Benguela - SOBRE APRECIAÇÃO JURÍDICA DOS DESPACHOS DE NOMEAÇÕES EXARADOS PELO TITULAR DO GOVERNO PROVINCIAL DE BENGUELA FACE A APROVAÇÃO RECENTE DO REGULAMENTO E AS NORMAS DE ORGANIZAÇÃO E DE FUNCIONAMENTO DOS ÓRGÃOS DA ADMINISTRAÇÃO LOCAL DO ESTADO - DECRETO PRESIDENCIAL N.º 208/17, DE 22 DE SETEMBRO.

Fonte: Club-k.net

1. Nota Prévia.


Após a divulgação recente dos despachos de nomeações, exarados pelo titular do Governo Provincial e, depois de terem tomado posse os “novos membros” do Executivo Local, auxiliado com a divulgação da Circular n.º 8800/GAB.MAT/2017, de Sua Excelência Ministro da Administração do Território e Reforma do Estado, fui questionado em vários círculos de antigos colegas, amigos e pessoas afins, sobre a apreciação jurídica que se impõe a fazer aos referidos despachos, se o Decreto Presidencial n.º 208/17, de 22 de Setembro é ou não de aplicação imediata? Como fica os anteriores titulares dos Serviços de Apoio Instrumental, dos Serviços de Apoio Técnico, bem como os titulares dos Órgãos Desconcentrados do Governo Provincial que não foram reconduzidos ou nomeados? Quid iuris relativamente aos funcionários das antigas Direcções Provinciais que viram as suas atribuições fundidas ou reduzidas numa única direcção? Enquanto amante do direito preocupo-me, simples e tão-somente com os aspectos jurídicos dos temas que me proponho abordar e no caso em tela, não será diferente. Assim sendo, deixo outras questões estritamente políticas para os políticos profissionais e analistas afins.

2. Despacho.

2.1. Conceito.


Entende-se por Despacho o acto administrativo definitivo e executório proferido no uso legal de um poder discricionário.


Numa linguagem simples e clara, podemos dizer que despacho é a forma que se reveste um acto administrativo, que figura na pirâmide da hierarquia das normas jurídicas, no caso concreto do despacho do titular do Governo Provincial é imperioso que o referido acto revista a forma de despacho para que se torne eficaz e executório, deve ser publicado em Diário da República, ex vi artigo 74.º do Decreto-Lei n.º 16/95, de 15 de Dezembro – Aprova as Normas do Procedimento e da Actividade Administrativa, conjugado com o artigo 14.º do Decreto Presidencial n.º 208/2017, de 22 de Setembro.

 

2.2. Decreto Presidencial.


Sendo o Decreto Presidencial n.º 208/17, de 22 de Setembro, acto político, representando uma das formas de exercício de competência do Presidente relativamente ao funcionamento de outros órgãos e para práticas de actos próprios, vide (Gomes Canotilho, Dir. Constitucional, 3.ª ed.-673), obviamente, figura-se de igual modo na pirâmide da hierarquia das normas. Vale dizer que o despacho do titular do Governo Provincial em momento algum pode contrariar o decreto Presidencial, porquanto, este último encontra-se acima do despacho na hierarquia das normas.

2.3. Apreciação do Decreto Presidencial n.º 208/17, de 22 de Setembro.

O Decreto Presidencial n.º 208/17, de 22 de Setembro, é um diploma legal bastante jovem, pois, foi publicado no dia 22 do pretérito mês de Setembro do ano em curso e entrou em vigor na referida data, por força do artigo 156.º do referido diploma.


O referido diploma regulamenta os princípios e as normas de organização e de funcionamento dos órgãos da Administração Local do Estado, fixando as respectivas estruturas organizacionais, bem como os mecanismos de operacionalização. Quanto ao seu âmbito aplica-se aos Órgãos da Administração Local do Estado nos níveis provincial, municipal e inframunicipal. É um Decreto constituído por 156.º Artigos, VII, Capítulos e I Anexo.


Dito em outros termos, o aludido diploma vem regulamentar a Lei n.º 15/16, de 12 de Setembro, Lei da Administração Local do Estado que estabelece os princípios e as normas de organização e funcionamento dos Órgãos da Administração Local do Estado.


Em bom rigor, o supracitado Decreto Presidencial veio trazer órgãos e serviços novos no sentido de ajustar o exercício do Poder Local à nova dinâmica da Administração Local do Estado, impondo critérios objectivos no sentido de dar respostas a várias questões existentes, tudo com vista ao prosseguimento do interesse público.


Chamamos a colação a título de exemplo, os órgãos novos emanados a luz do Decreto Presidencial em epígrafe, o caso do Presidente e Vice-Presidente da Comissão Administrativa, Administrador e Administrador Adjunto do Distrito Urbano, o Administrador da Cidade, Administrador de Vila, Administrador de Bairro ou Povoação, Administrador de Aldeia, bem como, os Serviços de Apoio Executivo, designado pelo diploma por Gabinete Provincial, substituindo a anterior designação de Direcções Provinciais. Ou seja, com a materialização deste Decreto as Direcções Provinciais deixaram de existir.


Como se não bastasse, o referido diploma veio aglutinar algumas Direcções Provinciais num único Gabinete, a título de exemplo, as Direcções Provinciais da Agricultura e das Pescas, foram fundidas para um único Gabinete que a luz do diploma em questão, passará a designar-se “Gabinete Provincial de Agricultura, Pecuária e Pesca”.

