Luanda - Jerry Dávila, historiador da Universidade da Carolina do Norte, no seu livro “Hotel Trópico: o Brasil e o desafio da descolonização africana, 1950-1980”, editado pela “Paz e Terra” em 2011, refere, na sequência de uma entrevista ao embaixador e investigador brasileiro Alberto da Costa e Silva, feita em 14 de Dezembro de 2005, que, na década de 1950 a 1960, a grande imprensa no Rio de Janeiro era predominantemente favorável à política de colonização portuguesa: “Assis Chateubriand, proprietário da maior cadeia de jornais no Brasil, os ‘Diários Associados’ era um defensor declarado do regime de Salazar. Em gratidão por seu apoio, Salazar deu o nome de Chateubriand a uma rua de Lisboa”.

Fonte: JA

Para além de os “Diários Associados” também o “Correio da Manhã”, “O Globo”, “O Jornal Tribuna da Imprensa”, “Diário da Noite” e o “Jornal do Brasil” tinham a mesma simpatia política colonial.


John Stockwell, ex-agente da CIA, no seu livro editado em 1979, «A CIA contra Angola», diz que a FNLA contou com a colaboração de dois brasileiros. Um deles com a denominação de Falstaff, que o acompanhou a um campo de treinamento da FNLA. Depois de consultar os computadores da CIA, Stockwell descobriu que Falstaff era um jornalista brasileiro, que esteve na folha de pagamento daquela agência secreta americana. O outro era um major brasileiro, aparentemente na qualidade de observador.


Já o “Estado de São Paulo” de 18 de Abril de 2010, num artigo publicado sob o título «Brasileiro teria trabalhado para a CIA no país», também refere ao suposto envolvimento do jornalista Fernando Luiz Câmara Cascudo com a CIA. Mais adianta que segundo Ovídio de Andrade Melo, à época, Representante Especial do Brasil em Angola “ele tinha orgulho de falar que trabalhava para a CIA”.


Em entrevista ao “Estado de São Paulo”, o jornalista Câmara Cascudo negou alguma vez ter trabalhado para aquela agência. O mesmo acabou por publicar um livro com o título: “Angola, a guerra dos traídos”.


Ovídio de Andrade Melo, no seu livro “Recordações de um Removedor de mofo no Itamaraty: Relatos de política externa de 1948 à atualidade”, editado em 2009, informa-nos que Câmara Cascudo “acabou por sair apressadamente de Luanda, em Agosto de 1975, quando a FNLA foi expulsa da capital e por isto seu livro não reflecte as condições de vida, nem o ânimo de resistência daquela cidade ante as invasões estrangeiras que sobrevieram. Reflecte antes o que se pensava sobre Luanda nas hostes da FNLA, em Kinshasa e no norte de Angola”.


Já o investigador brasileiro José Francisco dos Santos, na sua dissertação de Mestrado em História, defendida na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e publicada, em 2010, sob o título “Movimento Afro-brasileiro Pró-Libertação de Angola (MABLA) – “Um Amplo Movimento”: Relação Brasil e Angola de 1960 a 1975” acresce o seguinte: “O Brasil não estava desinteressado do desfecho do problema angolano. Enquanto não se levantar quem era o major, se ele estava na reserva ou na activa, não há condições de se entender o que de facto representou a presença do referido militar em Angola.” Câmara Cascudo, na entrevista dada ao “Estado de São Paulo”, em 18 de Abril de 2010, afirma que na sua passagem por Angola encontrou “uns dois” brasileiros, que actuavam como mercenários ao lado das forças da FNLA e da UNITA. Segundo afirmou, “eram soldados de elite, com treinamento anfíbio e paraquedista, que vinham do território moçambicano. Gente muito qualificada. Os mercenários brasileiros ganhariam entre 3 mil e 10 mil dólares americanos, pagos em contas da FNLA, em Bruxelas.”


Mais tarde, o ataque à bomba à redacção do “Jornal de Angola”, motivou o envio de um telegrama de carácter urgente da Representação Especial Brasileira em Luanda, para a Secretaria de Estado (Confidencial – DAOC/DAF), em 24/07/1975:


“1. Remeto em anexo recorte do jornal “O Comércio”, de hoje, que dá notícia do atentado à bomba perpetrado contra o “Jornal de Angola”, que até bem pouco era denominado “Província de Angola”.


2. O jornal assim atingido, no qual até uma semana trabalharam alguns brasileiros, tem sido o mais controvertido dos órgãos da imprensa local. De uma posição colonialista, que se reflectia inclusive na conservação até Junho último do nome “Província de Angola”, a despeito de tudo que ocorreu desde 25 de Abril, em Portugal, “Jornal de Angola”, fora pouco a pouco passando para uma posição de militância aberta em favor da FNLA, militância essa que assumia tons de vibração e sensacionalismo, e que se revestia na forma gráfica de “O Globo”, tudo absolutamente inédito no marasmo da imprensa local. E isso, obviamente, pela influência dos jornalistas brasileiros contratados pela FNLA.


3. Os acontecimentos políticos militares da última semana causaram a derrocada da FNLA, em Luanda. Todas as sedes e quartéis da Frente foram bombardeados, queimados, arrasados. Teria sido “natural” também que o “Jornal de Angola” fosse atacado, na brutalidade daqueles acontecimentos. Não foi porém. Continuou a funcionar a despeito de seus directores, seus orientadores, estavam foragidos. Os trabalhadores do jornal já haviam emitido comunicado assumido à direcção (…)».

* Membro do Conselho Cientítico da Academia Angolana de Letras (AAL)