Luanda - Em termos jurídico-político a Constituição constitui um conjunto de normas jurídicas fundamentais que definem a estrutura, os fins e as funções do Estado, a organização, a titularidade, o exercício e o controlo do poder político e fiscalização do acatamento das normas constitucionais. Ela portanto, simboliza nesta perspectiva, o pilar ou alicerce basilar de qualquer Estado de Direito.

Fonte: Club-k.net

A cultura na Constituição de Angola

A sua função neste âmbito será de garantir um estatuto jurídico do poder político. A Constituição como a Carta Marga de um Estado, ela estabelece a estruturação do Estado (normativa) a sociedade e releva os sectores fundamentais que coadjuvam nos seus funcionamentos. Embora, a Constituição angolana aprovada em 2010, alargou no que concerne aos direitos e garantias fundamentais dos cidadãos e elevou à uma posição de paridade o costume (direito consuetudinário) ao direito positivado. A Constituição também dedicou algumas normas a cultura, este com dignidade constitucional, quando o dispositivo legal afirma no n.o 1 do artigo 43.o/CRA que «é livre a criação intelectual, artística, científica e tecnológica». Fazendo uma interpretação extensiva deste artigo, como refere o n.o 2 do mesmo dispositivo legal, que esta liberdade compreende, o direito à investigação, a produção e divulgação da obra científica, literária ou artística, incluindo aqui já, a protecção legal dos direitos de autor.

 

Apesar desta forma tácita estabelecida na Carta Magna, e a forma de abordar sobre cultura em Angola, parece-nos que entra em falta, não só por causa das ineficiências das políticas públicas em prol da cultura, aprovados não ter surtido os efeitos desejados, mas pouco ou nada se denota no que concerne ao fazer das instituições do Estado, como também dos próprios agentes da cultura e as industriais culturais. Em termos forma de esclarecimento, cientificamente o que é esta coisa que se pode entender por cultura, seja numa perspectiva sociológica ou antropológica da palavra em si, para que assim, possa afluir mais o nosso debate sobre o paradigma que tornou-se essencialmente pertinente para o fomento do debate académico e popular, já que há uma propaganda enorme por parte do Estado e dos agentes na questão do resgatamento dos valores morais e culturais, dado a penetração «feroz» da cultura de outros povos em Angola e abafando de uma forma impiedosa a cultura angolana.

 

O termo cultura, etimologicamente - colere, cultivar ou instruir; cultus, cultivo, instrução, não se restringem somente ao campo da antropologia. Portanto, várias áreas do saber humano – agronomia, biologia, artes, literatura, sociologia, história etc. – valem-se dele, embora seja outra conotação. Muitas vezes, a palavra cultura é empregada para indicar o desenvolvimento do indivíduo por meio da educação, da instrução (EVA LAKATOS e MARINA MARCONI, 2010: 130). Nesse caso, uma pessoa «culta» seria aquela que adquiriu domínio no campo intelectual ou artístico. Já os antropólogos não empregam os termos culto ou inculto, de uso popular, e nem fazem juízo de valore sobre esta ou aquela cultura, pois não consideram uma superior à outra. Elas apenas são diferentes a nível de tecnologia ou integração de seus elementos. Todas as sociedades – rurais ou urbanas, simples ou complexas – possuem uma cultura. Com isso, não há indivíduos humanos desprovidos de cultura, excepto o recém-nascido e o homo ferus; um porque ainda não sofreu o processo de endo-culturação e a outra, porque foi privado do convívio humano. Ou seja, a cultura tem significado amplo, engloba os modos comuns e aprendidos da vida, transmitidos pelos indivíduos e grupos, em sociedade.