 

3. Dos Despachos de Nomeações do Titular do Governo Provincial.

Tal como vimos anteriormente, o despacho do titular do Governo Provincial é um acto administrativo definitivo e executório proferido no uso legal de um poder discricionário. Neste sentido, a Lei n.º 15/16, de 12 de Setembro não obsta que o referido titular exare despachos.
Porém, o quesito essencial que se coloca é se o referido titular a luz dos diplomas mencionados poderia ou não nomear os responsáveis dos novos órgãos que compõe a estrutura no Governo Provincial a luz do Decreto Presidencial n.º 208/17, de 22 de Setembro?


Prima facie, parece-nos que o próprio Decreto Presidencial neste sentido é bastante, na medida em que, elucida-nos a necessidade de adequação dos Estatutos Orgânicos das Administrações Provinciais, as Comissões Administrativas do Município e as Administrações Municipais, Comunais e de Distrito Urbano, de Cidade, de Vila, Povoação e Bairro, nos prazos 2 anos, 365 dias e 120 dias, conforme o caso, tal como determina o artigo 154.º do referido Decreto.


Isto porque, não se deve nomear os titulares dos órgãos de Direcção e Chefia, sem antes ser aprovado o Estatuto do respectivo Governo Provincial.


No caso vertente, com a Lei n.º 15/16, de 12 de Setembro, o Decreto Presidencial n.º 208/17, de 22 de Setembro, competia os órgãos de apoio técnico coordenar a elaboração do novo Estatuto do Governo Provincial e posteriormente remeter a entidade competente para aprovação e publicação em Diário da República.


Após aprovação do referido estatuto, devidamente adequado a nova estrutura orgânica, e depois de ouvido os órgãos centrais de especialidade de alguns Gabinetes estariam as condições criadas para a concretização, dos despachos de nomeações.


Vale ressaltar que, é ponto assente pela doutrina que nos casos de existir anterior titular de um determinado órgão, primeiramente deve-se emitir o competente despacho de exoneração para posteriormente ser exarado o despacho de nomeação. É o caso, das recentes nomeações dos titulares da Secretaria, do Gabinete de Estudo e Planeamento que foram nomeados os novos titulares sem antes serem revogados os anteriores despachos, ficando a vigorar dois despachos para o mesmo serviço.


Aliás, essa tese não é só defendida por nós, também é defendida pelo Ministério Administração do Território e Reforma do Estado na sua mais recente Circular n.º 8800/GAB.MAT/2017, de 11 de Outubro.


4. Conclusão.

Aqui chegados, podemos responder telegraficamente às questões levantadas no início:


Se o Decreto Presidencial n.º 208/17, de 22 de Setembro é ou não de aplicação imediata? Como fica os anteriores titulares dos Serviços de Apoio Instrumental, dos Serviços de Apoio Técnico, bem como os titulares dos Órgãos Desconcentrados do Governo Provincial que não foram reconduzidos ou nomeados?


O Decreto Presidencial n.º 208/17, de 22 de Setembro não é de aplicação imediata, porquanto, a sua aplicação prática esta dependente da necessidade de adequação dos Estatutos Orgânicos, conforme determina o artigo 154.º do mencionado Decreto, acolhido pela Circular n.º 8800/GAB.MAT/2017, de 11 de Outubro, logo;


Os anteriores titulares dos Serviços de Apoio Instrumental, dos Serviços de Apoio Técnico, bem como os titulares dos Órgãos Desconcentrados do Governo Provincial que não foram reconduzidos ou nomeados podem manter-se nos respectivos cargos, uma vez que não foram exonerados, nem tão pouco esta aprovado o Estatuto Orgânico do Governo Provincial a luz do novo regulamento.


Contudo, tendo sido induzido em erro o titular do Governo Provincial para que de forma precipitada fossem nomeados e tomados posses os novos titulares dos Gabinetes e face ao acima exposto, pode o titular do governo Provincial dar sem efeito através de despacho de revogação, os actos administrativos dos novos Directores, bem como, por via de ordem de serviço dar sem efeito de igual modo os termos de tomada de posse ora realizados, mantendo a situação anterior (orgânica e funcional) dos respectivos serviços até aprovação do estatuto.

“Amicus Plato sed magis amica veritas”

Bibliografia

Amaral, D. (2006): Curso de Direito Administrativo. Lisboa: Almedina.
Justo, A. (2012): Introdução ao Estudo do Direito. Coimbra: Coimbra Editora.
Feijó, C. e Lazarino, P. (2011): A Justiça Administrativa Angolana. Luanda: Casa das Ideias.
Feijó, C. e Paca, C. (2000): Direito Administrativo. Luanda: Casa das Ideias.
Fernandes, J. (1990) Dicionário Jurídico da Administração Pública. Lisboa: Almedina.
Franco, J. e Martins, Herlander: Dicionário de Conceitos e Princípios Jurídicos. Coimbra: Almedina.

Legislação.
 Lei n.º 15/16, de 12 de Setembro Lei da Administração Local do Estado que estabelece os princípios e as normas de organização e funcionamento dos Órgãos da Administração Local do Estado.
 Decreto-Lei n.º 16/95, de 15 de Dezembro – Aprova as Normas do Procedimento e da Actividade Administrativa.
 Decreto Presidencial n.º 208/17, de 22 de Setembro.
 Circular n.º 8800/GAB.MAT/2017,