Lisboa - A 'holding' Trafigura, a principal fornecedora de petróleo a Angola, aparece citada numa investigação da Bloomberg como uma das empresas que consegue furar as sanções económicas impostas à Coreia do Norte, vendendo petróleo a este país.

Fonte: Lusa

"A aplicação de medidas internacionais para limitar as vendas à Coreia do Norte está a tornar-se quase impossível porque os fornecedores estão a usar práticas antigas que ajudam a esconder a origem e o destino das cargas de petróleo", escreve a agência de informação financeira, citando especificamente a Trafigura.

O Ministério dos Negócios Estrangeiros da Coreia do Sul disse na semana passada que o Grupo Trafigura era o dono da carga transportada pelo petroleiro Lighthouse Winmore e que as autoridades estavam a investigar a transferência para a Coreia do Norte, recorrendo à técnica antiga de desligar os transmissores durante algum tempo, o suficiente para que dois petroleiros se aproximem e consigam fazer o transbordo da carga sem haver registo da sua localização.

Segundo um relatório da Organização Não Governamental (ONG) suíça 'Public Eye', a Trafigura é uma 'holding' em que o petróleo representa 67% do lucro, em 2015, tendo ativos físicos de quase 40 mil milhões de dólares, "incluindo minas, navios, tanques de armazenagem, bombas de gasolina e oleodutos".


A Trafigura, o maior vendedor de petróleo refinado a Angola, controla 48,4% da Puma Energy (dona das bombas de gasolina Pumangol), uma empresa cujos acionistas incluem a petrolífera estatal Sonangol, com 30%, e uma empresa privada chamada Cochan, com mais 15%, cujo diretor executivo é o general Leopoldino Fragoso do Nascimento, conhecido em Angola como 'Dino', e que em 2010 foi nomeado  consultor do ministro de Estado e chefe da Casa Militar.

No relatório, explica-se que "as restantes ações são detidas por empresas em offshores detidas pelos gestores da Trafigura, o que lhes dá o controlo de facto da maioria da Puma, uma vez que a Trafigura é detida pelo mesmo grupo de indivíduos".

Horas depois da divulgação do comunicado do MNE da Coreia do Sul, a Trafigura "negou estar envolvida em qualquer transação ilícita, dizendo que não era dona nem do petroleiro nem da carga" que o navio transportava, escreveu a Bloomberg.

"Estas transferências entre navios podem acontecer a 200 milhas náuticas ou mais no mar, desde que as condições estejam calmas, e ninguém esteja a ver", comentou o analista Rahul Kapoor, confirmando que "é muito fácil fazer desaparecer a localização de um navio e escondê-lo".

Na prática, os dois navios só têm de desligar o transmissor, aproximar-se um do outro, fazer a transferência da carga, e depois afastarem-se novamente antes de voltarem a ligar o aparelho que regista a localização.

Durante 10 dias em outubro, o navio Lighthouse Winmore, cuja carga é alegadamente pertença da Trafigura, não emitiu qualquer sinal de localização, noticia a Bloomberg, vincando, no entanto, que a transferência de carga entre navios é uma prática comum na indústria petrolífera.

"Se for feita pelas pessoas erradas, esta prática normal da indústria petrolífera pode ser usada para maus fins", comentou o analista Den Syahril, da consultora FGE em Singapura.

Os Estados Unidos e aliados defenderam hoje, no final de uma reunião em Vancouver sobre a ameaça nuclear da Coreia do Norte, um reforço da vigilância marítima para impedir Pyongyang de fugir às sanções em vigor.

Os representantes de cerca de 20 países, incluindo do Japão e da Coreia do Sul, reunidos no Canadá, apoiaram "um reforço da proibição marítima para impedir transferências de navio para navio", feitas para fugir aos controlos e obter fornecimentos ilegais, declarou o secretário de Estado norte-americano.

Rex Tillerson garantiu, em conferência de imprensa, que ninguém quer "interferir nas atividades marítimas legítimas".