 

Com isso, a cultura de qualquer sociedade ou Estado, ela consiste na soma total de ideias, reacções emocionais condicionadas a padrões de comportamento habitual que seus membros adquiriram por meio da instrução ou imitação e de que todos, em maior ou menor grau, participam. Nisto encontramos dois sentidos ao próprio termo em si, um que geral, transmuta a significação à herança social total da humanidade e a outra é, isto mais específico, referindo-se a uma determinada variante da herança social de um povo. É nesta vertente de herança cultural de décadas e décadas de hábitos e práticas que fora transmitida de geração em geração em Angola dos vários povos que habitam neste território desde os primórdios que se luta à preservação e revitalização. Este modo de estar encontrou a sua maior expressão de divulgação na literatura e ensino de artes cénicas, cujos protagonistas deste enaltecer da cultura e identidade cultura do povo angolano foram os jovens intelectuais da década de 1940 e 1940. Embora que algumas palavras sem consoantes mudam, acerca do estado da cultura e as industrias culturais em Angola, nem sempre essa percepção, é toda ela mal. A existência de mal-entendido em determinados sectores as vezes causa estranheza. É sonante a concordância da discussão sobre a revitalização da cultura e a fortificação da identidade cultural, seja ela por hábitos adquiridos, seja por insuficiente postura cívica, muitas pessoas dotadas de saber (alguns) que se libertaram das amarras político-ideológicas acreditam a haver uma imperiosa necessidade de se discutir sobre as políticas públicas da cultura. Estas que muitas das vezes e tem surtido efeitos desejados. Muitos intelectuais também e, é importante mencionarmos isto, não têm tido coragem de pensar livremente, isto fora das amarras institucionais e levantarem barreiras a indivíduos ou instituições que atrasam o progresso da sociedade angolana. Por isso, o debate em torno das políticas públicas da cultura é viciado ou vai sendo viciado nos seus pressupostos e não vinca.

 

Várias personalidades imbuídas de modernidade e saber sobre a matéria, algumas ligadas ao campo académico têm expressado as suas fecundas ideias, mas isso não significa que o campo académico, no seu todo, tenha as mesmas concepções e a mesma vitalidade na discussão. Não me parece que, a nível das associações culturais e associações académicas isoladas ou não, haja fomentação de um debate fortemente musculado para se chegar ao amago da questão. Os poderes públicos e a sociedade em geral devem participar no sentido de dar maior impacto na discussão. Porque uma das razões dessa fragilidade é a própria natureza do regime político em Angola que se tem instalado, indirectamente tem inibido as críticas construtivas que muitos intelectuais não ligados ao regime têm tecido para revitalização da cultura angolana e a eficiência e eficácia das políticas publicas da cultura, mas as suas considerações não tem encontrado espaço ou solo fértil para brotar as linhas necessárias para galvanização do debate.

 

Acerca desta matéria, o velho nacionalista angolano radicado em Portugal, ADOLFO MARIA (2013: 9), comenta que, na comunicação social angolana, verifica-se que, existe um aparelho estatal de enorme peso, dirigido por indivíduos não só servidores como “bajuladores” do Poder, e do outro lado, alguns órgãos de comunicação onde é notório o exacerbado facciosismo e concepções retrogradas dos seus dirigentes. Assim, temos má qualidade informativa assente na realidade deturpada ou no fabrico de factos (...) ou de fundo, feitos muitas vezes à base do ajuste de contas e do insulto mais soez, nada contribuem para um debate de ideias nem para a vontade de discutir os problemas. A par destes exemplos extremos citados, há comunicação social e jornalistas que se empenham em noticiar, levantar questões, opinar, contribuindo meritoriamente para suscitar debate a nível nacional, mantê-lo e aprofunda-lo. E para que o debate avence e toma os níveis desejados será necessário amplificar o número de actores com qualidade (ao nível do saber e da postura cívica – tão necessária ao progresso de uma sociedade). Isto servira de mola para alavancagem que ajudara-nos a todos a reler e reflectir sobre o estado das políticas públicas da cultura e o debate nacional que se deve arquitectar em volta dela e, encontrarmos os caminhos que podem nos levar ao desenvolvimento cultural sustentável e um pensamento intelectual com capacidade de pensarmos sobre o país, sobre o povo angolano e sobre a cultura angolana com liberdade sem pressões político-ideológicas.

