Luanda - O portal Maka Angola publicou na edição de 10 de Novembro de 2017, um artigo intitulado “Governador ataca liberdade de expressão no Huambo”, como cidadão que vive e trabalha nesta cidade não consegui perceber até que ponto os factos que envolvem Sua Excelência Sr. Governador Provincial Dr. João Baptista Kussumua e o Sr. Euclides de Castro, constituem ataque a liberdade de expressão.

Fonte: Club-k.net

Não acredito que haja restrição a liberdade de expressão no Huambo, como direito que permite as pessoas manifestarem as suas opiniões e receberem informações por diversos meios de comunicação tradicionais e nas redes sociais por causa deste caso. Por assim crer, vou no presente abordar sobre o caso no âmbito do direito para ajudar a perceber se há ou não, ataque a liberdade de expressão no Huambo; a minha atitude tem como objectivo prestar um contributo a sociedade para ajudar a dissipar as eventuais dúvidas que o artigo levanta e não advogar em nome de uma nem de outra parte.

 

Tendo em conta que a liberdade de expressão faz parte de um conjunto de direitos que nascem com o homem com fim de dignifica-lo tidos como direitos humanos da primeira geração, considerados por Emanuel Kant como sendo os olhos de Deus na terra e garantidos em Constituições de todos os países democráticos como direito fundamental; direito que serve para limitar o abuso do poder e encorajar à sociedade a mudança, o que decorre de troca de ideias, das discussões e do diálogo entre governantes e governados, o que não acontece nos países governados por Ditadura.

 

Considerando que Angola vive actualmente um contexto de profundas mudanças em quase todos os sectores e os recentes discursos de Sua Excelência Senhor Presidente da República Dr. João Lourenço, leva-nos a crer que haverá no presente mandato maior protecção dos direitos e garantias fundamentais dos cidadãos; fruto disto, seria um acto politicamente incorrecto se estivesse a ocorrer qualquer tentativa de restrição a liberdade de expressão na Província do Huambo levada a cabo por Sua Excelência Senhor Governador.

 

Antes de apresentar os meus argumentos sobre a polémica coloca-se algumas questões prévias: A carta publicada nas redes sociais tem ou não factos que comprometem sua Excelência Sr. Governador? Sendo o cidadão em causa, agente da polícia Nacional, qual devia ser a sua postura para com as autoridades politicas?

Ora bem:

1o Quem leu a carta aberta até ao final conseguiu perceber a desilusão que o cidadão em causa manifesta contra as nomeações feitas por sua Excelência, o que é normal e a princípio não é notável nenhuma expressão que demonstra falta de respeito ou consideração.

 

2oNo entanto, ao fazermos uma leitura criteriosa é possível perceber que o autor da carta presume que tais nomeações foram feitas com base no nepotismo. Uma prática muito comum e nociva no seio de alguns governantes a nível global, de favorecer os seus familiares que desempenham funções políticas ou administrativas e não têm competências para tal. Esta prática, prejudica muito os quadros locais presumivelmente mais preparados em detrimentos dos familiares e amigos dos governantes.

 

3o Esta reclamação é notável na observação que o cidadão em causa deixa no final da carta como nota de realce onde diz: “não estamos a reivindicar cargos de direcção e chefia apenas a lamentar o afastamento da massa intelectual local que é notoriamente substituída por pessoas com quem sua excelência mantem vínculos de proximidade em que muito transcende o profissional “

 

4o A ser verdade o que o autor diz no último trecho da carta, denuncia que Sua Excelência cometeu um acto de improbidade pública o que é reprovável e desprestigia qualquer governante comprometido com o respeito pelo primado da Constituição e da Lei; porque como governante esta impedida de intervir em acto em que esteja envolvido parentes seus de acordo com alínea b) do artigo 28o da lei no 3/10 de 29 de marco, LEI DA PROBIDADE PÚBLICA.

 

5o Se eventualmente as pessoas nomeadas, não estão ali por favoritismo de Sua Excelência mais sim, por militância dentro do partido MPLA ou reconhecido mérito profissional, sua Excelência pode entender que por intermédio da carta publicada nas redes sociais espalhou- se mentiras, falsidade que comprometem a sua honra e o seu bom nome direitos que ele deve defender de acordo com o artigo 73o da Constituição da República de Angola.

 

6o Sendo o facto que se presume na carta ser punível, espera-se que o cidadão tenha prova daquilo que levou ao conhecimento do grande público das redes sociais, caso não tiver provas sobre o que afirmou, Sua Excelência, têm o direito de recorrer aos meios legais que a constituição garante a todos os cidadão sem distinção para responsabiliza-lo, isso não é perseguição! É sim, responsabilização no âmbito do exercício do direito a liberdade de expressão.

 

7o Quando imputamos ao alguém a autoria de facto criminoso e não temos prova do que dissemos comete-se crime de calúnia previsto e punível pela segunda parte do artigo 409o do código penal, cujo interesse jurídico tutelado pelo Estado é o respeito pela honra, a dignidade e o bom nome das pessoas que constituem limites a liberdade de expresso da acordo com o no3 do artigo 40 o da Constituição da República.

