não estudamos na Europa como ele. Infelizmente, a porrada pública dada ao Charles por Zé Brigadeiros e a carta de lamúrias feita pelo Sr. Lubamba ao Bureau Político do MPLA queixando-se puerilmente do Zé Brigadeiro, não serão provas do que refletiu do Dr. Pahula sobre nós nyaneca-nkumbe?

Infelizmente, os camaradas Kundi e Mutindi nunca nos promoveram intelectual e academicamente para competirmos de igual para igual com os Ambós. E é ai onde está o nosso maior erro histórico, estratégico e dai a nossa maior desgraça. Angola está prestes a mudar de rumo. O presidente da república de Angola eleito falou, nos seus discursos de campanha, que é tempo de acabar com a corrupção, com compadrios, com impunidades, com amiguismos, com incompetência, colocando pessoas capazes nos

lugares próprios, isto é, dar mérito a quem é capaz e com formação. Nesse sentido, sinto-me perplexo com o futuro da nossa tribo no Cunene, sem quadros nem em quantidade nem em qualidade. Por isso, em consequência dos conflitos e tribalismo que se instalaram no Cunene, por causa da atuação do tatekulu Kundi e dos seus assessores e conselheiros, eu mesmo sendo nyaneca-nkumbe, me interrogo:

1. Como posso querer apagar da minha memória e não ter saudades da figura do Didalelwa se foi graças ao seu empenho, ao trazer a universidade para o Cunene, que eu fiz a minha licenciatura, e enquanto antes, o camarada Mutindi, como governador do Cunene, sempre travou a vinda da Universidade pública para os filhos do Cunene se licenciarem a fim de servir a província com competência e sentido crítico!

2. Como posso ignorar Didalelwa se foi graças a ele que os meus filhos tiveram bolsas de estudos e declarações de autorização para os estudos universitários em Luanda, em Benguela e no Lubango e que, graças a Deus, regressaram formados para ajudar no desenvolvimento da nossa província!

3. Como posso criticar Didalelwa se foi ele quem deixou mais quadros, de todas as tribos (para quem quis estudar), formados na província, ao autorizar toda a gente a estudar e facilitou bolsas de estudos quer internas ou externas que no tempo do mbwale Mutindi as tais bolsas eram “escondidas”! Basta ir aos arquivos do governo do Mutindi, do Didalelwa e do Kundi para ver quem é o governador que, com visão de futuro para formação de quadros para a nossa província, mais deu declarações de autorização de estudos e incentivou todos a se formarem. A título de exemplo, antes da governação do Didalelwa, os únicos doutores que tínhamos, no Cunene, eram só os nossos padres da igreja católica, frutos do esforço e da visão do velho Bispo Fernando Kevanu.

4. Como cristão que sou, como posso esquecer Didalelwa se foi ele quem nos deixou construída a emblemática Igreja Catedral em Ondjiva e reabilitou outras igrejas para podermos orar e louvar o nosso Deus que nos protegeu no tempo da guerra, da fome, das cheias e da seca!

5. Como posso desprezar Didalelwa se ele foi capaz, com amor ao seu povo, de construir uma Igreja e escola na sua aldeia natal para o seu povo e nós no Humbe, terra do nosso camarada Mutindi, rezamos e estudamos em baixo de Árvores!

6. Como podemos rivalizar com os Ambós se eles tem muitos filhos padres formados (quase todos doutores), três bispos e nós os nyaneca-nkumbe, como tribo maioritária no dizer do dr Pahula, só temos dois padres no Cunene, e os nossos filhos nyaneca-nkumbe não terminam os estudos para serem padres, saindo das missões dos padres interessados apenas em cargos políticos e amor ao dinheiro!

7. Como posso esquecer Didalelwa se foi ele quem nos trouxe a água, deixou a ponte sobre o rio Cunene e construiu a bela Sede do governo provincial, um palácio novo, estradas e ruas asfaltadas em Ondjiva, ao contrário do tatekulu Mutindi que nos deixou um palácio e a sede do governo prefabricados e as estradas que nem duravam um ano de chuvas!

8. Como posso apagar Didalelwa da minha memória se foi o governador que mais tentou criar unidade e convivência pacífica entre os cunenenses que até os empresários nyaneca-nkumbe, Zé Brigadeiro, Charles, Lubamba, Tulumba naquela altura conviviam juntos e agora andam em guerra campal!

Tatekulu Kundi e mbwale Mutindi, aceitemos os nossos erros estratégicos e a falta de visão para a nossa tribo e para província do Cunene em geral, porque isso nos custa muito caro agora e no futuro. Por exemplo, o tatekulu Kundi, general destacado e com influência nas ostes militares, nunca promoveu (entre os nossos destemidos tropas quer seja nyaneca-nkumbe ou Ambós) no exército para altas patentes! Pior de tudo, impediu a progressão e nomeações para cargos de destaque, nas altas patentes e nas chefias militares, homens ambós e não só, impedindo, assim, que o sul de Angola tenha portas abertas a nível de patentes no exército em tempo de paz.

Por isso, estamos nus e despidos, sem grandes quadros, enquanto tivemos dinheiro e poder nas mãos e as facilidades governativas para investirmos nos estudos para nossos filhos, futuros dirigentes deste país. Agora estamos atrapalhados com os quadros ambós e com a sua hegemonia e competência intelectual na província e com o presidente eleito chegam as mudanças e a forma de gerência no cargos públicos.

Em jeito de conclusão, deixo uma palavra ao mbwale Charles, assessor do tatekulu Kundi, que ao perseguires os bolseiros de estudos, autorizados, e bem, pelo governador Didalelwa para universidades internas e externas, coagindo-os para voltar para o Cunene sem terminarem os seus estudos e ameaçando-os eliminá-los da função pública, estás a cometer um erro gravíssimo para o futuro da nossa terra. Um dia

seremos governados por gente de fora da província porque não tivemos visão de formar nossos quadros no momento exato da viragem da história política de Angola. As pessoas de Luanda, de Cabinda, de Benguela, do Huambo, de Malanje, etc. etc., com uma visão de futuro, estão a formar os seus filhos, quer nas universidades dentro de Angola, quer fora de Angola para um dia serem eles os nossos administradores municipais quando houver eleições autárquicas, porque são eles que estão à altura desses cargos, já que estudaram para isso. Se nós brincarmos, impedindo que nossos filhos estudem e sejam bem formados em diversas áreas, e sobretudo na área administrativa, seremos eternamente guardas das riquezas dos grandes do poder em Luanda. O Dr. Didalelwa teve visão, ao incentivar todos a estudarem e ao facilitar-lhes bolsas de estudos, por isso, deixou a província cheia de quadros superiores. Mbwale Charles, com essa tua comissão contra a educação e contra os bolseiros no Cunene, estás a cometer o erro grave, não só privando a província dos quadros universitário bem formados naqueles cursos que nós ainda não temos no Cunene, não também contribuindo para que o MPLA seja odiado e no futuro perca votos. Estás a criar o descontentamento entre os estudantes e seus familiares que veem seus sonhos a ser amputados no meio do percurso académico e com isso estás a criar condições para a oposição ganhar voz e influência no Cunene. Tenho dito.