 

As entidades políticas reconhecem essa necessidade, porque o próprio ex- Presidente da República, Eng.o JOSÉ EDUARDO DOS SANTOS, na Cerimónia de Abertura da II Sessão Legislativa da III Legislatura da Assembleia Nacional, tinha defendido a promoção e projecção regional e internacional das nossas figuras de destaque no domínio cultural e o registo e reconhecimento internacional dos bens culturais materiais e imateriais que simbolizam a nossa identidade. Para atingirmos essa meta, das sementes lançadas pelo Eng.o JOSÉ EDUARDO DOS SANTOS na altura, acredito que é necessário fortificamos o processo de educação e ensino. Mas um ensino virado para o desenvolvimento e progresso. A educação é, em primeiro lugar, o desenvolvimento, e o desenvolvimento humano como, aliás, o de outra qualquer criatura viva, é de dentro para fora, como surgir de potencialidade latentes à espera de manifestação. Concomitantemente abrir-se, desvendar-se, desabrochar, tornar-se aquilo que de algum modo já se é, mas em germe, ultrapassando-se continuamente.

 

O homem em si, é um ser em constante devir, não é só o que já é, mas também o que ainda não. Não é só um ser, mas principalmente um poder ser. Por essa razão, existe no homem-ser um homem latente que se quer revelar na sua plenitude total, no fundo, é a revelação de que, o homem já é o que ainda não é. O desenvolvimento é um processo e possui uma característica gradual, embora exista certos estádios, ou seja, apesar de determinados autores referenciarem determinados estádios, ela é univocamente aceite, que é um crescimento contínuo. E, ela não é feita de uma forma linear, não corresponde apenas um processo de maturação ou amadurecimento, é importante organizar-se ao redor de algumas viragens ou períodos de maturação que coloca ou questiona os elementos constitutivos de maturação anteriores, transpondo desta forma os indivíduos para outros níveis. A educação no seu sentido amplo, esta associada com a família, as igrejas, a comunicação social, as associações da sociedade civil e o próprio Estado, e é por essa razão, que usualmente estamos aculturados a ouvir que a escola serve apenas para ensinar, já que a educação deve ser dada pelos país em casa. Hoje nas sociedades contemporâneas, tal afirmação não corresponde à verdade, porque o conceito de ensino, enquanto processo de transmissão de conhecimentos, habilidades e hábitos (educação no sentido restrito), deve ou deverá sempre esta associado e interligado com todas as instituições que formam a sociedade para a eficiência do trabalho educativo. Os pais e ambiente familiar a título de exemplo, apesar da importância que acarentam no processo educativo, não podem perder hoje de vista uma grande realidade, que deixaram de possuir o monopólio da educação. Portanto, têm de contar com a influência de todo o ambiente familiar, dos grupos e do ambiente social ou cultural que moldam os educandos e vivem dia-dia.

O papel dos pais é importante, mas as vezes torna-se praticamente ineficaz, se o ambiente familiar e societal não lhe corresponder. Por isso, mais do que nunca, a transmissão de normas e conselhos dos educadores torna-se cada vez mais importante para identificação do educando com as figuras familiares e de interiorização ou assimilação vital dos valores, atitudes e estilo de vida deste mesmo no ambiente que a família influi, para o bem ou para o mal. Mas mais do que de normas, absolutamente necessária, trata-se de um estilo de vida apontar com a própria vida da família e posteriormente com a sociedade em geral. É por essa razão que hoje, a família como núcleo fundamental da sociedade tornou-se ou tem a tendência de tornar-se mais aberta e a sua responsabilidade mais partilhada. E, a presença de uma boa família é hoje mais necessária do que nunca, sobretudo no campo efectivo, porque a pessoa, enquanto ser bio-psico-social e ser eminentemente político e cultural, possui várias dinâmicas de interacção com o seu próprio-eu, com a família, com os amigos, com a comunidade em que está inserida, com os meios de comunicação social, com as novas Tecnologias de Informação e Comunicação (NTIC), com o mundo a que pertence.

Daí que, a escola, como instituição social tenha a tarefa de, não só, ensinar mas também, de educar para a vida, concorrendo, assim, para o estabelecimento de indissociáveis alianças, tais como; teoria/prática, escola/família, escola/comunidade, ensino/educação, educação/ética, educação/desenvolvimento. E o desenvolvimento ao implicar na interiorização de um amplo conceito de educação, tem como fins; o exercício da cidadania, a actividade laboral, afirmação da identidade cultural e o respeito pelas demais, a prática da solidariedade social e internacional.