 

8o Para caracterizar o crime de calúnia, o agente não precisa ter consciência que são falsas suas afirmações, basta que haja a incerteza da autoria sustentada pela falta de prova do que se afirma, para que este assuma os riscos decorrentes da ofensa a integridade moral alheia, isso é notório na carta aberta.

 

9o Respondendo a primeira questão prévia: A carta que o cidadão em referência escreveu, têm elementos que indiciam Sua Excelência ter favorecido alguns membros do seu governo. Por ser uma acusação grave que se faz na carta para pessoas comprometidas com a ética profissional, Sua Excelência têm o direito de defender – se caso contrario, pode fazer perceber que aquilo que se diz é verdade, logo o autor da carta é obrigado a mostrar provas do que alega sob pena de ser responsabilizado por crime de calúnia ao governador pela falsidade das suas afirmações.

 

10oFoi referido que o cidadão em causa é efectivo da Policia Nacional, colocado no Comando Municipal do Huambo, uma Instituição cuja conduta dos seus efectivos é regulada pelo Decreto Presidencial no38/14 de 19 de Fevereiro. Uma leitura ao regulamento da polícia Nacional dá para perceber que impõe condições que restringem alguns direitos fundamentais dos seus efectivos como: o direito a greve, o direito a manifestação, o direito ao livre associativismo político e outros direitos, por causa da sua tarefa de garantir a ordem e a tranquilidade pública, o asseguramento e protecção das instituições conforme os artigos 209o e 210o da Constituição da República. Tais restrições acontecem em quase todos os países democráticos.

 

11o O artigo 6o alínea ii) do regulamento de disciplina do pessoal da policia Nacional diz o seguintes: respeitar as instituições políticas, seus símbolos e autoridades, conservando, em todas as circunstâncias, um rigoroso apartidarismo, sendo-lhe vedado: exercer qualquer actividade política sem estar devidamente autorizado, já alineia xx) do mesmo artigo diz: não fazer em caso algum, declarações falsas, ainda que com fim de ocultar actos praticados por camaradas ou superiores seus contra as disposições regulamentares.

 

12o O regulamento de disciplina do pessoal da polícia Nacional demonstra que o cidadão em causa como policia, não devia em momento algum escrever tal carta muito menos fazer insinuações contra uma pessoa que representa uma instituição política a qual ele deve o máximo respeito por inerência das suas funções. Tendo escrito a carta e esta ofender o bom nome e a reputação de Sua Excelência, o polícia em causa cometeu uma infracção disciplinar passível de ser sancionada de acordo com aquele regulamento.

 

13o Dá para perceber o quanto é rigoroso o regulamento da Policia Nacional o que acontece em muitas partes do mundo por isso, aqueles cidadãos que não concordam com a dureza e a restrição dos seus direitos que o regulamento impõe acabam por rescindir o seu vínculo laboral com o Ministério do Interior que tutela a polícia Nacional ou ainda desertam o que é passível de responsabilização criminal de acordo a lei no4/94,de 28 de Janeiro, Lei dos Crimes Militares.

14o Mesmo o regulamento sendo rigoroso, os Comandantes da polícia Nacional têm procurado garantir aos efectivos que violam o mesmo diploma legal o direito a presunção da inocência e o direito a ampla defesa garantidos pela Constituição nos termos do artigo 67o da CRA.

 

15oPor tudo o que foi dito, penso que, não há restrição a liberdade expressão na Província do Huambo, este caso isolado não pode por em causa tudo quanto se têm feito no âmbito dos direitos Humanos e os bom indicadores que a actual liderança do País vem transmitindo nos últimos dias. O Sr. Euclides de Castro não corre risco de ser abatido conforme foi dito, o que há é um procedimento normal feito nos ditames da lei.

 

Concluo respondendo a segunda questão colocada: O cidadão em causa, como agente da polícia Nacional tem que ter uma postura de reserva moral da sociedade não deve criticar de viva voz as opções das autoridades políticas do país ou da sua cidade. Caso entender fazer, deve primeiro deixar a polícia Nacional esta é a minha recomendação para o cidadão. Se assim não for, deve mudar a sua postura porque senão continuará a ter problemas.

 

O processo que lhe foi instaurado é normal no seio dos Militares, Policias e funcionários da Segurança do Estado a nível do Mundo, não viola a sua liberdade de expressão que se encontra restringida enquanto polícia por determinação do regulamento disciplinar. Já não aconteceria o mesmo caso fosse professor, jornalista ou comerciante; nestes casos só teria que provar os factos que alega em tribunal e nada mais.

 

Foi bom o portal Maka Angola ter publicado o artigo em referência, deu para expressar a minha opinião, espero ter ajudado a perceber o caso que dava a entender que há violação da liberdade de expressão no Huambo, o que não corresponde a verdade. Isso demonstra o quão fundamental é a relação entre os órgãos de impressa e a liberdade de expressão como direito garantido a todos os cidadãos de manifestarem as suas ideias divulgadas pelos meios de publicação que estes órgãos possuem.

 

Muito obrigado!

* Jurista