Assim sendo, há um conjunto de necessidades educativas a serem adquiridas por toda a sociedade e não apenas pelas camadas mais jovens, como tradicionalmente, vinha sendo consumado. Face a estas necessidades centram-se as chaves para a educação para o desenvolvimento do futuro, melhor se compreende o papel das instituições de educação e de formação, bem como do professor/formador enquanto promotor do crescimento económico, do desenvolvimento sustentável e, consequentemente, do bem- estar social. No mundo contemporâneo, a educação passou a assumir-se como um processo, que deve acompanhar todo o tempo de vida de um qualquer ser humano. A educação configura assim, um conjunto de vertentes muito diversos que podem ser sintetizados na existência de duas formas principais do processo educativo: a primeira na educação formal e a segunda na educação não formal.

No entanto, as necessidades de educação não se resumem hoje apenas à educação inicial – que comporta o ensino básico (pré-escolar e escolar), secundário, profissional e superior, mas também integra a formação contínua com diversificados modelos de formação profissional (actualização, reciclagem, extensão e reconversão) e de formação contínua a nível superior. Esta última em contexto académico (pós- graduação) ou então, mais dirigida para a investigação e desenvolvimento de unidades produtivas (formação avançadas). Estas vertentes da educação viram todas para o desenvolvimento e surgem, em consequência de três macrotendências da sociedade contemporânea, que são as tendências para: a aceleração da mudança; as assimetrias sociais; e a alteração dos sistemas de poder.

Necessitamos de uma nova pedagogia, uma pedagogia que inclui no seu conceito formal, tanto a acção educativa como a teoria dessa mesma acção, isto a intuição e a imaginação educativa como o conhecimento dos princípios e técnicas pedagógicas. Ela serve-se de variadíssimos elementos de numerosas ciências relacionadas com o homem, porque a educação deve ter presente tudo o que diz respeito ao homem. A luz disso, a ciência pedagógica é entendida ou será entendida como, o conjunto sistemático de conhecimentos relativos a um objecto. E não há dúvidas de que a pedagogia é uma verdadeira ciência, pois é um conjunto de conhecimentos relativos à educação, e o seu objecto material é o homem. Nesta acção de orientação do homem, associa-se com outras áreas do saber como, a Biologia, a Psicologia, a Sociologia, a Filosofia e outras áreas do saber, recebendo deles subsídios do seu conteúdo e algumas das bases em que necessariamente se tem de apoiar. E o seu objecto formal, cinge-se no

homem enquanto educável e educando. A pedagogia, ganha consistência, autonomia e unidade no aspecto educacional que dá alma e unidade a todos os elementos que entram na estruturação desta ciência. As exigências da educação e de uma verdadeira pedagogia assentam em três elementos fundamentais: o conhecimento do educando; os objectivos a perseguir e último, os métodos e meios a usar.

É nesta perspectiva que concordo com escritor e ensaísta LUÍS KANDJIMBO (2013: 49-56), quando lança um olhar a nível do continente, que o continente africano, além da baixa taxa de literacia que deverá ser transformada e elevada a outros níveis, incluindo por exemplo a literatura informática para os sectores da força de trabalho qualificado, o comportamento dos segmentos do mercado em que se implantam as industriais culturais estará profundamente dependente do estabelecimento de políticas que conduzam à implantação de infra-estruturas adequadas. Reverter tal situação, significa reduzir a importação de produtos culturais, aumentando a produção interna. Mas a complexidade da problemática, como se vê no Acordo ADPIC da OMC, transpõe as fronteiras de uma visão meramente culturalista.

Todavia, a problemática remete sobretudo para uma redefinição do conceito de desenvolvimento em cuja extensão deve ser vista a cultura enquanto força motriz. Embora sendo ainda incipiente no país, o recurso às plataformas electrónicas e novas tecnologias da informação, a feliz referência que se faz à protecção de programas de computador deverá, tendo no horizonte o futuro e mais do que uma visão tipicamente empresarial ao propor-se intervencionistas do Estado para um esforço de sensibilização dos autores e usuários de modo a serem atingidos os objectivos de protecção da propriedade intelectual e o estabelecimento de mecanismos de remuneração justa aos criadores.

 

*Politólogo